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147 147 frequentemente abuse do seu direito de defesa com o objetivo de protelar o término do processo.

É por isso que a tutela antecipada baseada no abuso do direito de defesa ou propósito protela- tório do réu é um instrumento de correção do uso indevido do processo188. Não se obstrui o direito de ampla defesa, mas tão-somente se redistribui o ônus do tempo do processo, devendo suportar a demora a parte que conta com probabilidade menor de êxito.

Para Sérgio Cruz ARENHARDT e Luiz Guilherme MARINONI189, essa distribuição do tempo no processo deve ser feita de acordo com a evidência do direito afirmado pelo autor e a fragilidade da defe- sa apresentada pelo réu, não bastando apenas a caracterização do primeiro. Um direito é evidenciado de pronto quando é demonstrado, ainda que com base em um critério de probabilidade, desde logo. A defesa é frágil quando deixa entrever a grande probabilidade de o autor resultar vitorioso.

Segundo Ovídio Araújo BAPTISTA DA SILVA190, o que o legislador quis significar, nesta hipóte- se191não foi, de modo algum, a consideração de que essa antecipação teria caráter punitivo contra a litigância temerária192. O que se dá, com a conduta do réu, nestes casos, é que o índice de verossimilhan- ça do direito do autor eleva-se para um grau que o aproxima da certeza193. Se o juiz já se inclinara por considerar verossímil o direito, agora, frente à conduta protelatória do réu, ou ante o exercício abusivo do direito de defesa, fortalece-se a conclusão de que o demandado realmente não dispõe de nenhuma contestação séria a opor ao direito do autor. Daí a legitimidade da antecipação da tutela.

A tutela de evidência fundada em abuso do direito de defesa apenas é possível quando a defe- sa ou o recurso do réu deixam a entrever a grande probabilidade de o autor resultar vitorioso e, conse- quentemente, a injusta espera para a realização do direito194. Por outro lado, entendemos que para a caracterização do abuso do direito de defesa ou propósito protelatório não se faz necessária a intenção do réu de se servir indevidamente do processo, podendo ocorrer tanto na contestação e em recursos, como em atos extraprocessuais anteriores à propositura da ação, como notificações, interpelações, protestos ou correspondências.

188Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 623), elenca exemplos de condutas que autorizam a concessão da tutela de evidência punitiva, verbis: “a). reiterada retenção dos autos por tempo

prolongado; b). fornecimento de endereços inexatos a fim de embaraçar intimações; c). prestar informações erradas; d). embaraçar a produção de provas – pericial, testemunhal, inspeção judicial, etc; e).’pode igualmente revelar-se pelo confronto com sua atitude em outro processo’, onde havia sustentado determinados fundamentos de fato ou de direito; todavia, no processo conexo, adota argumentação antagônica, sem justificar devidamente o descompasso; f). invocar uma tese bisonha ou oposta à orientação dominante nos tribunais superiores etc; g). alienação de bens necessários à satisfação do demandante; h). repetir requerimento antes indeferido”.

189In: Manual do Processo de Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 224. 190In: Curso de Processo Civil, Vol. 1, p. 142

191Esta hipótese estava contemplada no artigo 273, inciso II do CPC/73.

192No mesmo sentido, Sérgio Cruz ARENHARDT e Luiz Guilherme MARINONI (In: Manual ..., p. 223-224), verbis: “Para efeito de

tutela antecipatória, é possível extrair do art. 17 do CPC alguns elementos que podem colaborar para a caracterização do abuso de direito de defesa. Isto não significa, porém, que as hipóteses do art. 17 possam servir de guia para a compreensão da tutela antecipatória fundada em abuso de direito de defesa”.

193Ao tratar do tema, leciona Daniel MITIDIERO (In: Antecipação da Tutela – Da tutela cautelar à técnica antecipatória. São Paulo: Revista do Tribunais, 2012, p. 134-5): “isso quer dizer que a antecipação da tutela fundada na evidência (art. 273, II,

CPC) não pode ser tomada como caso de tutela antecipada sancionatória. Não é essa a sua natureza. A tutela antecipatória fundada em abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu constitui mais propriamente antecipação da tutela fundada na maior probabilidade de veracidade da posição jurídica de uma das partes”.

194Segundo Freddie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 623), “há outro fator

que colabora para a baixa incidência desse tipo de tutela provisória. Para que seja concedida, é necessário que haja verossimi- lhança das alegações e probabilidade de acolhimento da pretensão. Em contrapartida, observa-se uma fragilidade da manifes- tação da outra parte – que emprega argumentos e meios processuais abusivos, apresentando defesa despida de seriedade -, o que conduz, não raro, ao indeferimento das provas por ele requeridas, porquanto inúteis ou meramente protelatórias. Tudo isso, normalmente, autorizará o juiz a realizar um julgamento antecipado de mérito (art. 355, I, CPC), diante da dispensabili- dade de produção de mais provas – fora aquelas trazidas pelo autor. Conclui-se que o abuso do direito de defesa ou o manifes- to propósito protelatório do réu, em muitas situações, pode acabar conduzindo a um julgamento antecipado do mérito e, não, a uma tutela provisória. Assim, a grande utilidade da antecipação provisória dos efeitos da tutela, nesses casos, reside na possibilidade de afastar o efeito suspensivo da apelação, conferindo-se eficácia imediata à sentença”.

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16.4.3.2. As alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e hou- ver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante: a concessão de tutela de evidência quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente já tinha sido proposta por Luiz FUX, consoante mencionado no item 1, supra. Assim, as hipóteses previstas nos incisos II, III e IV do artigo 311 do NCPC refletem a concepção de tutela de evidência deste doutrinador. Na hipótese tratada neste item, além da prova documental, deverá haver tese firmada em julgamento de casos repetitivos195, no que é bastante razoável a previsão legislativa. Trata-se de tutela provisória de evidência admitida mediante o preenchimento de dois pressupostos:

a) o primeiro deles é a existência de prova das alegações de fato da parte requerente, que neces- sariamente deve ser documental ou documentada (como a prova emprestada ou produzida an- tecipadamente) e recair sobre fatos que justificam o nascimento do direito afirmado, isto é, fato constitutivo do direito. Esse pressuposto é desnecessário quando o fato gerador do direito não depender de prova (ou outras provas), como o fato notório, o fato confessado, o fato incontro- verso, o fato presumido.

b). o segundo é a probabilidade de acolhimento da pretensão deduzida, que se configura em ra- zão do fundamento normativo da demanda consistir em tese jurídica já firmada em precedente obrigatório, mais precisamente em súmula vinculante (art. 927, inciso II do NCPC) ou em julga- mento de demandas ou recursos repetitivos (art. 927, III, NCPC), que vinculam o julgador e de- vem por ele ser observados, inclusive liminarmente (parágrafo único, artigo 311 do NCPC)196.

A decisão que conceder a tutela de evidência, com base no artigo 311, inciso II, deverá identifi- car os fundamentos determinantes do precedente utilizado, demonstrando que o caso objeto do julga- mento se assemelha ao caso que lhe deu origem, ajustando-se aos seus fundamentos, nos termos do artigo 489, § 1°, inciso V, do NCPC. Por outro lado, a decisão denegatória dessa tutela de evidência do- cumentada, não poderá deixar de seguir o precedente ou enunciado de súmula invocado pela parte,

“sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento”, de

acordo com a previsão do artigo 489, § 1°, inciso VI, do NCPC.

Por derradeiro, a sentença final que confirmar, conceder ou revogar a tutela de evidência do- cumentada, fundada em precedente obrigatório, é impugnável por apelação, sem efeito suspensivo (art. 1.013, § 5° e 1.012, § 1°, inciso V, do NCPC).

195Ruy Zoch RODRIGUES fez essa proposta, dispensando o requisito da urgência para a concessão da tutela antecipada nas ações repetitivas à luz do CPC/73 (In: Ações repetitivas – Casos de antecipação de tutela sem o requisito de urgência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 197). No mesmo sentido, Daniel MITIDIERO (In: Antecipação da Tutela – Da tutela

cautelar à técnica antecipatória. São Paulo: Revista do Tribunais, 2012, p. 134-5), verbis: “trata-se da tutela antecipada funda- da na simples evidência que pode inclusive servir para proteção imediata e provisória de casos repetitivos, cuja adequada solução já se encontre bem amadurecida na jurisprudência”.

196Fredie DIDIER JÚNIOR (In: Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Jus Podivam, 2015, p. 625) propõe uma interpretação ampla para o inciso II do artigo 311 do NCPC, verbis: “propõe-se, contudo, interpretação sistemática, teleológica e extensiva da

regra, para que se entenda que deve ser possível a concessão de tutela de evidência também quando houver tese jurídica assentada em outros precedentes obrigatórios, tais como aqueles previsto no art. 927, CPC. Seria o caso da tese fixada em decisão do STF dada em sede de controle concentrado e dos enunciados das Súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional. Devem ser levados em conta todos os prece- dentes vinculantes exatamente porque o estabelecimento de uma ratiodecidendi com força obrigatória por tribunal superior já foi antecedido de amplo debate dos principais argumentos existentes em torno do tema, limitando as possibilidades argumen- tativas da parte em face da qual se requer a tutela de evidência e tornando pouco provável o seu êxito (salvo se conseguir demonstrar uma distinção do caso em exame com o caso paradigma ou a superação do precedente). A parte que postula com base em fatos provados por documento e que sejam semelhantes àqueles que ensejaram a criação de tese jurídica vinculante em tribunal superior – tese esta invocada como fundamento normativo de sua postulação -, encontra-se em estado de evidên- cia. Demonstra não só a probabilidade de acolhimento da sua pretensão processual como também a improbabilidade de sucesso do adversário que se limite a insistir em argumentos já rejeitados no processo de formação do precedente, o que configuraria, inclusive, litigância de má-fé (por defesa infundada ou resistência injustificada, cf., art. 80, CPC)”.

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16.4.3.3. Se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob comi- nação de multa197: mais uma vez o inciso contemplou a possibilidade de concessão de tutela de evidên- cia, desde que haja prova adequada de contrato de depósito. Entendemos não haver a necessidade, para a concessão da tutela de evidência, que exista um contrato formal de depósito. O que o dispositivo legal exige é a prova documental do contrato de depósito, seja ele escrito ou verbal. A exigência de prova documental neste inciso respectivo reflete mais uma vez a concepção de Luiz FUX de tutela de evidência. Uma vez preenchido esse pressuposto, a tutela provisória de evidência será concedida, mediante “ordem

de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa”. Não é demasiado referir, que o legislador

permitiu apenas a tutela provisória de evidência específica da obrigação e não a tutela genérica do seu equivalente em dinheiro198. Conforme leciona Freddie DIDIER JÚNIOR,

Ademais, quando formulado o pedido reipersecutório, sua conversão em perdas e danos (obrigação de pagar quantia correspondente) pressupõe mais do que simples prova documental adequada do contrato de depósito; é necessário um aprofundamento cognitivo mediante apresentação da prova da impossibilidade do cumprimento da obrigação in natura ou da obtenção do resultado prático equivalente; ou manifestação de opção do autor no sentido de recebimento do valor correspondente – manifestação esta que já configura pretensão pecuniária e não reipersecutória (art. 499, CPC).

Por derradeiro, em que pese o dispositivo legal referir a incidência de multa cominatória, deve- se interpretá-lo conjuntamente com o artigo 536 do NCPC. De acordo com esse dispositivo legal, além da multa, o magistrado tem o poder geral de determinar outras medidas necessárias para a efetivação do provimento, à luz do caso concreto.

16.4.3.4. A petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos o direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável: mais uma vez a con- cepção de Luiz Fux está presente no dispositivo legal. Todavia, não basta para a concessão da tutela de evidência que a inicial esteja instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor. É necessário que o réu não oponha prova que seja capaz de gerar dúvida razoável. Evidente- mente que não basta o réu fazer meras alegações contra o direito invocado pelo autor. Deverá ele provar as teses suscitadas, de modo a gerar dúvida. No tocante a este aspecto, poderá o réu se valer de todos os meios de prova em direito admitidos, podendo inclusive utilizar-se de provas unilateralmente produzi- das. Em razão do princípio do contraditório da prova, evidentemente que o magistrado não poderá julgar com base em provas unilaterais. Todavia, as mesmas se prestam para a finalidade de gerar dúvida razoá- vel no julgador. No tocante a este aspecto, nada impede que, após haver a produção da prova unilate- ralmente produzida, com a observação do contraditório, o julgador entenda que o réu não opôs prova capaz de gerar dúvida razoável.

Pode-se afirmar que a aplicação da hipótese prevista no artigo 311, inciso IV, do NCPC, exige o preenchimento de três pressupostos. O primeiro deles é que a evidência seja demonstrada pelo autor, mediante prova documental - ou documentada, v.g., prova emprestada ou antecipadamente produzida -, e que não seja “abalada” pelo réu. O segundo pressuposto é que o autor traga prova documental ou documentada dos fatos constitutivos do seu direito. O terceiro, diz respeito à ausência de contraprova

197O NCPC extinguiu o procedimento especial de depósito, previsto no CPC/73 nos artigos 901-906. Em seu lugar passou a admitir que a obrigação de restituir coisa decorrente de contrato de depósito seja tutelada pelo procedimento comum, aplicando-se as regras da tutela específica das obrigações de entregar coisa do art. 498 e seguintes do NCPC. O art. 902 do cpc/73 continha regra especial de tutela provisória de evidência para essas obrigações. Na sistemática vigente no CPC/73, bastava que o contrato de depósito fosse objeto de prova literal para que se configurasse sua evidência e se admitisse a tutela provisória da obrigação correspondente. Essa técnica foi preservada com o art. 311, III, do NCPC, em que pese ser restrita ao depósito convencional.

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documental por parte do réu, que seja apta a gerar dúvida razoável em torno do fato constitutivo do direito do autor.

Concordamos com Fredie DIDIER JÚNIOR199 quando afirma que a tutela de evidência prevista no artigo 311, inciso IV, do NCPC, é inevitavelmente definitiva, confundindo-se com o julgamento antecipa- do da lide e que fora, equivocadamente, colocada no rol de hipóteses de tutela provisória, verbis:

Insista-se: a contraprova do réu, cuja ausência se pressupõe para a con- cessão de tutela de evidência, é a documental. Isso porque se o réu não dispuser de nenhum outro meio de prova suficiente, além da documental, então já será o caso de julgamento antecipado do mérito por desnecessida- de de produção de outras provas (art. 335, I, CPC).

Por isso se pode dizer que, da aplicação da regra, só pode decorrer uma tu- tela definitiva por julgamento antecipado do mérito.

De um lado, porque se a contraprova documental do réu é insuficiente, mas ele requer a produção de outros meios de prova, não é autorizada a con- cessão da tutela provisória de evidência, que pressupõe que se trate de causa em que a prova de ambas as partes seja exclusivamente documental. Nesses casos, o juiz prosseguirá com a determinação da coleta de novas provas em favor do réu.

De outro, se a contraprova documental do réu é insuficiente e ele não re- quer a coleta de outras provas, fica autorizado o julgamento antecipado do mérito da causa (art. 355, I, CPC), com a concessão de tutela definitiva, mediante cognição exauriente.

Trata-se de hipótese de tutela de evidência inevitavelmente definitiva, que se confunde com o julgamento antecipado do mérito e que fora, equivoca- damente, colocada no rol de hipóteses de tutela provisória.

A única utilidade prática do dispositivo legal é a eliminação do efeito suspensivo da apelação, no caso de julgamento antecipado do mérito pela procedência do pedido do autor.

16.4.4. Processamento da tutela de evidência: a única regra que o artigo dispõe sobre o proce- dimento da tutela de evidência, é o disposto no parágrafo único, verbis: “nas hipóteses dos incisos II e III,

o juiz poderá decidir liminarmente”. Deve-se interpretar a expressão “liminarmente” na exata acepção da

palavra, que é derivar da expressão latina in limine, que significa no início do processo. Assim, nas hipó- teses previstas nos incisos II e III do artigo 311, poderá o magistrado conceder a tutela de evidência sem a ouvida do réu, tal como permite o artigo 9°, inciso I, do NCPC. As demais hipóteses previstas no artigo 311, não estão contempladas no parágrafo único, porque a concessão de ambas pressupõe que o réu já tenha integrado a relação processual.

As duas exceções previstas no parágrafo único do art. 311 do NCPC reforçam a tese de que a tu- tela de evidência é provisória, emitida com base em cognição sumária, estando sujeita a ser confirmada por ocasião da sentença, por uma simples e incontestável razão: entendemos que o julgador não teria como julgar a ação procedente liminarmente sem que o réu sequer tenha sido citado. Haveria, sem qualquer sombra de dúvida, violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

16.4.4.1. Da aplicação das disposições gerais referentes à tutela provisória: entendemos os arti- gos que dispõem sobre regras gerais à tutela provisória (art. 294 a 299 do NCPC), aplicam-se integral- mente à tutela de evidência, sempre que forem compatíveis.

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