• Nenhum resultado encontrado

Da obrigatoriedade de a causa ter sido decidida O prequestionamento

No documento Rafael de Oliveira Guimarao (páginas 76-89)

2 APONTAMENTOS SOBRE OS RECURSOS EXCEPCIONAIS

2.2 DAS CARACTERÍSTICAS COMUNS DOS RECURSOS EXCEPCIONAIS

2.2.3 Dos pressupostos específicos para o cabimento dos recursos excepcionais

2.2.3.2 Da obrigatoriedade de a causa ter sido decidida O prequestionamento

O prequestionamento não é algo que se possa afirmar como criação genuinamente doutrinária ou jurisprudencial. Embora a palavra “prequestionamento” não apareça em texto legislativo algum, mas sim na doutrina e na jurisprudência, o instituto tem origem em normas constitucionais brasileiras mais antigas.

As Constituições anteriores à de 1988 ventilavam o termo “questionar”, referindo-se ao tema objeto de debate nas instâncias locais, como requisito obrigatório para a interposição do recurso extraordinário. Neste sentido, o art. 59, § 1.º, da CF/1891212 mencionava o cabimento do recurso extraordinário quando se questionava a validade ou a aplicação de tratados e leis federais, e a decisão do Tribunal do Estado fosse contra ela. O texto constitucional foi seguido com poucas modificações pelas Constituições de 1934, que previa disposição semelhante no art. 76, 2, III, a e b213; pela de 1937, em seu art. 101, III, a e b214; e pela Constituição de 1946, em seu art. 101, III, b.215

212 “Art. 59 - Ao Supremo Tribunal Federal compete: [...] § 1º - Das sentenças das Justiças dos Estados, em

última instância, haverá recurso para o Supremo Tribunal Federal: a) quando se questionar sobre a validade, ou a aplicação de tratados e leis federais, e a decisão do Tribunal do Estado for contra ela.”

213 “Art 76 - A Corte Suprema compete: [...] 2) julgar: [...] III - em recurso extraordinário, as causas decididas

pelas Justiças locais em única ou última instância: a) quando a decisão for contra literal disposição de tratado ou lei federal, sobre cuja aplicação se haja questionado; b) quando se questionar sobre a vigência ou validade de lei federal em face da Constituição, e a decisão do Tribunal local negar aplicação à lei impugnada; [...] d) quando ocorrer diversidade de interpretação definitiva da lei federal entre Cortes de Apelação de Estados diferentes, inclusive do Distrito Federal ou dos Territórios, ou entre um deste Tribunais e a Corte Suprema, ou outro Tribunal federal.”

214 “Art 101 - Ao Supremo Tribunal Federal compete: [...] III - julgar, em recurso extraordinário, as causas

decididas pelas Justiças locais em única ou última instâncias: a) quando a decisão for contra a letra de tratado ou lei federal, sobre cuja aplicação se haja questionado; b) quando se questionar sobre a vigência ou validade da lei federal em face da Constituição, e a decisão do Tribunal local negar aplicação à lei impugnada;”

215 “Art 101 - Ao Supremo Tribunal Federal compete: [...] III - julgar em recurso extraordinário as causas

decididas em única ou última instância por outros Tribunais ou Juízes: a) quando a decisão for contrária a dispositivo desta Constituição ou à letra de tratado ou lei federal; b) quando se questionar sobre a validade de lei federal em face desta Constituição, e a decisão recorrida negar aplicação à lei impugnada;”

Rodolfo de Camargo Mancuso216 e Nelson Nery Junior217 opinam no sentido de que o prequestionamento, como termo, tem raiz no direito nacional, nas citadas previsões constitucionais do final do século XIX e primeira metade do século XX.

Prequestionar, nos dizeres de José Miguel Garcia Medina, seria o dever de o recorrente provocar o surgimento da questão federal ou constitucional perante a instância inferior:

Essa visão acerca do vocábulo questão encontra amparo no próprio sentido vernacular do termo, pois questionar é discutir, fazer questão, controverter, e importa, para o recurso extraordinário ou o recurso especial, que a questão (constitucional ou federal) esteja presente na decisão recorrida. Somando-se a palavra questionar ao termo pré – que dá a ideia de antecedência, antecipação –, infere-se que prequestionamento significa exatamente o ato de discutir ou controverter, antecipadamente, acerca, de algum assunto. Ora, se a questão constitucional deve estar na decisão recorrida, logicamente o prequestionamento deve ocorrer antes da decisão recorrida, porquanto essa decisão é que eventualmente será alvo de recurso.218

Vê-se que o “prequestionamento”, em um sentido stricto, é um ato do recorrente de suscitar questões jurídicas perante um órgão de jurisdição ordinária. O fato de o órgão jurisdicional ter “respondido”, ou não, a súplica das partes não significa necessariamente dizer que as questões jurídicas não foram suscitadas.

Há de observar que o conceito de “prequestionamento”, ora exposto, se coaduna com a previsão constitucional da época de sua concepção. Conforme anteriormente citado, o mandamento constitucional, desde a Constituição de 1891 até a de 1946219, permitia o manejo do recurso extraordinário desde que a questão federal ou constitucional fosse questionada, não

216 “Como se sabe, o prequestionamento, como pré-requisito do extraordinário, é exigência antiga, já constante

da CF de 1891 (art. 59, § 1.º, a: quando se questionar sobre a validade ou a aplicação de tratados e leis federais e a decisão do tribunal do Estado for contra ela.); nas de 1934 (art. 76, 2, III, a e b), 1937 (art. 101, III, a e b) e 1946 (art. 101, III, b)”. (MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso

especial. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 275).

217 “As CF´s de 1891, 1934, 1937 e 1946 faziam referência expressa ao termo ‘questionar’ a validade da lei

federal ou a matéria constitucional, para efeito de admissibilidade do recurso extraordinário.” (NERY JUNIOR, Nelson. Ainda sobre o prequestionamento – embargos de declaração prequestionadores. In: NERY JUNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. (coords.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos

cíveis e de outras formas de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p.

856).

218 Cf. MEDINA, José Miguel Garcia. Prequestionamento e repercussão geral. E outras questões relativas aos

recursos especial e extraordinário. 5. ed. rev. e atual. da obra Prequestionamento nos recursos extraordinário e especial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 119.

219 Ponto também levantado por Marcos André Franco Montoro. Cf. MONTORO, Marcos André Franco. Requisitos de admissibilidade do recurso especial. São Paulo, 2005, 235 f. Dissertação. (Mestrado em

Direito) – Pós-Graduação em Direito da Universidade de São Paulo, sob a orientação do Prof. Carlos Alberto Carmona. p. 131.

deixando expresso se era dever da parte ou do Tribunal se manifestar a respeito da questão jurídica suscitada.

Devido a tal previsão constitucional, considerava, a jurisprudência, ser necessário uma manifestação do recorrente sobre uma questão de direito, e após isso, uma resposta do Judiciário (ou não) sobre o tema ventilado. Daí se entender o sentido da Súmula 356 do Supremo Tribunal Federal, datada de 13 de dezembro de 1963, que preceitua que “o ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento”.

Ora, o Supremo Tribunal Federal exteriorizou o entendimento no sentido de que: a) deve a parte-recorrente primeiramente suscitar uma questão jurídica; b) se o Tribunal de instância ordinária se manifestar sobre tal questão, considera-se prequestionada a matéria; c) se, mesmo com a apresentação de embargos de declaração, o Tribunal continua sem se pronunciar sobre a matéria, esta se considera também prequestionada, porque o foi reiteradamente pela parte-recorrente.

Vê-se que, como dito, o Supremo Tribunal Federal sumulou o entendimento de não ser obrigatória a manifestação do Tribunal local sobre a questão de direito, podendo haver a supressão de tal condição se a parte suscitar novamente a questão mediante embargos de declaratórios. Compreende-se, dessa forma, que o entendimento tinha respaldo constitucional, pois as Cartas Magnas, até a promulgação da súmula, exigiam o questionamento sobre a questão de direito, não preceituando expressamente que este deveria ser feito pelas partes ou pelos Tribunais ordinários. Assim, tinha amparo o chamado “prequestionamento ficto”, mencionado por Rodolfo de Camargo Mancuso em sua obra. Para o autor, embora não existisse manifestação do Tribunal no acórdão recorrido, a Suprema Corte o tinha por satisfeito, como pressuposto processual recursal, quando o recorrente buscou obter a explicação debatida no recurso extraordinário, pela via da oposição de embargos de declaração.220

Com a Constituição de 1967, o “prequestionamento ficto” perdeu sua congruência com o sistema jurídico, pois a mencionada Lei Maior passou a prever, em seu art. 119, III221, a possibilidade de se apresentar recurso extraordinário somente nos casos em que a questão de

220 Cf. MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial. 11. ed. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 2010. p. 288.

221 “Art 114 - Compete ao Supremo Tribunal Federal: III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas

decididas, em única ou última instância, por outros Tribunais, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição ou negar vigência a tratado ou lei federal; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato do Governo local, contestado em face da Constituição ou de lei federal; d) dar à lei federal interpretação divergente da que lhe haja dado outro Tribunal ou o próprio Supremo Tribunal Federal.”

direito fosse realmente decidida pelos Tribunais em última ou única instância ordinária, o que nada mais é do que chamada “questão decidida”.

Desta feita, deveria haver uma mudança de interpretação ante a modificação da hipótese de cabimento, pois, segundo lição de Carlos Maximiliano, na interpretação da Lei, “devem-se compreender as palavras como tendo alguma eficácia”222. Ou, com outras palavras: A Lei não contém disposições (frases ou palavras) desnecessárias.

Nessa marcha, se anteriormente à promulgação da Constituição de 1967, pairava alguma dúvida sobre o sentido do “prequestionamento”, a modificação sana a dúvida, deixando claro que o cabimento do recurso excepcional não estava mais sujeito ao “prequestionamento” no sentido stricto, ou seja, mediante suscitação das partes, mas sim, à manifestação do Tribunal de instância ordinária acerca da questão de direito a ele posta. Dito isto, constata-se que o “prequestionamento”, em seu sentido estrito ou teleológico, não era mais requisito de cabimento do recurso extraordinário, mas sim o fato do Tribunal ordinário ter se manifestado sobre a questão jurídica. Embora não seja exatamente um “prequestionamento”, no sentido terminológico, a nomenclatura perdurou para fins práticos, sendo incorporada pela doutrina e pela jurisprudência.

Também a Corte Suprema continuou a chamar o requisito específico do cabimento do recurso extraordinário de “prequestionamento”, porém seu entendimento sobre o instituto não se modificou. O STF, ante o entendimento sumulado no verbete n. 356, na maioria de seus julgados continua a posicionar-se pela legalidade do “prequestionamento ficto”223.

Com a promulgação da Constituição de 1988, o “prequestionamento ficto” passou a ser alvo de muitas críticas. Isto porque, como se não bastasse a permanência, nos arts. 102, III, e 105, III na nova Constituição, do entendimento de que os recursos excepcionais seriam cabíveis somente quando houvesse manifestação sobre a questão de direito pelo Tribunal de

222 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1993. p.

250.

223 “[...] Além disso, de acordo com a jurisprudência desta Corte, para se ter como prequestionada, a matéria

deve ter sido trazida nas razões do recurso, ou nas contrarrazões a ele apresentadas, e abordada no acórdão recorrido, ou, caso omisso o tribunal recorrido, suscitada em embargos de declaração. [...] Da mesma forma, para que a ofensa surgida no acórdão recorrido seja considerada prequestionada, deve-se dar ao tribunal recorrido, via embargos de declaração, oportunidade para manifestar-se acerca da violação apontada. Nesse sentido, confira-se a ementa do seguinte julgado: ‘Agravo regimental. - Não tem razão o agravante. Com efeito, a questão constitucional só está prequestionada se foi ventilada na decisão recorrida ou, se esta for omissa, foi objeto de embargos de declaração; e, se ela surgiu originariamente na decisão recorrida, para o seu prequestionamento é mister que seja levantada em embargos de declaração para possibilitar ao Tribunal ‘a quo’ pronunciar-se sobre ela. [...]’AI 392.689-AgR (rel. min.Moreira Alves, DJ 28.03.1993). [...]” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal, 2ª Turma, AgIn 760552 AgR, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 22.11.2011, DJe n. 231, de 05.12.2011).

instância ordinária (questão decidida), o constituinte originário criou o Superior Tribunal de Justiça.

O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, adotando a mais adequada técnica de interpretação do art. 105, III, da CF/88, argumentou (o que posteriormente se solidificaria com a Súmula 211/STJ) que o “prequestionamento” só ocorreria quando houvesse a manifestação do Tribunal local sobre a questão de direito, independentemente da oposição de embargos de declaração do recorrente para reiterar a manifestação do Tribunal local sobre a questão federal, e o órgão jurisdicional se mantém omisso224. Dessa feita, tem-se que o STJ não admite o “prequestionamento” pela parte-recorrente, pois entende que ele somente estará preenchido com a manifestação do Tribunal ordinário sobre a questão de direito alegada como mal-interpretada.

Ainda que a parte tenha, reiteradamente, provocado o Tribunal local pela via dos embargos de declaração, a alternativa será a interposição de recurso excepcional ante a omissão do Tribunal ao não se manifestar sobre a questão legal suscitada. Se o caso for de provocação do Tribunal a se manifestar sobre lei federal, maneja-se recurso especial por violação ao art. 535 do CPC225. Outrossim, se a omissão for atinente à questão constitucional, sugere-se, além da interposição de recurso especial por violação ao art. 535 do CPC, a apresentação de recurso extraordinário com fundamento na negativa de vigência do art. 5.º, LV, da CF/88226. Por igual, ventilando este recurso a questão constitucional “principal”, pois, como dito, o STF, na maioria dos casos, ainda admite a supressão do prequestionamento pela oposição de embargos de declaração, conforme o enunciado contido na súmula 356/STF. Este segundo fundamento para o recurso extraordinário é aconselhado dadas as razões práticas, mas não de acordo com o defendido no breve estudo.

224 “Não se depreende do acórdão recorrido o necessário prequestionamento da seguinte tese, a responsabilidade

da CEF pelo dano causado a recorrida, deixando de atender ao comando constitucional que exige a presença de causa decidida como requisito para a interposição do apelo nobre (art. 105, inc. III, da CR/88). Incidência da Sumula n. 211 desta Corte.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma, REsp n. 1.272.129/RS, rel. Min. Mauro Campbell, j. 06.12.2011, DJe 13.12.2011).

225 “Se os embargos de declaração, opostos para efeito de prequestionamento, deixam de apreciar dispositivo de

lei federal, necessário que o recurso especial também seja interposto por violação à regra do art. 535 do CPC, sem o que resta inviabilizada a abertura da instância especial.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma, AGA 480386-SP, rel. Min. Castro Meira, j. 19.12.2003, DJe 25.02.2004. p. 148).

226 “Assim, antes do manejo do recurso contra error in judicando que, em tese, daria ensejo à abertura da via

extraordinária, mister a interposição de recurso especial e/ou extraordinário (consoante seja fundamentação) para ver o acórdão do tribunal a quo anulado por violação ao art. 535 do Código de Processo Civil ou do art. 5.º, inc. LV, da Constituição Federal pelo reconhecimento de error in procedendo.” (BUENO, Cássio Scarpinella. Súmulas 288, 282 e 356 do STF: uma visão crítica de de sua (re)interpretação mais recente pelos tribunais superiores. In: NERY JÚNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. (coords.). Aspectos

polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outras formas de impugnação às decisões judiciais. São Paulo:

Os referidos recursos não buscam a reforma do acórdão recorrido para obter do Tribunal Superior uma definição sobre o dispositivo legal originariamente discutido, mas sim sua anulação, já que não houve a manifestação sobre o provocado pelas partes, bem como a determinação, pela Corte Superior, para que o Tribunal local se manifeste sobre a questão jurídica anteriormente suscitada, e não apreciada.

Vê-se que as instâncias superiores brasileiras caminham em sentidos opostos no que tange ao entendimento acerca da configuração do prequestionamento. Enquanto a jurisprudência majoritária do STF continua a posicionar-se tendente a que ele esteja preenchido em razão da oposição de embargos declaratórios, o STJ argui que a matéria só estará prequestionada se a instância ordinária efetivamente se manifestar acerca da questão de direito em discussão.

Cássio Scarpinella Bueno, tomado de razão, tece críticas a essa disparidade de entendimentos sobre o instituto, justamente por deixar a parte, para quem o sistema jurídico é concebido, totalmente insegura com relação à ocorrência ou não do prequestionamento, violando o princípio da segurança jurídica. Ora, se o valor buscado por nosso ordenamento jurídico e seus intérpretes é a segurança, o que se pode dizer da ‘reinterpretação’ das súmulas, as quais expressam um resultado de interpretação decorrente de julgamentos reiterados e amadurecidos, quando a divergência de interpretação se encontra nas duas Cortes que, em nosso ordenamento jurídico, têm a função de dizer, em último grau, qual o Direito aplicável ao caso concreto, uniformizando esta aplicação?227

Em virtude da mencionada insegurança gerada pela divergência existente na jurisprudência de nossas cortes superiores, configura-se caracterizada a chamada “dúvida objetiva”, ou seja, a disparidade de posicionamentos existentes na jurisprudência sobre uma mesma questão, no caso o entendimento sobre prequestionamento.

Com substanciais argumentos, Teresa Arruda Alvim Wambier228 entende que numa situação em que a parte tenha realizado o “prequestionamento ficto” mediante embargos de declaração visando à interposição de ambos os recursos excepcionais, quando da análise do recurso especial pelo STJ, pela aplicação do princípio da fungibilidade, este não poderia deixar de conhecer o recurso especial, mas sim adiantar seu pensar acerca do

227 BUENO, Cássio Scarpinella. Súmulas 288, 282 e 356 do STF: uma visão crítica de de sua (re)interpretação

mais recente pelos tribunais superiores. In: NERY JÚNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. (coords.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outras formas de impugnação às decisões

judiciais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 200.

228 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Fungibilidade de “meios”: uma outra dimensão do princípio da

fungibilidade. In: NERY JUNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. (coords.). Aspectos polêmicos

e atuais dos recursos cíveis e de outras formas de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: Revista dos

prequestionamento, e, uma vez que, pelo posicionamento do STF, a matéria está prequestionada quando a parte apresenta embargos de declaração discutindo a matéria, admitir o recurso especial.

No obstante a existência da mencionada divergência entre os Tribunais Superiores, de acordo com o trazido no breve estudo, a noção de “prequestionamento” deve ser aquela defendida pelo Superior Tribunal de Justiça, principalmente pela mudança das Constituições a partir de 1967, conforme já explanado.

Se os recursos excepcionais têm a função de uniformizar o entendimento acerca da interpretação dada pelos Tribunais locais sobre um dispositivo de direito federal/constitucional, como a Corte Superior irá averiguar qual a interpretação do Tribunal ordinário, ou mesmo compará-la com a de outro Tribunal, se o acórdão recorrido nem sequer exteriorizou seu entendimento a propósito da questão de direito?

Eduardo Ribeiro espende argumentos nesse sentido229, argumentos estes que são complementados por Nelson Nery Junior230. Este afirma que somente as matérias efetivamente decididas pelas instâncias ordinárias é que podem ser levadas às Cortes Superiores, justamente porque a função dos Tribunais Superiores, quando do julgamento dos recursos excepcionais, é controlar a interpretação dada pelo Tribunal ordinário e uniformizar a jurisprudência nacional.

Dessa forma, a Súmula 211 do e. STJ231 tem total rigor técnico, pois, ao estabelecer que somente há prequestionamento quando o Tribunal local se manifesta sobre a correta interpretação de uma questão de direito, independentemente de a parte ter apresentado embargos de declaração, possibilita-se que a Corte Superior possa efetivamente constatar qual foi o entendimento de determinado Tribunal de instância ordinária sobre a matéria discutida, e, eventualmente, reformá-lo.

Além do “prequestionamento ficto” a que se referiu, e que encontra respaldo na Súmula 356 do STF, muito se tem discutido sobre outra modalidade de prequestionamento

229 “O mesmo se diga do especial, pois não como fazer-se o controle, quanto à correta interpretação do tratado

ou lei federal, em relação a matéria que não se cogitou.” (OLIVEIRA, Eduardo Ribeiro de. Prequestionamento. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY JUNIOR, Nelson (coords.). Aspectos

polêmicos e atuais dos recursos cíveis de acordo com a lei 9.756/98. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

248).

230 “Aí se encontra o cerne da questão, pois a CF atribui à matéria que se pretende levar ao Reexame das Cortes

Superiores o feito de haver sido efetivamente decidida em única ou última instância.” (NERY JUNIOR, Nelson. Ainda sobre o prequestionamento – embargos de declaração prequestionadores. In: NERY JUNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. (coords.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de

outras formas de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 856).

231 “Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não

foi apreciada pelo Tribunal a quo.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 211. DJ 03.08.1998, p. 366, RDDT vol. 37, p. 224, RSTJ vol. 108, p. 351, RT vol. 755. p. 189).

tido como ficto, que vem a ser aquele que o recorrente “requer o prequestionamento de tais artigos de lei” e o Tribunal “diz estar prequestionada a matéria”232.

Tal fenômeno jurídico significa o mesmo que a inexistência de prequestionamento, pois, como é sabido, este é a manifestação do Tribunal sobre uma questão de direito, ou seja, a decisão do Tribunal acerca de um dispositivo legal, emitindo juízo de valor sobre ele233, e não quando o Tribunal “afirma que a matéria se encontra prequestionada”.

Feita a definição do instituto do prequestionamento, para fins de cabimento de recurso excepcional, importante se faz analisar suas espécies, quais sejam: a) o explícito/expresso; e o

No documento Rafael de Oliveira Guimarao (páginas 76-89)

Outline

Documentos relacionados