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A exploração da borracha e a escravidão na Amazônia

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AGRONEGÓCIO E ESCRAVIDÃO NO BRASIL CONTEMPORÂNEO A pedagogia dos aços golpeia no corpo

1.4 A exploração da borracha e a escravidão na Amazônia

Na Região Amazônica, em particular, o escravismo destacou-se, desde o período colonial, como um elemento fundamental do processo de expansão. A “ação civilizadora” dos europeus, na verdade, deixou sua marca desde 1499, quando o navegador espanhol Vincente Pinzón entrou na foz do Rio Amazonas, apreendendo índios para vender como escravos.

Os portugueses começaram a ocupação efetiva da Amazônia apenas em 1616, com a fundação de Belém. Parte das características da colonização ibérica na região se deu com a coleta de drogas da floresta como a principal atividade produtiva. Esta ocupação nada apresentava em comum com a do litoral nordestino, baseada na monocultura da cana-de-açúcar (FERRAZ, 1998).

Na Amazônia, entre os séculos XVII e XVIII, ocorreu a expansão da pecuária que, nos primeiros tempos esteve intimamente ligada à economia açucareira, mas que depois fez os criadores se embrenharem nos domínios da floresta amazônica, expandindo o terrítorio e também aprender a desenvolver a incipiente extração das drogas do sertão.

Na estruturação da agropecuária e outras atividades econômicas na Amazônia, ao contrário do restante do país, a escravidão não era negra e de acordo com Prado e Capelato (1985) foi utilizada uma mão-de-obra indígena e mestiça, empregada especialmente na lavoura que nessa região, nunca representou o núcleo principal da economia.

O trabalho do índio e do mestiço melhor se adaptou às condições econômicas da Amazônia e a partir da decadência da economia açucareira do final do século XVII criou-se um

48 exército de mão-de-obra de reserva disponível que foi fundamental para o desenvolvimento da economia da borracha um importante ciclo econômico regional.

Conforme Prado Jr. (1988) no avanço desigual da economia brasileira com suas características regionais muito distintas de uma maneira geral podemos constatar que da segunda metade do século XIX até o início do século XX a economia brasileira estava dividida em quatro setores principais: 1) a economia da borracha, que se desenvolveu principalmente no século XIX, mas que ainda chegou ao século XX, embora em crise, mas com significativas exportações antes da I Guerra Mundial e também durante a II guerra, 2) o setor da economia do açúcar (que no final do século XIX já havia praticamente desaparecido enquanto produção para exportação), do algodão e pela vasta zona de economia de subsistência a ela ligada; 3) o setor formado pela economia de subsistência e em pequenas propriedades de colonos do Sul do país; 4) o setor da economia cafeeira.

No que tange especificamente a economia da borracha podemos afirmar que essa economia se desenvolveu basicamente na região Norte, principalmente onde hoje são os estados do Amazonas, Rondônia, Acre e Pará, respectivamente. Já o segundo setor econômico, o da economia açucareira e do algodão, se estendeu do Maranhão até o Sergipe; o terceiro setor econômico, da economia de subsistência e dos colonos, foi constituído pelos atuais estados do Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina e Mato Grosso. Já o quarto setor econômico, o da economia cafeeira, situou-se principalmente na localizaçãoa dos estados do Espírito Santo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo.

Mas fora esses setores econômicos é preciso também destacar outra região de grande importância econômica: a Bahia, que teve sua economia profundamente modificada com o advento da produção do cacau, que se iniciou na segunda metade do século XIX no sul do estado, fora, portanto, da região de Salvador e do Recôncavo onde a atividade primário- exportadora sempre esteve concentrada. Além disso, outro produto tradicional de exportação da Bahia — o fumo — apresentou relativa recuperação econômica e também alcançou expressão econômica relativa durante o século XX.

Nesse conjunto de atividades econômicas teremos diversas relações de produção e de trabalho, com a manutenção do trabalho escravo na região Norte, sendo que a migração europeia, a consolidação do trabalho assalariado e sua influência não foram suficiente para apagar ou banir das relações de trabalho brasileira as práticas econômicas caracterizadas por absoluto desrespeito aos trabalhadores, alta exploração da força de trabalho e relações de produção caracterizadas por fortes identidades com as raízes profundas do passado escravista brasileiro, que deixou ele sim uma herança permanente no mundo do trabalho do país.

49 No Brasil pós Lei Áurea embora o elemento racial não fosse mais algo central para a definição de quem escravizar e os interesses capitalistas não pudesse mais usar legalmente as justificativas raciais como um instrumento viabilizador da escravidão, a burguesia passou a construir ideologicamente um ideário do progresso das supostas vantagens da economia de mercado, mas ao mesmo tempo continuou praticando formas severas de espoliação da força de trabalho e impondo condições de vida aos trabalhadores altamente precárias.

Com a borracha amazonense, o afluxo de migrantes nordestinos, principalmente do Maranhão, Ceará e Rio Grande do Norte, penetrou a floresta em busca de rentimento material e condições melhores de vida. Todavia quase sempre só encontraram a escravidão, a exploração e o descaso com sua condição de vida.

O ciclo da borracha amazônica foi o grande responsável pela permanência da escravidão no Brasil, no pós-abolição, que alí passou a ser utilizada para atender os interesses dos grandes seringalistas e do próprio capitalismo industrial do final do século XIX e início do século XX.

A borracha ao se transformar numa matéria prima fundamental para a indústria automobilística em plena expansão possibilitou principalmente aos estados do Pará e Amazonas a se transformarem em grandes extratores do látex das seringueiras e atrair grandes quantidades de trabalhadores para a região em busca de emprego e melhores condições de vida.

Junto a isso o crescimento econômico também permitiu um significativo crescimento urbano. Muitas cidades surgiram e outras se desenvolveram como, por exemplo, Manaus. O comércio interno aumentou e a renda dos habitantes melhorou. Esta euforia contribuiu para a construção de casas, prédios públicos, estradas, teatros e escolas.

No entanto na base de tudo isso estava a alta exploração da mão-de-obra e a estruturação de um novo tipo de escravidão que deixará profundas marcas no mundo do trabalho amazônico, com seus ecos chegando até nossos dias. Por isso compreender o ciclo da borracha é fundamental para compreender a reinvenção da escravidão na Amazônia e sua contínua reprodução até os dias atuais.

O uso da borracha foi registrado entre os índios da Amazônia Cambebas ou Anaguás, habitantes da área dos rios Solimões e MaraĖon, que com o látex extraído das árvores preparavam vários objetos de uso cotidiano. Conforme Prado e Capelato (1985) em 1743, Charles Marie La Condamine, descendo o Amazonas já havia observado um movimento mercantil que existia em torno da borracha e Fresnau, em Caiena, fez pesquisas a respeito da goma elástica em 1751 usa pelos nativos americanos, comprovando que tal produto poderia ser utilizado para fins comerciais.

50 Naquele momento isso não despertou grande interesse comercial do capitalismo, pois os utensilhos e objetos de borracha não tinham muita resistência e eram sujeitos a variações de temperatura. Todavia com a descoberta do processo de vulcanização da borracha tudo mudou.

Segundo Prado e Capelato (1985):

Com a descoberta do processo de vulcanização da borracha por Charles Goodyear em 1839 e Hancocock em 1842, que a tornou mais resistente e quase insensível às variações de temperatura, assegurando sua elasticidade e impermeabilidade, o uso do produto se estendeu na Europa e nos Estados Unidos. A partir de então, a borracha foi se tornando matéria-prima cada vez mais importante na confecção de objetos diários de uso diário, doméstico, industrial, hospitalar, empregada ainda na fabricação de material bélico e nos estaleiros de construção naval. Mas foi com a invenção do pneumático em 1890 que a industrialização da borracha tomou grande vulto e a partir daí aumentou consideravelmente sua cotação no mercado internacional. (PRADO e CAPELATO, 1985, pp.288-289)

Essa transformação da borracha em um produto cobiçado pela indústria capitalista possibilitou a criação no Brasil de um sistema de exploração econômica extremamente rudimentar, mas altamente lucrativo, que dependia para qualquer aumento da produção da goma da seringueira e do caucho, do afluxo de mão-de-obra.

O trabalho escravo sobreviveu disseminado nos vários ciclos da produção, mas foi principalmente com a borracha, que viveu seu auge entre 1880 a 1920, mas experimentou uma sobrevida entre 1940 e 1945, durante a II Guerra Mundial, possibilitando a utilização de mão-de- obra utilizada para a extração do látex nos seringais com a "contratação" de trabalhadores vindos, principalmente, da região nordeste e submetidos ao poder de um “aviador”, que "contratava" os serviços dos seringueiros em troca de dinheiro ou produtos de subsistência.

Desde o período inicial da exploração "capitalista" da borracha no século XIX a escravidão continuou a ser praticada na Amazônia, inclusive depois da “libertação dos escravos” pela Lei Áurea, pois ela não era propriamente uma escravidão negra, mas indígena, branca e mestiça, que gerava a riqueza de uma pequena burguesia que vivia, principalmente, em Manaus e Belém. Era uma classe dominante incapaz de gerar um povoamento planejado na região e mesmo uma colonização objetivando uma produção racional e a utilização qualificada de mão- de-obra.

A pirataria genética e o roubo de mudas do seringal amazônico para a Ásia, que também passou a produzir grandes quantidades de borracha, fez esse ciclo econômico entrar em um longo declínio até o início do século vinte, por volta de 1910. Isso reforçou a miséria social, voltando a haver uma pequena recuperação econômica somente no período da segunda grande

51 guerra, quando, mais uma vez, o país teve que suprir os países aliados com a borracha brasileira, estratégica para as máquinas de guerra lideradas pelos Estados Unidos.

Para alimentar e suprir o consumo mundial da borracha, produto vindo basicamente da Amazônia, a floresta sofreu profundas transformações, bem como a ocupação com trabalhadores denominados “soldados da borracha”, vindos principalmente do Nordeste brasileiro. Eram migrantes pobres, que vieram para os grandes seringais amazônicos para serem, quase sempre, explorados em regime que, em tudo, se assemelha à escravidão.

Esses trabalhadores inauguraram o modelo de escravização “contemporâneo”, em que o trabalhador já deixava a sua terra com uma grande dívida de deslocamento, alimentação, instalação, adiantamento de ferramentas de trabalho e remédios. Quase sempre viravam, deste modo, reféns de uma dívida falsa, que os impedia de ir embora, principalmente porque a consciência do trabalhador era aquela de que “se eu devo, eu pago, sou homem de palavra e não quero dever a ninguém”. Foi assim que o trabalho escravo se tornou uma presença constante nos castanhais, seringais e latifúndios da região, até os dias atuais.

Apenas depois de embrenhar-se na mata, passando por rios e enfrentando todo tipo de obstáculo, trabalhando duro por dias a fio, o trabalhador se dava conta do nível de submissão a que estava sujeito, pois, para se manter, era obrigado a comprar os produtos de sua necessidade no comércio do patrão, com preços abusivos. Era impossível deixar o ambiente de trabalho, já que sempre estava devendo. A fuga é difícil, em função das condições geográficas do local, e muito arriscada, em função da vigilância permanente dos capangas. Entretanto, muitas vezes o trabalhador, já não suportando mais sua situação, resolvia fugir e tentar a liberdade. Em consequência, surgiram diversas comunidades ou grupos sociais isolados, principalmente os ribeirinhos, extrativistas, brancos pobres, homens e mulheres, jamais vistos como cidadãos.

Assim, a partir da segunda metade do século XIX o consumo da goma elástica pela indústria fez da Amazônia seu maior produtor o que gerou um colapso das lavouras da cacal, café, da atividade de coleta das drogas do sertão e das tarefas agropecuárias para a extração do látex da borracha e sua exportação principalmente para os Estados Unidos e para a Europa.

Confirmando isso Magalhães (2006) faz as seguintes observações em sua tese de doutorado:

A Amazônia era a região dos cacauais, dos cafezais, dos engenhos, das lavouras e do pastoreio, passa a ser daí por diante a região das heveas, do ouro negro, dos pioneiros, dos seringueiros, dos patrões, dos aviadores, de um mecanismo novo na conjuntura nacional, diferente, portanto, na paisagem social brasileira. Dessa forma, estavam criadas as condições para uma grande corrida às fontes abastecedoras dessa

52 matéria-prima. Ainda a esse respeito, Vianna Moog mencionou que a valorização da borracha desmantelou a organização agrícola vigente e propiciou uma desenfreada corrida aos seringais, com o respectivo abandono das oficinas e dos rebanhos. (...) Não obstante, as seringueiras logo foram sendo destruídas em virtude das técnicas utilizadas na extração chamada arrocho. A partir daí, os seringueiros penetravam na floresta ocupando os mangues dos rios Madeira, Purus e Juruá. (MAGALHÃES, 2006, p.54)

Então conforme expõe Magalhães (2006) a partir do momento que a borracha passa a ser uma matéria prima para a demanda internacional crescente das indústrias, pode-se afirmar que impôs o fim de muitos outros produtos vegetais produzidos e uma certa desorganização econômica em função da produção de um produto de exportação, que também ao ser ampliado passou cada vez mais a mobilizar braços para a sua exploração, contribuindo para uma maior penetração humana na floresta e para a estruturação de novas formas de exploração da força de trabalho.

Confirmando isso Prado e Capelato afirmam:

A borracha apareceu pela primeira vez nos registros de exportação brasileira em 1827 com o modesto embarque de trinta e uma toneladas. Até 1852, as exportações figuravam sempre como provenientes do Pará, já que a antiga Província do Rio Negro (raiz histórica do Estado do Amazonas) não era autônoma; só por ato legislativo de 1850. Durante muitos anos nem toda a exportação do Amazonas era feita diretamente ao exterior; grande parte descia para o Pará e daí seguia rumo à Europa. De 1850 em diante a goma elástica passou a ser o principal produto de exportação do vale do Amazonas, desaparecendo as pruduções de café, tabaco, algodão, salsa, cravo e diminuindo mesmo a do cacau. (PRADO e CAPELATO, 1985, p.298)

Então conforme Prado e Capelato (1985) desde a década de vinte do século XIX, já havia registros de exportação de borracha amazônica para a Europa, mas somente a partir do início da segunda metade do século XIX, ela assumiu importância considerável, que se estendeu até o início do século XX, quando entrou em uma crise profunda devido a produção da borracha asiática, que não era silvestre mas proveniente de seringais cultivados.

Mas até isso ocorrer o ciclo da borracha provocou uma verdadeira revolução demográfica na população local que sempre foi muito baixa conforme nos informa Magalhães (2006):

O censo populacional de 1799 registrava 83.510 habitantes; o de 1832, 149.854; e o de 1862, 272.014. O pequeno número de açoreanos, chineses,

53 europeus e sul-americanos que se dirigiram para a região, tiveram pouca significação no povoamento da Amazônia. A presença dos negros na Amazônia também não se revestiu da mesma importância que teve em outras regiões do Brasil. Essa mão-de-obra era empregada especialmente na lavoura. O trabalho do índio e do mestiço se adaptava melhor às condições econômicas da região. Não obstante, a população deu um grande salto demográfico no fim do século XIX e início do XX de acordo com os dados em análise, em 1900, 695.000 e, 1910, 1.217.000. Os governadores da Amazônia, com o deslanchar da borracha, foram obrigados a mobilizar populações de outras regiões do país. Para este fim, organizaram serviços de propaganda e concederam subsídios para os gastos com transporte e adiantamento em dinheiro para as primeiras necessidades dos migrantes. Os nordestinos, acometidos pela violenta seca que se abateu sobre os diversos estados daquela região, viram-se forçados a emigrar para a Amazônia. Calcula-se que cerca de 350 mil migraram entre 1850 a 1915, em diferentes momentos. (MAGALHÃES, 2006, p.55)

Para assegurar os interesses capitalistas da expansão de novas áreas de plantio de seringais e ter mão-de-obra suficiente, o fluxo de trabalhadores foi então estimulado, financiado e alimentado principalmente por trabalhadores pobres e famintos do Nordeste. Esses migrantes constituíram-se em grande medida de levas de escravos brancos e mestiços que geravam a riqueza de uma burguesia que vivia, principalmente, em Manaus e Belém.

Essa burguesia da borracha gerou um povoamento sem planejamento na região e uma colonização marcada por uma profunda ausência do Estado, onde a lei, a ordem e a reprodução econômica sempre foram impostas pela força e os estratagemas de escravidão por dívida, do reforço da monocultura extrativista, da manutenção das condições de miserabilidade que gera a dependência dos trabalhadores se reproduz em um ciclo interminável de exploração e destruição de vidas.

Sendo assim, a borracha significou a gênese de um padrão de superexploração da mão de obra que transformou a Amazônia no paraíso da escravidão, da exploração sem limites e do desrespeito do trabalhador, que até hoje não é visto como o principal fator no processo produtivo, mas uma peça substituível na grande máquina do lucro e da produção voltada para interesses externos.

O crescimento populacional exponencial para os padrões amazônicos foi fundamental para o domínio do Brasil na exportação da borracha possibilitando uma ampla lucratividade em curto espaço de tempo e, através de exportação, tornou a economia da borracha fundamental para uma minoria que tinha mais contato com a Europa do que com o restante do Brasil, principalmente devido os novos usos industriais que iam utilizando cada vez mais essa matéria prima.

54 Mas esse fausto e processo de enriquecimento segundo Prado e Capelato (1985), encontrou um rápido declínio quando a produção silvestrre foi definitivamente suplantada pela produção que provinha das plantações das colônias inglesas e holandesas da Asia em 1913. "Nesse ano, enquanto o Brasil produziu 39.370 toneladas, a produção asiática alcançou 47.618 toneladas e em 1925, 93% da produção mundial da borracha já provinha das plantações asiáticas." (CAPELATO, 1985, p.301),

A esse respeito Euclides da Cunha apud Prado e Capelato (1985) afirmaram:

As grandes possibilidades de lucro que ofereceu a borracha em tão curto espaço de tempo, a avidez de ganhos ilimitados que tomou conta dos homens da Amazonia no período áureo da borracha explicam a forma violenta de exploração do trabalhador, que aí acabou se prendendo, a mais criminosa organização do trabalho que ainda engenhou o mais desaçaimado egoísmo. (PRADO e CAPELATO, 1985, p.298)

Sendo assim, percebemos que a produção da borracha na Amazônia pôs em movimento nossa condição de país periférico, fornecedor de produtos primários ao exterior mantido à custa da alta exploração da mão de obra, inclusive do trabalho escravo contemporâneo, que mesmo depois do seu fim oficial em 1.888 continuou sendo reinventado na Amazônia, através das práticas dos seringalistas.

Prado e Capelato (1985) revelam inclusive que as mesmas práticas brutais da escravidão negra, sua violência, exploração, castigos físicos, meios de punição, tortura e cerceamento do direito de ir e vir foram largamente utilizados pelos donos dos seringais e seus prepostos contra os caboclos amazonenses, nordestinos e todos aqueles que viviam nos seringais dependentes da produção da borracha.

Considerando estes aspectos Prado e Capelato (1985) destacam:

No seringal, o “seringalista” era o patrão, o chefe, o responsável por tudo e a ele estavam subordinados todos os indivíduos que ali residiam. Tudo corria por sua conta; o aviamento era comprado a seu crédito na casa aviadora e por ele revendido no toco – “barracão” – com o que obtinha grande margem de lucro. Dirigia cem ou mais indivíduos e se caracterizava pela violência e pela exploração pois quando os trabalhadores ousavam fazer-lhe exigências, pretendiam abandonar o trabalho, cometiam faltas, ou empregavam processos condenados na extração do látex, os meios de punição eram os mais brutais. O seringalista fazia o uso do mesmo processo utilizado contra os escravo – prendia os trabalhadores no “tronco” e os torturava. Se se

55 considerava ofendido, mandava eliminar o ofensor; sua vontade era lei, o magistrado civil ou a autoridade militar não agiam no seringal. (PRADO e CAPELATO, 1985, p.294)

Dessa maneira podemos perceber que o processo de escravização nos seringais representou a manutenção da escravidão no Brasil mesmo depois de sua abolição oficial e a reprodução de práticas que se tornaram “comuns” na região na exploração da mão de obra. Todavia, ela foi responsável pela “inovação” com o estabelecimento da escravidão por dívida e o uso do barracão para fornecimento de alimentos e outras mercadorias como um padrão recorrente de aprisionamento, criação de vinculos de dependência e garantia de um grande lucro dos proprietários, seus gerentes e prepostos.

1.5 A Escravidão Contemporânea: o Truck System, o Sistema de Barracão e o Regime de

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