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Foto 1. Amsterdã: Museumplein (poses junto ao logotipo I Amsterdam) Foto 2 Amsterdã: Central Station (guia com camiseta e bolsa I Amsterdam).

6.2 Certificados de sustentabilidade ambiental no turismo

A indução ao desenvolvimento é uma promessa do turismo enquanto mercadoria vendida aos lugares, que criam a expectativa de que, com a inserção da atividade, poderão elevar o padrão econômico e social de sua população residente. Fundada nas concepções de desenvolvimento industrial do século 20, esta ideia do turismo como um motor de desenvolvimento mobiliza lugares do mundo todo no sentido de sua implantação. A crença é que o turismo possa dinamizar a economia local, internalizando lucros e criando empregos permanentes para a população residente, tudo isto sem provocar impactos ambientais consideráveis.

Assim, podemos considerar que, a partir das necessidades de um lugar, de dinamizar a economia local e de estabelecer adequadas condições de existência para a população residente, vende-se uma mercadoria valorizada pela estética da mercadoria: o próprio turismo enquanto atividade econômica. A estética da mercadoria reveste o turismo de expectativas ligadas às possibilidades de realização dos lugares, dando a ele (o turismo) uma forma aparente, ou uma fórmula aparente, capaz de resolver os problemas do lugar que a compra. Nesse sentido, as forças produtivas do turismo o apresentam com empatia, como um “galanteador amoroso”, nos termos de Haug (1997, p. 30), que propõe soluções correspondentes aos anseios de realização dos lugares. Anseios que, em realidade, são incutidos nos locais por meio da propaganda e da repetição insistente, como a ideia de desenvolvimento sustentável, solução que se presta muito mais aos anseios de reprodução do capital do que à resolução dos problemas dos lugares, pois por meio da ideia de sustentabilidade se garante a continuidade da exploração econômica.

De acordo com a Organização Mundial do Turismo (WTO, 2004), os princípios de sustentabilidade se referem aos aspectos ambientais, econômicos e socioculturais de desenvolvimento, que devem ser equilibrados adequadamente para se garantir a sustentabilidade turística em longo prazo. Para a WTO (2004), o turismo sustentável deve:

1) Fazer uma utilização ótima dos recursos ambientais que constituem um elemento fundamental no desenvolvimento turístico, mantendo os processos ecológicos essenciais e ajudando a conservar o patrimônio natural e da biodiversidade.

2) Respeitar a autenticidade sociocultural das comunidades de acolhimento, conservar o seu patrimônio construído e a vida cultural e dos valores tradicionais, e contribuir para a compreensão intercultural e da tolerância.

3) Garantir-se viável, em longo prazo das operações econômicas, proporcionando benefícios socioeconômicos a todos os interessados que são distribuídos de forma justa, incluindo o emprego estável e as oportunidades de geração de renda e serviços sociais às comunidades de acolhimento, e contribuindo para a redução da pobreza.

Além disso, a Organização Mundial do Turismo (WTO, 2004) prescreve que o turismo sustentável deve manter um elevado nível de satisfação do turista e garantir uma experiência significativa para os turistas, aumentando a consciência deles sobre as questões de sustentabilidade e promovendo práticas de turismo sustentável. É sobre estes fundamentos que se produz toda uma estética da mercadoria do turismo, garantindo a continuidade da exploração econômica, cada vez mais sobre bases legitimadas por consenso social. Por trás disso tudo, esta o ideal do consumidor responsável, aquele que consume, mas de forma “consciente”, pois é informado e leva em conta critérios ambientais e sociais na escolha das mercadorias que consome.

As forças produtivas do turismo, com base nestes preceitos, oferecem “pacotes verdes”, “ecológicos” ou “carbon free” (livre de carbono) que, segundo a publicidade, incluem destinos, transportes e alojamentos que provocam menor impacto ambiental. O “Guia do consumo responsável”, publicado em 2009 pela empresa portuguesa “Sustentare – Consultoria de sustentabilidade”, afirma que estes “pacotes podem selecionar destinos ligeiramente mais dispendiosos, que refletem um turismo mais justo para as economias de destino” (SUSTENTARE, 2009, p. 124).

Segundo a Sustentare (2009), existem “rótulos” que reconhecem alojamentos “mais amigos do ambiente”, como o “rótulo ecológico comunitário para serviços de alojamento e parques de campismo” (p. 125). De acordo com a empresa de consultoria portuguesa, os rótulos pressupõem critérios que visam limitar impactos ambientais, notadamente diminuindo o consumo de água e de energia, limitando a produção de resíduos, favorecendo a utilização de recursos renováveis e de substâncias menos nocivas ao ambiente, bem como promovendo a comunicação e a educação ambiental.

Os rótulos são mais conhecidos no Brasil como “certificações”, reconhecidas como ferramentas que permitem às empresas estabelecer um processo contínuo de gerenciamento de seus impactos sobre o meio ambiente. A certificação teria, assim, a pretensão de garantir a conformidade de produtos, serviços, sistemas de gestão, etc., por

meio de um instrumento que diferencia as empresas no sentido de abrir-lhes novos mercados e conquistar novos clientes. Como a certificação consiste numa declaração de conformidade, é necessário que exista um órgão expedidor que, supostamente, seria independente de quem fornece os produtos e serviços, ou de quem o representa.

Um tipo de certificação que tem sido utilizado no turismo é a concedida pela certificadora portuguesa “Carbono Zero”, que se estabelece como uma “marca” (figura 10) concedida pela “E. Value”, uma empresa de consultoria e desenvolvimento nas áreas da engenharia e economia do ambiente, às empresas que adotam seus programas de sequestro de carbono, como fez a agência de turismo “Papa-Léguas” 44. Em uma nota, publicada em 10/12/2009 no website da agência de turismo Papa-Léguas, a empresa informa os leitores sobre sua parceria com o certificador Carbono Zero:

Sabia que a Papa-léguas anula as emissões de CO2 originados pelos veículos dos participantes quando das deslocações para os passeios pedestres? Em parceria com a Carbono Zero plantamos e mantemos árvores na Herdade da Pernada (uma localidade na região do Alentejo em Portugal). Em 2010 organizaremos um passeio a esse local no Alentejo. Sabia que, em média, cada participante num passeio pedestre emite 16 kg de CO2 equivalente para se deslocar até ao local do início da caminhada e regressar? A PAPA-LÉGUAS assume a compensação destas emissões desde 2006, através do sequestro de carbono - plantando uma árvore na Herdade da Pernada.

Figura 10. Marca “Carbono Zero” concedida pela empresa de consultoria E. Value 45.

44

http://www.evalue.pt/; http://www.papa-leguas.com 45 Fonte: http://www.carbono-zero.com em 16/10/2010.

Segundo o Instituto Eco-Brasil (2009, p. 1), investir em práticas de sustentabilidade é “dever de cada empresário sério”, pois não é somente uma questão de reduzir impactos ambientais e aumentar benefícios para a comunidade, mas também porque, boas práticas de sustentabilidade, melhoram a qualidade do produto e diminuem os custos operacionais, ou seja, “todo mundo pode ganhar com isso” 46. Entretanto, continuam as afirmações do Instituto Eco-Brasil, a decisão de “se certificar” deve ser avaliada dentro de uma estratégia de marketing, já que a certificação tem um custo e “o orçamento de marketing de um empreendimento de turismo não é ilimitado”, devendo-se, portanto, comparar o custo/benefício da certificação com outras opções de se comunicar com o mercado. De acordo com o Instituto, os benefícios da certificação são os de diminuir controles e avaliações de seus clientes, especialmente operadores, bem como fazer frente à concorrência “desleal” de empreendimentos ditos “eco-[resort-lodge-pousada-etc.]” que, “se gabam” de práticas sustentáveis, mas nada fazem, além de estarem localizados no meio da natureza.

Para Hintze (2010, p. 63), o ecoturismo obedece ao mesmo ritmo contemporâneo e consumista que determina o turismo convencional, para qual ele surge como contraponto utilizando do prefixo “eco”, mas que, a seu modo, trata a experiência na natureza como uma mercadoria despossuída de seu pretendo caráter político de transformação das pessoas e da sociedade. É na cultura do consumo que o prefixo “eco” ganha corpo e importância, afirma Hintze (2010, p. 65), absorvendo o discurso ambientalista e “pintando de verde” antigas práticas como as do convencional turismo de massa. Os ideais de sustentabilidade são matéria para a estética do turismo, no mesmo sentido da monopolização indicada por Haug, o de se conseguir nichos exclusivos de mercado.

Para isso, a publicidade indica destinos e produtos turísticos sustentáveis e, como uma marca, sugere a escolha daqueles que possuem certificação ambiental ou “rotulagem”, termo usado pelos próprios defensores do procedimento, o que por si só já sugere o caráter de mercadoria dado ao chamado “turismo sustentável”. Para Luchiari (2002, p. 112), a

46

De acordo com informações divulgadas em seu website (www.ecobrasil.org.br), o Instituto EcoBrasil é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, que tem por finalidade “fazer do turismo um instrumento eficaz de desenvolvimento econômico e conservação dos recursos naturais e culturais do Brasil”, “promover a capacitação e treinamento de profissionais e empresários para atender o mercado”, bem como “elaborar e implementar estudos, pesquisas e projetos”. Originalmente fundado como “Associação Brasileira de Ecoturismo”, em 1993, em Manaus, por ocasião do evento World Congress On Adventure Travel & Ecotourism, se diz a primeira organização não governamental de ecoturismo do Brasil.

associação entre turismo e meio ambiente é tão inevitável quanto controversa, pois é impossível fazer tal associação sem constatar que a concepção de meio ambiente se tornou uma ferramenta política, econômica e indutora de um movimento de revalorização estética de paisagens naturais e culturas específicas. Um movimento que, de acordo com Luchiari, tem fortalecido a estetização no consumo de paisagens e de expressões culturais, que tem legitimado territorialidades sociais seletivas.

PARTE II

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