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A Globalização e as Transformações do Mundo do Trabalho: Precarização e Trabalho Escravo

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AGRONEGÓCIO E ESCRAVIDÃO NO BRASIL CONTEMPORÂNEO A pedagogia dos aços golpeia no corpo

ESCRAVIDÃO CONTEMPORÂNEA DO SÉCULO XX AO SÉCULO

1.15 A Globalização e as Transformações do Mundo do Trabalho: Precarização e Trabalho Escravo

Essa pretensa "nova" globalização, além de aprofundar as velhas características dos donos do capital na extração da mais valia, também se caracteriza em sua fase monopólica por uma profunda reconfiguração das relações sociais. Tendo em vista sua necessidade cada vez maior: gerar mais e mais acumulação de capitais, a burguesia reinventa cotidianamente maneiras de sobrepor o capital ao trabalho e garantir uma maior exploração do trabalho e do trabalhador, buscando no lucro seu fundamento principal.

O capital só conhece a lógica do lucro, da redução dos custos de produção, da garantia de seus interesses que são assegurados por todo tipo de estratégias, que vão da demissão de empregados à precarização do trabalho, da reestruturação produtiva ao trabalho escravo, das novas formas de organização do trabalho até a destruição das políticas públicas fundamentais aos trabalhadores.

É esse conjunto de manifestações que asseguram a superexploração dos trabalhadores da periferia do sistema e agora cada vez mais nos países centrais por causa principalmente da crise econômica do sistema capitalista que só tende a ampliar ainda mais as desigualdades sociais e a miséria, com a elevação da taxa de exploração do trabalho, pela maior intensidade do trabalho e pelo aumento da extensão da jornada de trabalho.

124 Mas, embora isso provoque importantes rupturas ou fragilize diversas cadeias produtivas, gerando importantes dificuldades para os setores econômicos que não se atualizaram à competitividade internacional, não é apenas por isso que a escravidão contemporânea ressurge no mundo com intensidade.

A escravidão contemporânea não é só a expressão do estabelecimento da reestruturação produtiva, da crise sistêmica do capitalismo ou uma forma de baratear custos e aumentar a competitividade internacional e nacional. Ela também é o resultado das fragilidades organizacionais dos trabalhadores, da imensa capacidade ideológica de burguesia em implementar antigas formas de exploração do trabalho com novas práticas globalizadas.

É assim que estamos assistindo em todo o planeta a um retorno aos séculos XVIII e XIX, com toda a propalada ideologia da economia do conhecimento, das novas tecnologias, das tecnologias de informação e comunicação que hipnotizam os mais jovens e dizem aos mais vividos que não há outros caminhos possíveis de construção social e econômica, tentando impor a resignação quanto a política econômica que privilegia há muito tempo os capitalistas e especuladores internacionais e que nos argumentos do status quo não deve ser mudada.

Dessa forma, os trabalhadores do Brasil e até do nos países do centro do capitalismo têm sido vítimas das novas estratégias do capital em relação ao mundo do trabalho, uma vez que são eles os mais penalizados com as mudanças impostas e pagam com seu sacrifício a desregulamentação trabalhista, a reestruturação produtiva e a mudança das políticas públicas.

Dessa maneira, Antunes (2002) ao mapear algumas das novas expressões do capital e como elas tiveram consequências enormes no mundo do trabalho afirma:

1) uma crescente redução do proletariado fabril estável, que se desenvolveu na vigência do binômio taylorismo/fordismo e que vem diminuindo com a reestruturação, flexibilização e desconcentração do espaço físico produtivo, típico da fase do toyotismo; 2) há um enorme incremento do novo proletariado, do subproletariado fabril e de serviços, o que tem sido denominado mundialmente de trabalho precarizado. [...] 3) vivencia-se um aumento significativo do trabalho feminino, que atinge mais de 40% da força de trabalho nos países avançados, e que tem sido preferencialmente absorvido pelo capital no universo do trabalho precarizado e desregulamentado; [...] 5) há exclusão dos jovens e dos idosos do mercado de trabalho dos países centrais: os primeiros acabam muitas vezes engrossando as fileiras de movimentos neonazistas e aqueles com cerca de 40 anos ou mais, quando desempregados e excluídos do trabalho, dificilmente conseguem o reingresso no mercado de trabalho; 6) há uma inclusão precoce e criminosa de crianças no mercado de trabalho, particularmente nos países de industrialização intermediária e subordinada, como nos países asiáticos, latino-americanos etc. 7) há uma expansão do que Marx chamou de trabalho social combinado (Marx, 1978), onde trabalhadores de diversas partes do mundo participam do processo de produção e de serviços. O que, é evidente, não caminha no sentido da eliminação da classe

125 trabalhadora, mas da sua precarização e utilização de maneira ainda mais intensificada. Em outras palavras: aumentam os níveis de exploração do trabalho [...] há uma massa de trabalhadores precarizados, sem qualificação, que hoje está presenciando as formas de part-time, emprego temporário, parcial, ou então vivenciando o desemprego estrutural. [...] (ANTUNES, 2002, pp. 42-43).

Sendo assim, Antunes (2002) demonstra que entre as profundas transformações impostas pelas novas condições capitalistas está não só uma redução do proletariado fabril estável, mas cada vez mais um processo de precarização do trabalho, com a desmontagem dos direitos sociais dos trabalhadores e dos parques industriais.

Para Antunes (2002) além da destruição e/ou precarização, sem paralelos em toda era moderna, da força humana que trabalha e a degradação crescente do mundo do trabalho, há também um processo de destruição da relação metabólica entre homem e natureza, que conduzida pela lógica voltada prioritariamente para a produção de mercadorias que destroem o meio ambiente e têm gerado graves consequências climatológicas.

Esses são os traços marcantes da globalização capitalista que cada vez mais muda a característica da produtividade do trabalho e as formas de produção, impondo uma concorrência sem limites e com características extremamente negativas ao conjunto dos trabalhadores, que passaram a enfrentar mais do que o crescimento da precarização das relações de trabalho, o trabalho escravo, o emprego temporário, parcial, ou o desemprego estrutural.

O capitalismo globalizou ao máximo sua capacidade de exploração, sua unidade de implementação das políticas predatórias e a capacidade das empresas agirem no sentido de viabilizarem a qualquer custo sua hegemonia, sua lucratividade, novos mercados e a competitividade desenfreada, que se distancia cada vez mais das verdadeiras necessidades humanas.

Na globalização, o conjunto dessas práticas cada vez mais promove acentuadamente a dicotomia entre a produção voltada para o atendimento das necessidades humanas e a produção voltada para a constante valorização do capital. Dessa forma, apesar do discurso de setores capitalistas que falam da importância do capital social, da sustentabilidade etc, a história do capitalismo poucas vezes assistiu a um processo de precarização das relações de trabalho como a que se vive atualmente.

126 [...] o aprofundamento da separação entre a produção voltada genuinamente para o atendimento das necessidades humanas e as necessidades de auto-reprodução de si próprio. Quanto mais aumentam a competição e a concorrência intercapitais, mais nefastas são suas consequências, das quais duas são particularmente graves: a destruição e/ou precarização, sem paralelos em toda a era moderna, da força humana que trabalha e em si não passa de um modo e um meio dinâmico de mediação reprodutiva, devoradora e dominadora, articulada com um conjunto historicamente específico de estruturas e suas práticas sociais institucionalmente incrustadas e protegidas. É um sistema claramente identificável de mediações que, na forma adequadamente desenvolvida, subordina rigorosamente todas as funções de reprodução social – das relações de gênero e família até a produção material e a criação das obras de arte – à exigência absoluta de sua própria expansão, ou seja: de sua própria expansão constante e de sua reprodução expandida como um sistema de mediação sociometabólico. (ANTUNES, 2002, p. 26).

Assim, conforme Antunes (2002) na globalização capitalista as profundas transformações impostas ao mundo do trabalho e o intenso processo de reestruturação produtiva reconfiguraram o mundo e redimensionaram o mundo do trabalho e todos os padrões de sociabilidade vigentes, influenciando das relações de gênero à família, da produção material até a criação artística.

O capital orientado na direção da ampliação da acumulação, passa a mediar todas as relações humanas, mas como ele é portador de um caráter destrutivo e incapaz de trilhar verdadeiramente um caminho de sustentabilidade e valorização da vida e do trabalho além dos interesses econômicos e financeiros, acaba apenas reordenando e recriando a velha exploração do trabalho, estabelecendo os novos contornos da exploração.

Branco (2004) quando comenta essa situação, parece confirmar as afirmações de Antunes (2002) quando também afirma:

A globalização em curso, sem dúvida, impõe à maior parte da humanidade globalizada uma condição cruel. [...] A opressão, a tirania do dinheiro nas condições da economia globalizada atual mostra a relação existente entre o papel do setor financeiro e a produção, o que significa a relação entre o extraordinário universo das finanças e a economia real. Como resultado dessa ideologia capitalista globalizante, as empresas foram levadas a lutar por sobrevivência e hegemonia, utilizando uma política predatória, à custa do enorme desemprego, com a justificativa da necessidade de promover consideráveis reduções nos custos dos fatores de produção.[...] A concorrência e a competitividade, que impulsionam o consumo, comandam as ações das empresas multinacionais no processo globalizado em curso. A concorrência, por sua vez, leva as empresas a buscarem eliminar qualquer obstáculo sem nenhum tipo de consideração. (BRANCO, 2004, pp. 19-20)

Dessa forma percebe-se que a financeirização global tem provocado de forma ampla o desaparecimento de milhões de postos de trabalho, a criação de empregos precários, a

127 intensificação da terceirização das relações de trabalho, assim como a redução dos direitos trabalhistas já conquistados. É nesse contexto que se percebe no mundo inteiro a ampliação da escravidão de trabalhadores, o trabalho forçado, a ampliação da degradação da relação capital-trabalho.

Martins (1999) também ao falar desse contexto histórico, afirma:

O novo modelo econômico que resulta da chamada globalização tem levado, em muitos países, à intensificação da exploração do trabalho e à anulação de conquistas trabalhistas da maior importância. [...] É nessa nova realidade econômica que a superexploração tende, em circunstâncias específicas, a se tornar trabalho escravo. E seguramente esse é um dos poderosos fatores que levaram a Organização Internacional do Trabalho, em 1993, a constatar a existência, no mundo, de mais de seis milhões de trabalhadores escravizados (MARTINS, 1999, p. 131)

Martins (1999) também observa assim que essa nova realidade econômica tende a fomentar o trabalho degradante, a desmontagem das conquistas trabalhistas e a impor um novo tipo de escravidão do trabalhador, que no interior do sistema capitalista e sob determinadas circunstâncias vai alastrando como uma desigualdade, uma negação da cidadania e uma exploração cada vez mais generalizada.

Essa exploração inclusive usa formas não capitalistas de exploração, como a escravidão por dívida e o trabalho forçado, para ampliar ainda mais a acumulação primitiva de capitais em flagrantes violações aos direitos humanos mais elementares, não tendo nenhuma proximidade com o discurso ideológico neoliberal de que o capitalismo contemporâneo é marcado por um sistema de oportunidades a quem trabalha, possibilidade de ascensão social e melhoria das condições de vida impulsionadas pelo "livre" mercado.

O ideário neoliberal até entrar em crise no final da primeira década do século XXI se apresentava como uma espécie de avanço da economia de mercado, o guardião da reprodução capitalista eficiente e garantia para total felicidade a partir do mercado sem intervenções do Estado. Esse discurso ideológico contaminou muitos setores intelectuais, operários e diversos segmentos dos trabalhadores.

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1.16 A Questão da Hibridação Cultural e da Escravidão Contemporânea Na

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