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Considerações iniciais

No documento Rafael de Oliveira Guimarao (páginas 57-63)

2 APONTAMENTOS SOBRE OS RECURSOS EXCEPCIONAIS

2.2 DAS CARACTERÍSTICAS COMUNS DOS RECURSOS EXCEPCIONAIS

2.2.2 O juízo de admissibilidade dos recursos excepcionais

2.2.2.1 Considerações iniciais

todo um sistema jurídico164.

Posição interessante revela Sérgio Chiarloni. Para o autor, existe outro princípio constitucional por trás da função nomofilática dos Tribunais: o da isonomia165. Os jurisdicionados, ao depararem com uma interpretação legal dada por um órgão jurisdicional ordinário de última instância que destoa da interpretação dada pelo órgão de superposição, têm o direito de invocar esse “Tribunal de Cassação” para fazer valer aquela mesma interpretação em sua demanda.

Em suma, os recursos excepcionais são meios legais postos à disposição dos cidadãos para provocar os Tribunais de superposição, a fim de que estes digam qual o real entendimento de uma norma jurídica166 e, com isso, desenvolvam a melhor interpretação de uma questão de direito, norteando os Tribunais ordinários em demandas futuras.

2.2.2 O juízo de admissibilidade dos recursos excepcionais

2.2.2.1 Considerações iniciais

164 Sistema jurídico que segundo Karl Engish deve ter exatidão na sua compreensão, ou seja, deve ter uma

interpretação isonômica em todos os casos, “o conceito jurídico necessita de segurança no seu conteúdo e exactidão nos seus limites.” (ENGISH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. Tradução de João Baptista Machado. 6. ed., Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1988, p. 139). Joseph Raz entende que o sistema que possui essa exatidão é um sistema respeitado pelo jurisdicionado. Cf. “They may include pride that the law of one’s country is by the large enlightened and progressive, satisfaction that one lives under the protection of an adequate legal system, respect or even admiration for institutions or persons involved in creating or administering the law and for symbols of the law (the court house, etc.).” (RAZ, Joseph. The authority of

Law. 2. ed., Oxford: Oxford University Press, 2009, p. 251). O desrespeito à norma causa o enfraquciemento

do sistema jurídico. Cf. “Ademais, o agente pode seguir a regra mesmo que não tenha quaisquer crenças sobre porque ele está justificado em segui-la, por razões prudenciais (esse pode ser seu melhor jeito de garantir uma vida confortável ou de evitar constrangimento social, etc.), ou até mesmo por razões morais baseadas na sua rejeição moral ao sistema. Um anarquista, por exemplo, pode ser tornar juiz, pois se ele seguir a lei na maior parte do tempo, poderá desobedecê-las em algumas poucas, mas importantes, ocasiões em que isso acarretará o enfraquecimento do sistema.” (RAZ, Joseph. Razão prática e normas. Tradução José Garcez Ghirardi. São Paulo: Elsevier, 2010, p. 145). Ou seja, a norma interpretada de forma isonômica em todo o país traz confiança, respeito e até mesmo obediência ao sistema jurídico.

165 “Com riferimento al processo civile se um giudice di merito decide una controversia scostandosi dai

precedenti uniformi della corte di cassazione, Il soccombente vede violatta La paritá di trattamento nell’applicazione della legge con le parti di altri processi che anno visto altri giudici di merito uniformarsi a quei precedenti. La garanzia del ricorso di reparare in uma situazione del gerene ha la funzione di riparare alla violazione del principio di uguaglianza sofferto da quel soccombente.” (CHIARLONI, Sergio. Un singolare caso di eterogenesi dei fini, irremediabile per via di legge ordinária: La garantia constituzionale del ricorso in cassazione contro Le sentenze. In: MEDINA, José Miguel Garcia et al. (coords.).Os Poderes do

Juiz e o Controle das Decisões Judiciais. Estudos em homenagem à Professora Teresa Arruda Alvim

Wambier. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.p. 848).

166 “Les finalités imparties au mécanisme du recours em cassation consistent à assurer l’unité d’interpretation

des règles de droit.” (BARBIÉRE, Jean-Jacques. La procédure civile. Paris: Presses Universitaires de France, 1995. p. 116). Norma jurídica para Kelsen é “o termo se designa um mandamento, uma prescrição, uma ordem.” (KELSEN, Hans. Teoria geral das normas. Tradução José Florentino Duarte. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1986, p. 1)

Os recursos excepcionais, por obedecerem à sistemática básica dos recursos, possuem um duplo exame para a verificação de seu provimento: (a) um primeiro juízo de admissibilidade que tecnicamente é o conhecimento do recurso, justamente para verificar se contém os requisitos para ter seu mérito apreciado; e (b) o juízo de mérito, que envolve o ato de dizer se o recorrente tem razão, ou não, em sua pretensão recursal.

Nas duas etapas, ou seja, nos dois juízos, os recursos excepcionais atendem a uma sistemática diferenciada, encartam peculiaridades únicas em seu processamento. Tais recursos:

[...] impõem limitações cognitivas que se refletem na proporcional redução da capacidade investigatória das instâncias julgadoras ad quem, redução revelada tanto na investigação de questão de fato como de direito. Se em todos os recursos essa redução pode ser sentida, ela é muito mais justificável no contexto de um recurso que é, por definição, excepcional.167

Com relação ao juízo de admissibilidade, ainda sem enveredar no assunto “requisitos”, mas somente em seu processamento, é de ressaltar que o juízo de admissibilidade dos recursos excepcionais é bifásico, realizado primeiramente pela presidência do Tribunal a quo168, posteriormente também pelo Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal, a depender do caso. Exemplificando: de um acórdão proferido pela 1.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, há a impugnação por meio de recurso especial. O recurso é obrigatoriamente dirigido à 1.ª Vice-Presidência do Tribunal, daí a razão da petição de interposição ser apresentada para ele, e as razões recursais, anexas, são dirigidas ao STJ. O 1.º Vice-Presidente tem a competência para examinar os pressupostos de admissibilidade do recurso especial e, no caso de se encontrarem preenchidos, encaminhá-lo ao Superior Tribunal de Justiça. Ingressando o recurso no Tribunal Superior, deve o ministro-relator reapreciar os pressupostos de admissibilidade do recurso e, somente depois de preenchida essa etapa, verificar a razão do recorrente, ou seja, se pronunciar sobre uma possível violação à lei federal ou não.

Questão importante é o alcance do pronunciamento da presidência do Tribunal a quo. A disposição contida no art. 541 do CPC, ao dispor que o recurso somente será interposto

167 MENDES, Leonardo Castanho. O recurso especial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 179.

168 Ou ainda pela vice-presidência dependendo do Regimento Interno, já que o art. 541 do CPC autoriza que

ambos possam realizar o exame de admissibilidade. Temos como exemplo o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, onde a 1.ª Vice-Presidência é a competente para examinar a admissibilidade dos recursos excepcionais (cf. art. 13 do RITJPR), e o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, onde o Presidente do Tribunal é a autoridade competente para a tal apreciação segundo o art. 23, XI, “a”, do RITRF4.

perante o Tribunal estadual, induz ao pensamento de que a instância ordinária só poderá se pronunciar sobre a admissibilidade dos recursos excepcionais, e, ainda, tendo em vista que o art. 105, III, da CF/88 prevê claramente que o Superior Tribunal de Justiça é competente para julgar o recurso especial, a rigor, somente a Corte Superior seria competente para o exame do mérito recursal. A questão é controvertida na doutrina e jurisprudência.

Atualmente, o Superior Tribunal de Justiça entende que o exame da efetiva violação à lei federal se confunde com a admissibilidade do recurso especial, justamente por ser este o fundamento de admissibilidade recurso. Por isso, o posicionamento que predomina no STJ é de que poderia a presidência do Tribunal a quo negar a admissibilidade a um recurso especial pelo fundamento de que, de plano, já se verificaria no acórdão recorrido a inexistência de violação à lei federal.169 Segundo o que se extrai da Súmula 123 do STJ170, compete à presidência do Tribunal a quo o exame dos pressupostos constitucionais e infraconstitucionais do recurso. Assim, nas hipóteses em que o mérito do recurso é baseado na alínea a do art. 105, III, da CF/88, sendo esta fundamentação confundida com o pressuposto constitucional de admissibilidade, poderia o Tribunal estadual ferir o mérito do recurso.

Segundo o defendido no presente estudo, a efetiva constatação de violação à lei federal trata de exame de mérito do recurso especial. Pela própria inteligência da Súmula 123 do STJ, a presidência do Tribunal de origem não deveria se voltar à questão da violação da legislação. A alegação de violação faz parte da própria sistemática dos recursos de fundamentação vinculada. O próprio Supremo Tribunal Federal, guardião da interpretação constitucional, quando da interpretação do art. 102, III, da CF/88, ou seja, trazendo a exegese na norma constitucional quanto à admissibilidade e mérito dos recursos excepcionais, apontou

169 “Embargos de Declaração. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento. Enunciado 182 da Súmula do

Superior Tribunal de Justiça. Pontos Omissos. Existência. Recurso Especial. Juízo de Admissibilidade. Exame de Mérito. Usurpação de Competência. Não Ocorrência. [...] É pacífica a compreensão no sentido de ser possível ao Tribunal de origem, ao realizar o juízo primeiro de admissibilidade, adentrar no mérito dorecurso especial, não havendo falar em usurpação da competência do Superior Tribunal de Justiça. Embargos parcialmente acolhidos, sem efeitos modificativos.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 4ª Turma, EDcl no AgRg no Ag n. 1.023.098/MG, rel. Min. Raul Araujo Filho, j. 25.05.2010, DJe 10.06.2010). “Agravo Regimental. Agravo de Instrumento. Embargos do Devedor. Execução de Acordo Homologado Judicialmente. Juízo de Admissibilidade. Exame de Mérito do Recurso Especial. Possibilidade. Usurpação da Competência do STJ Não Ocorrida. Cumprimento de Acordo Não Homologado. Alegada Impossibilidade. Reexame de Conteúdo Fático-Probatório. Incidência da Súmula 7/STJ. Multa Estabelecida no Acordo. Revisão. Impossibilidade in Casu. Óbice nas Súmulas 5 e 7/STJ. Dissídio Jurisprudencial Não Demonstrado. Decisão Agravada Mantida.. Improvimento. Não procede a alegação de usurpação da competência do Superior Tribunal de Justiça, porquanto é assente nesta Corte o entendimento de que é possível, no juízo de admissibilidade realizado na origem, adentrar ao mérito do recurso especial, pois o exame de admissibilidade pela alínea ‘a’ do permissivo constitucional envolve o próprio mérito da controvérsia.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 3ª Turma, AgRg no Ag n. 1.100.596/SC, rel. Min. Sidnei Beneti, j. 16.06.2009, DJe 25.06.2009).

170 “A decisão que admite, ou não, o recurso especial deve ser fundamentada, com exame dos seus pressupostos

claramente para o posicionamento de que a efetiva violação à norma corresponde ao mérito dos recursos excepcionais171.

Situação semelhante ocorre com os embargos de declaração. Ora, se o embargante alega omissão nos embargos declaratórios, o juízo recorrido depois de constatar a admissibilidade dos declaratórios – no caso, ordinariamente, a tempestividade e a alegação de omissão, por exemplo –, verifica se há omissão ou não. Ou seja, para o cabimento dos embargos de declaratórios, além dos pressupostos ordinários de admissibilidade, deve-se examinar a alegação em tese da omissão, obscuridade, contradição, erro material ou erro de fato. A efetiva ocorrência de uma dessas hipóteses é realizada somente no juízo de mérito de tal recurso.

Com o recurso especial, bem como com outros recursos excepcionais, ocorre o mesmo. A admissibilidade dos recursos excepcionais está acorrentada à verificação dos respectivos pressupostos. No caso, são formados pelos requisitos tanto intrínsecos – cabimento, legitimidade para recorrer, interesse recursal e inexistência de fato impeditivo ou extintivo – quanto extrínsecos – tempestividade, preparo e regularidade formal – ordinários, retro; a diferenciação que sofrem em sede de recursos excepcionais conforme ver-se-á a seguir, no item 2.2.2.2; os requisitos específicos para o cabimento dos recursos excepcionais, como o prequestionamento e a inexistência de questão fática, como será delineada nos itens 2.2.2.3 e seguintes; e a alegação em tese de umas das hipóteses das alíneas “a” à “c” do art. 105, III, no caso de recurso especial e alíneas a à d, do art. 102 no caso de recurso extraordinário. Nos dizeres de José Carlos Barbosa Moreira, deve o recorrente alegar a “incompatibilidade entre a tese da decisão impugnada e alguma norma jurídica federal”172 e não “provar”a violação à legislação para o recurso ser admissível.

Somente as matérias apontadas no parágrafo anterior são passíveis de apreciação na fase de juízo de admissibilidade de recurso excepcional e, de consequência, de apreciação pela presidência do Tribunal a quo quando do exame de admissibilidade dos recursos excepcionais. Por isso, boa parte da doutrina entende que, quando a Presidência do Tribunal

171 “Recurso extraordinário: letra a: alteração da tradicional orientação jurisprudencial do STF, segundo a qual

só se conhece do RE, a, se for para dar-lhe provimento: distinção necessária entre o juízo de admissibilidade do RE, a - para o qual é suficiente que o recorrente alegue adequadamente a contrariedade pelo acórdão recorrido de dispositivos da Constituição nele prequestionados - e o juízo de mérito, que envolve a verificação da compatibilidade ou não entre a decisão recorrida e a Constituição, ainda que sob prisma diverso daquele em que se hajam baseado o Tribunal a quo e o recurso extraordinário.” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Pleno, RE n. 298694/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 06.08.2003, DJU 23.04.2004. p. 09).

172 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Questões de técnica de julgamento nos tribunais. In: MARINONI, Luiz

Guilherme (coord.). Estudos de direito processual civil. Homenagem ao Prof. Egas Dirceu Moniz de Aragão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 496.

a quo se pronuncia pela efetiva não ocorrência de violação à legislação, está usurpando a competência do Superior Tribunal de Justiça, no caso de recurso especial. Em outra passagem, o mesmo José Carlos Barbosa Moreira se manifesta assim:

[...] em princípio, reconhece-se ao órgão perante o qual se interpõe o recurso competência para verificar-lhe a admissibilidade; nega-lhe competência, ao contrário – salvo quando a lei expressis verbis preceitue –, para examinar-lhe o mérito. É claro que, atento à distinção entre os dois juízos, não deve o órgão de interposição indeferir o recurso por entendê-lo infundado: a procedência não é requisito de admissibilidade.173

Ainda, constata-se que o próprio Superior Tribunal de Justiça entendia que, no que respeita o exame de mérito pelo Tribunal a quo, se trata de usurpação de competência174, o que, pelo menos aparentemente, foi seguido em recente Reclamação Constitucional de matéria penal175. Porém, como já citado, a jurisprudência majoritária do Superior Tribunal de

173 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense,

2011. v. V. p. 263. No mesmo sentido: “ao presidente ou vice-presidente do tribunal a quo não compete examinar o mérito do recurso, inexistindo qualquer possibilidade de o mesmo vir a ter o seu seguimento negado na hipótese de se entender que a parte não tem razão” (RODRIGUES, Fernando Anselmo. Requisitos de Admissibilidade do Recurso Especial e do Recurso Extraordinário.In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coord.). Aspectos Polêmicos e Atuais do Recurso Especial e do Recurso Extraordinário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 197); “O exame de mérito não pode ser feito pelo Tribunal originário do acórdão impugnado, devendo este apenas examinar os pressupostos de admissibilidade.”(PINTO, Nelson. Manual dos

Recursos Cíveis. São Paulo: Malheiros, 1999. p.185); “Acaba desvirtuando a competência dada aos tribunais

inferiores para o exame da admissibilidade do recurso extraordinário e do recurso especial”. (NERY JUNIOR, Nelson. Atualidades sobre o Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996. p. 183). No mesmo sentido: FRANÇOLIN, Wanessa de Cássia. O juízo de admissibilidade dos recursos especial e extraordinário exercido pelo tribunal local. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY JUNIOR, Nelson. (coord.) Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. v. 9. p. 669.

174 Cf. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 1ª Turma, AgReg no AgIn n. 1992/0031194-6, rel. Min.

Demócrito Reinaldo, DJU 31.05.1993. p.10636. E ainda: “Processo Civil. Agravo Regimental. Juízo de Admissibilidade do Recurso Especial. Limites do Tribunal de Apelação. Alcance do Exame no Agravo de Instrumento. O juízo de admissibilidade do Tribunal recorrido, quanto ao recurso especial, deve limitar-se à verificação dos pressupostos genéricos, além daqueles contemplados no art. 105, III, caput da Constituição Federal (causas decididas em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou Tribunais Estaduais) [...]”. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma, AgReg no AgIn n. 2000/0084341-5, rel. Min.Eliana Calmon, DJU 19.02.2001. p.0160).

175 “Penal e Processo Penal. Reclamação. Usurpação de Competência Desta Corte. Juízo de Admissibilidade.

Declaração de Prescrição. Ausência de Jurisdição. Inocorrência. Requisito Legal. Objetivo. Inexistência de Fato Impeditivo. Prescrição Devidamente Reconhecida. Rrclamação julgada Improcedente. 1. A reclamação é instrumento processual de caráter específico e aplicação restrita. Nos termos do artigo 105, inciso I, alínea ‘f’, da Constituição Federal, presta-se para preservar a competência e garantir a autoridade das decisões dos Tribunais. 2. A análise da admissibilidade do recurso especial, realizada pelo Tribunal de origem, restringe-se ao exame dos requisitos formais, não se podendo adentrar na matéria de fundo. 3. A prescrição da pretensão punitiva estatal, a qual enseja a extinção da punibilidade, deve ser reconhecida, nos termos do artigo 61, caput, do Código de Processo Penal, em qualquer fase do processo, de ofício. 4. A declaração da prescrição pelo Tribunal de origem, em sede de juízo de admissibilidade, não significa indevido incursionamento no conteúdo do recurso, mas, antes, caracteriza-se como devida análise dos pressupostos do recurso especial, por se tratar de fato impeditivo ou extintivo do direito estatal de punir. 5. A prescrição restou devidamente delineada, na modalidade intercorrente, pois entre o último marco interruptivo, publicação da sentença

Justiça avalisa a possibilidade de o Tribunal de origem ingressar no exame da matéria de fundo, ou seja, emitir juízo sobre a efetiva ocorrência de violação à legislação pátria, o que se discorda.

Nossa Constituição é bem clara, estabelecendo no art. 105, III, que é competente o Superior Tribunal de Justiça para julgar o recurso especial quando houver violação à lei federal (alínea a). Poder-se-ia argumentar que, pelo fato de o artigo mencionado afirmar que o STJ pode apreciar a questão depois de constatado haver violação à legislação, assim poderia a instância ordinária decidir, ainda que sumariamente, que há uma violação à lei, para, somente após, enviar o apelo excepcional ao Superior Tribunal de Justiça. Ocorre que entender desta forma é o mesmo que afirmar que não há distinção entre admissibilidade e mérito nos recursos excpecionais quanto a este ponto. Por outras palavras, seria o mesmo que acentuar que: se pode a instância ordinária não admitir o recurso excepcional por ausência de violação à legislação, poderia a presidência de um Tribunal estadual dar provimento ao recurso para o Tribunal Superior, o que é inconcebível.

Por isso, o art. 105, III, a, da CF/88 não deve ser interpretado como “É competente o Superior Tribunal de Justiça para julgar o recurso especial quando houver violação à lei federal”, mas sim “É competente o Superior Tribunal de Justiça para julgar o recurso especial quando houver alegação de violação à lei federal”176, pois, como dito, é da própria sistemática dos recursos de fundamentação vinculada a alegação da hipótese de cabimento para seu regular processamento. José Carlos Barbosa Moreira já defendia tal tese desde 1998, quando afirmava que “onde se diz ‘quando a decisão recorrida contrariar...’, leia-se: ‘quando a decisão recorrida for acoimada de contrariar..’ – e tudo se resolverá”.177

Sendo assim, o exame de admissibilidade dos recursos excepcionais envolve os pressupostos intrínsecos e extrínsecos ordinários – legitimidade para recorrer, interesse recursal, inexistência de fato impeditivo ou extintivo, preparo, tempestividade e regularidade formal. Com relação ao cabimento, obedecem aos requisitos listados na CF/88, arts. 102, e 105, III – prequestionamento, inexistência de questão fática, exaurimento de instância e ser a decisão recorrida proferida por um Tribunal –, feitas as transformações impostas pelas

condenatória, e o trânsito em julgado, o qual não havia ocorrido, implementou-se o lapso do artigo 109 do Código Penal. 6. Reclamação julgada improcedente.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 3ª Seção, Rcl 4.515/SP, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 27.04.2011, DJe 30.05.2011).

176 Sendo a alegação de violação de lei como condição de admissibilidade dos recursos excepcionais. (Cf.

MOREIRA, José Carlos Barbosa. Juízo de admissibilidade e juízo de mérito no julgamento do recurso especial. Revista de Processo, n. 59. São Paulo: Revista dos Tribunais, jul./set. 1990.p. 9).

177 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Julgamento do recurso especial ex art. 105, III, a, da Constituição da

súmulas dos Tribunais de superposição (Súmulas 115178, 187179, 216180 e 418181 do STJ). Bem assim, a alegação em tese de uma das hipóteses previstas no art. 105, no caso de recurso especial, ou uma das matérias estatuídas no art. 102, no caso de recurso extraordinário. Lembrando-se que no caso do recurso extraordinário, deve-se também alegar a repercussão geral. Esses últimos deveres são para fins de regularidade formal dos referidos recursos.

Como dito, somente o transcrito no parágrafo anterior faz parte do juízo de admissibilidade dos recursos excepcionais. Uma afirmação sobre a efetiva violação à

No documento Rafael de Oliveira Guimarao (páginas 57-63)

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