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CABIMENTO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO QUANDO O ACÓRDÃO RECORRIDO JULGAR VÁLIDA LEI LOCAL CONTESTADA EM FACE DE LE

No documento Rafael de Oliveira Guimarao (páginas 135-137)

4 DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO

4.4 CABIMENTO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO QUANDO O ACÓRDÃO RECORRIDO JULGAR VÁLIDA LEI LOCAL CONTESTADA EM FACE DE LE

FEDERAL

A Constituição Federal estabelece, em seu art. 102, III, d, que compete ao Supremo Tribunal Federal julgar recurso extraordinário quando a decisão recorrida julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

Tal hipótese era contida, anteriormente à Emenda Constitucional 45/2004, no art. 105, II, b, da CF/88, ou seja, era previsto o recurso especial para o caso, uma vez que o legislador constitucional que, quando o acórdão recorrido declarasse válida a lei local em detrimento de lei federal, esta última estaria sendo questionada em sua interpretação. Ocorre que a lei federal não possui necessariamente hierarquia superior à lei local. Existem casos em que a lei local pode ter aplicabilidade em detrimento de uma lei federal. A hipótese do art. 30, inc. I, da CF/88 é um exemplo claro disso, pois prevê a competência dos Municípios para legislarem sobre interesse local. Outro exemplo é o art. 24 da CF/88, que prevê a competência legislativa concorrente entre Estados, União e Municípios para legislarem sobre determinadas matérias.

Dessa forma, observa-se que há casos em que a lei local pode ter validade, independentemente de a lei federal regular a matéria. Por isso, o legislador constitucional entendeu por bem “transportar” a hipótese para o recurso extraordinário, pois já era o entendimento do STF, e a questão – discussão de validade de lei local e lei federal no caso concreto – envolve, necessariamente e anteriormente, a verificação da competência legislativa para tanto, matéria, por óbvio, de cunho constitucional.

José Miguel Garcia Medina e Teresa Arruda Alvim Wambier366, ao comentarem o dispositivo, afirmam:

[...] de acordo com a aliena d do inciso III do art.102 da Constituição, caberá recurso extraordinário – e não especial – contra acórdão que julgar válida lei local contestada em face de Lei Federal. É que, nesse caso, a controvérsia que se põe não concerne meramente à legislação infraconstitucional. Em verdade, a disputa diz respeito à distribuição constitucional da competência para legislar: se a lei local está sendo contestada em face de lei federal, é

366 MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recursos e ações autônomas de impugnação. Processo civil moderno. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. v. 2.p. 214. No mesmo

sentido: “Lei local contestada em face de lei federal. A EC/04 criou nova hipótese de cabimento de RE, para que o STF dirima questão constitucional consistente em reexaminar decisão final ou de última instância que julgou válida lei estadual contestada em face de lei federal.” (NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição Federal Comentada e Legislação Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 280).

porque se sustenta que ela tratou de matéria que, por determinação constitucional, haveria de ser disciplinada pelo legislador federal.

A hipótese referida, a rigor, diz respeito a questão constitucional, já que o princípio da hierarquia das normas é um princípio constitucional.

Devido aos argumentos acima expostos, independentemente de estar em discussão a real interpretação da lei federal no caso, sempre que estiver em discussão a aplicação no caso de uma lei local ou federal, por ser necessário previamente o exame da competência legislativa, e também, por imposição da Constituição Federal, será cabível o recurso extraordinário. Araken de Assis367 reforça tal entendimento ao enfatizar:

[...] é imperioso insistir que, representando dado de aferição para controlar a constitucionalidade de certa lei local o chamado bloqueio de competência – a lei federal, na respectiva competência legislativa, pré-exclui a lei local –, sempre existirá questão constitucional no ponto. O STF não assumiu, obliquamente, o controle da legalidade de tais leis.

Importante se faça uma pequena distinção para que se admita o recurso extraordinário com base na alínea d. A hipótese de cabimento ocorre somente quando o acórdão recorrido entender como válida lei local em detrimento de lei federal. Se for o inverso, ou seja, o acórdão recorrido tiver declarado válida lei federal em detrimento de lei local, conforme adverte Rodrigo Barioni, não será possível interpor o recurso extraordinário com fundamento na alínea d do inc. III do art. 102 da CF. No entanto, se a lei local foi indevidamente preterida pela lei federal, denotando a inobservância da regra de hierarquia das leis, questão de natureza constitucional, é permitido invocar a questão no caso de recurso extraordinário, fundado na alínea a.368

Desta forma, verifica-se que sempre caberá recurso extraordinário quando estiver em discussão a validade de lei local e lei federal, ante o fato de a questão envolver matéria constitucional de distribuição de competência legislativa, porém caberá recurso extraordinário pela alínea d se o acórdão recorrido entender, como válida, a lei local em detrimento da federal, e recurso excepcional pela alínea a se o acórdão entender, como válida, a lei federal em detrimento da lei local.

Por fim, cabe ressaltar que as hipóteses de cabimento de recurso extraordinário, em razão da competência legislativa da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, não podem envolver a interpretação dos dispositivos normativos infraconstitucionais. Se a questão se

367 ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 767.

368 Cf. BARIONI, Rodrigo. Ação rescisória e recursos para os tribunais superiores. São Paulo: Revista dos

circunscrever somente à interpretação da lei federal, ainda que concomitante ao cabimento de recurso extraordinário, será hipótese de recurso especial de acordo com o art. 105, III, a, da CF/88. No entanto, se a questão se limitar à interpretação de lei local, mesmo que num contexto com lei federal, a hipótese da alínea d do inc. III do art. 102 da CF/88 não poderá ser invocada conforme vem decidindo o STF369, pois esbarraria na Súmula 280 do STF370. Na verdade constituiria uma alegação oculta de violação a dispositivo de lei local. A hipótese ora discutida envolve necessariamente a análise da questão de repartição de competência legislativa.

No documento Rafael de Oliveira Guimarao (páginas 135-137)

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