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TURISMO E ESTÉTICA DA MERCADORIA

5. PADRONIZAÇÃO DA SENSUALIDADE DOS CONSUMIDORES NO TURISMO

5.1 Status e prestígio social entre as necessidades de consumo no turismo

De acordo com Urry (1996, p. 19), ser turista é uma das características da experiência “moderna”, algo que confere “status”, e que não viajar é como não possuir um carro ou uma bela casa. Baudrillard (2006, p. 202) afirma que “no quadro da ‘sociedade de consumo’, a noção de estatuto, como critério de determinação do ser social, tende cada vez mais a se simplificar e a coincidir com a de “standing” (prestígio social)”. Segundo ele, toda publicidade refere-se explicitamente ao objeto como critério imperativo: “você será julgado por...”; “reconhece-se uma mulher elegante com...”; etc. As afirmativas que constam em um anúncio apresentado no website da agência “Classic viagens e turismo”, de João Pessoa (PB), nos dão bem a dimensão desse critério imperativo de determinação do ser social: “amor, sucesso e paz são coisas do destino” (figura 4).

Figura 4. Anúncio publicitário da agência “Classic viagens e turismo” 34.

Na perspectiva das motivações interpessoais, a viagem turística seria uma forma de fugir dos relacionamentos rotineiros com amigos ou vizinhos, bem como do ambiente habitual ou, ainda, para satisfazer motivos espirituais. Nessa perspectiva, a motivação para a viagem turística seria uma resposta a uma carência, pois os turistas são motivados, segundo Dann (1981) citado por Cooper et al (2007, p. 81), pelo desejo de vivenciar experiências

diferentes das que estão disponíveis em seu ambiente habitual, fazendo com que a fantasia combine-se com a carência, já que os turistas viajam a fim de assumir um comportamento que talvez não seja culturalmente aceito em seu ambiente habitual. Para Urry (1996, p. 27), em boa parte das práticas do turismo, as obrigações cotidianas são suspensas ou invertidas, pois existe uma espécie de licença para o comportamento permissivo, alegre, “não sério”.

A empresa de consultoria HVS International (2005, p. 42) apresentou um quadro com as “tendências comportamentais” mais abrangentes, que influem no comportamento de consumo do turismo (quadro 1), das quais destacamos as tendências de “sobrecarga sensorial”, “busca de comunidades”, “salvar o mundo”, “iconoclastia”, “sempre jovem”, “escapismo” e “espiritualidade”.

Quadro 1. Tendências comportamentais de consumo do turismo. Fonte: HVS International (2005, p. 43).

A tendência comportamental da “sobrecarga sensorial” diz respeito à consideração, por parte dos produtores do turismo, dos filtros de seleção pelos quais os consumidores escolhem as mensagens que lhe interessam. Considerando os filtros de seleção, a produção do turismo, segundo a HVS International (2005, p. 44), deve diferenciar suas mensagens aos “mercados-alvo”, buscando abordagens criativas e inovadoras (mesmo

que seja usando mídias tradicionais), bem como incentivando a disseminação descentralizada, espontânea e informal de informações, especialmente por meio de compartilhamentos pessoais (“boca-a-boca”).

Por sua vez, a tendência da “busca de comunidades” se refere à valorização da “herança da cultura local, dos valores tradicionais, das festas, do artesanato, etc.”, de tal modo que os turistas percebam os esforços da comunidade local em manter elementos de sua cultura. A criação de interesse na conservação da cultural local faz sentido faz parte do que se entende por “sustentabilidade”, um conceito que também diz respeito à tendência comportamental de “salvar o mundo”. De acordo com a HVS International (2005), turistas conscientes quanto às ideias de sustentabilidade, “se incomodam ao perceber que a sua presença no destino causa impactos no meio ambiente e contribui para a desestabilização da cultura local” (p. 44). Para a empresa, a valorização do “sistema biológico” e a “inclusão da comunidade” reforçam a imagem do destino turístico.

A “iconoclastia” é uma tendência comportamental que indica a oportunidade de promoção do destino, por meio de imagens registradas durante a experiência de um amigo ou parente, mas também de alguém famoso ou formador de opinião, uma “celebridade”. Segundo Urry (1996, p. 68), existem lugares procurados durante as férias, que são consumidos, não por serem intrinsecamente superiores, mas por serem símbolos de “bom gosto” ou de “status superior”. A presença de um público jovem, por exemplo, é incentivada por conferir aos destinos uma atmosfera de “jovialidade”, que é valorizada também por consumidores com mais idade. Um comportamento “sempre jovem” diz respeito ao “encanto juvenil”, tendência que se encontra com frequência a serviço da estética da mercadoria: “o mundo da mercadoria irradia-o (o encanto juvenil) de volta para o público reforçando ali uma padronização da sensualidade orientada de acordo com a juventude” (HAUG, 1997, p. 124).

O “escapismo” é uma tendência que diz respeito à fuga da rotina, por meio de práticas turísticas pouco convencionais, como visitação a lugares considerados isolados, hospedagem em casas de nativos, participação em projetos sociais e ambientais, esportes “radicais”, entre outras atividades “criativas”, definidas no sentido de diferenciar-se das práticas cotidianas do turista. Ao seu modo, a tendência comportamental ligada à “espiritualidade” também é explorada como possibilidade de se vender momentos de “paz e reflexão” aos turistas.

Em suma, o possível reconhecer que, dentre as motivações dos turistas, o componente “fuga” é complementado pelo componente “busca”, como afirmou Pearce (2003, p. 60):

Um conjunto de forças motivacionais deriva do desejo, pelo indivíduo, de fugir a seu ambiente pessoal (isto é, questões pessoais, problemas, dificuldades e falências) e/ou de seu ambiente interpessoal (isto é, colegas de trabalho, membros da família, amigos e vizinhos). Outro conjunto de forças resulta do desejo de obter certas recompensas psicológicas ou intrínsecas, pessoais ou interpessoais, viajando para um ambiente diferente.

Burgelin (1967, p. 66) chama de “sight-seeing”, a teoria segundo a qual o turista não vai em direção de coisas, mas em direção das imagens das coisas e, portanto, reduz a coisa a olhar turístico, a imagem. O “sight”, a coisa a se ver é precisamente, nessa teoria, aquilo no qual a coisa se confunde com a imagem da coisa, ou seja, a coisa reduzida a “signo” ou mesmo a “sinal”. Graças às fotografias, cartões-postais, reproduções e guias de todo tipo, o turista conhece o que vai ver, ao menos, o conhece como “sight”, isto é, como elemento normalizado digno de um deslocamento turístico. O “sight” foi submetido a uma operação capital, segundo Burgelin (1967, p. 66), pois foi destacado de qualquer contexto e, assim, privado de espessura, da realidade que detinha de sua solidariedade com seu contexto, tornando não mais do que “imagem”.

O destacamento do contexto se opera em vários sentidos e de várias maneiras, como as de ordem material quando, por exemplo, as coisas (os objetos a serem vistas pelos turistas) são transferidas para um museu, ou seja, para fora de sua verdadeira natureza cultural. Segundo Burgelin (1967, p. 67), o destacamento do contexto distorce a realidade, criando um universo que é a imagem, não do real, mas da expectativa dos turistas. Fora desse imaginário turístico, o objeto a ser visto não se refere mais a alguma outra realidade que não ele mesmo, fazendo com que, no entender de Burgelin, assistamos a criação de atrações turísticas de caráter puramente “sintético”. Para Burgelin, o termo “imagem” não implica que o objeto seja reduzido a suas propriedades óticas ou plásticas, mas somente as suas propriedades simbólicas. “Caçador de imagens”, o turista não se envolve, segundo a teoria do sight-seeing, com nenhum trabalho de assimilação ou de análise visual do objeto a ser visto, de modo que o turista não decifra o objeto, ela apenas o reconhece como um sinal e, por assim dizer, sem o “ver”.

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