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DA CONTRARIEDADE OU NEGATIVA DE VIGÊNCIA A LEI FEDERAL OU TRATADO

No documento Rafael de Oliveira Guimarao (páginas 97-104)

3 DO RECURSO ESPECIAL

3.1 DA CONTRARIEDADE OU NEGATIVA DE VIGÊNCIA A LEI FEDERAL OU TRATADO

A primeira hipótese de cabimento de recurso especial, que consta da alínea “a” do art. 105, III, da CF/88, é a alegação de que o acórdão de última instância, proferido pelo Tribunal local, contrariou tratado ou lei federal, ou negou-lhes vigência.

Como bem assevera José Miguel Garcia Medina, o fundamento dos recursos excepcionais são os listados nas alienas a dos arts. 102, III; e 105, III da CF/88, pontuando que “as demais situações referidas nas outras alíneas dos referidos incisos são hipóteses de cabimento, que são desdobramentos dos fundamentos previstos nas alíneas a dos mesmos incisos.”265 Desse modo, no caso do recurso especial, em regra, a hipótese de cabimento é sempre a negativa de vigência ou contrariedade à lei federal, seja ela, isoladamente, como único fundamento, ou quando a negativa de vigência ou contrariedade se deu em acórdão que, para tanto, tenha julgado válido um ato governamental. Ou ainda, quando a contrariedade ou negativa de vigência utilize como paradigma uma interpretação sobre o dispositivo legal dada por outro Tribunal local ou superior.

O que o referido processualista quis dizer é que, invariavelmente, o recurso especial será interposto com base na alínea a do inc. III do art. 103 da CF/88, e, eventualmente também utilizando como fundamento a alínea b ou a c.

Para fazer uma análise acerca do significado do constante no dispositivo constitucional (art. 105, III, “a” da CF), necessário primeiro interpretar os conceitos de “lei federal” e “tratado” para, posteriormente, entender quando o acórdão de um Tribunal local realiza uma contrariedade a disposições de tais estatutos, ou nega-lhes vigência.

Lei federal é uma expressão que deve ser compreendida através de um prisma amplo, abarcando as modalidades de normas jurídicas estampadas no art. 59 da Constituição Federal, incisos I a VII266. Ou seja, as leis complementares, leis federais, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos (decretos e decretos-lei) e resoluções, desde que emanadas pelos poderes legislativo ou executivo federal, e a norma seja de abrangência ou de natureza

265 MEDINA, José Miguel Garcia. Prequestionamento e repercussão geral. E outras questões relativas aos

recursos especial e extraordinário. 5. ed. rev. e atual. da obra Prequestionamento nos recursos extraordinário e especial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 80-81, grifo do autor.

266 “Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de: I - emendas à Constituição; II - leis

complementares; III - leis ordinárias; IV - leis delegadas; V - medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII - resoluções.”

federal. No mais, tais leis poderão ser as de competência privativa da União Federal (art. 22 da CF), ou ainda as de competência concorrente (art. 23 da CF), desde que não seja verificado o conflito desta última com lei local – hipótese de cabimento de Recurso Extraordinário com base no art. 102, III, d da CF/88267. Neste diapasão, por leis federais devem-se entender todas aquelas emanadas do Poder Legislativo da União, desde que tenham vigência em todo território nacional, incluídas neste conceito as que são manifestações da competência legislativa privativa, da competência concorrente, ou as de direito estrangeiro incorporado em nosso direito.268 Ressalte-se que, para fins de recurso especial, não se considera lei federal o Regimental Interno, o ato normativo, a portaria ministerial, resolução de autarquia e lei destinada ao Distrito Federal269. Tais espécies normativas não são consideradas “leis federais” para fins do art. 105, III, a, da CF/88 justamente por não terem abrangência nacional – caso dos regimentos internos e leis destinadas ao Distrito Federal – ou por não emanarem de órgão legislativo constitucionalmente competente – Cúpula do Poder Executivo ou Assembleia Legislativa, caso das portarias ministeriais, atos normativos e das resoluções de autarquias.

O Supremo Tribunal Federal já editou duas súmulas especificamente sobre o tema. Trata-se da súmula 280, que preceitua que “por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário”, e, igualmente, a de número 399, com o seguinte enunciado: “não cabe recurso extraordinário, por violação de lei federal, quando a ofensa alegada for a regimento de tribunal.” Tais súmulas têm aplicação em ambos os Tribunais Superiores, e a justificativa de ambas é no sentido de que as normas tidas como violadas não guardam abrangência nacional a ponto de se subsumirem na expressão “lei federal” do art. 105, III, “a”, da CF/88.

Cumpre trazer à baila importante observação feita por Rodrigo Barioni, no sentido de ser a “infração à lei federal” feita de forma direta, ou seja, a mencionada alegação deve restringir-se à norma federal, única e exclusivamente, devendo esta ter sido violada em sua melhor interpretação. Não se pode utilizar o argumento, para fins de demonstrar o cabimento do recurso, de que, ao violar uma norma local, reflexamente estar-se-ia violando uma norma federal. Nas palavras do processualista mencionado:

267 “Tributário. Processual Civil. Agravo Regimental no Recurso Especial. Ofensa a Dispositivo Local e

Constitucional. Exame. Não Cabimento. Súmula 280/STF. Agravo Não Provido. [...] O exame da eventual afronta a dispositivos do CTN, em virtude da aplicação das Leis Estaduais 12.278/96 e 13.441/00, também refoge à competência deste Superior Tribunal, haja vista que, conforme disposto no art. 102, III, ‘d’, da Constituição Federal, compete ao Supremo Tribunal Federal, em recurso extraordinário, ‘julgar válida lei local contestada em face de lei federal’.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 1ª Turma, AgRg no REsp n. 964.480/MG, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 02.08.2011, DJe 14.09.2011).

268 Cf. MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial. 11. ed. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 2010.p. 244-245.

[...] o Superior Tribunal de Justiça não aprecia normas de direito local (estaduais e municipais), cuja interpretação e aplicação competem exclusivamente aos Tribunais de Justiça. Constitui ofensa reflexa à norma federal do art. 2.º, § 1.º, da Lei de Introdução ao Código Civil, a decisão do Tribunal de Justiça que haja aplicado lei local que supostamente estaria revogada por lei posterior.270

O Superior Tribunal de Justiça idêntico entendimento, manifestando-se pela impossibilidade de cabimento de recurso especial quando, embora alegada violação à lei federal, para o entendimento da questão deva ser interpretada lei local no caso.271

Quando a Constituição fala do cabimento do recurso especial, no caso de violação a tratado, está se referindo àqueles que foram recepcionados pelo direito nacional com força de leis ordinárias, e não aos incorporados a nosso ordenamento como normas constitucionais, como ocorrem com os tratados de direitos humanos aprovados na forma das emendas constitucionais (art. 5.º, § 3.º, da CF).

Embora o dispositivo constitucional (art. 105, III, a) faça menção somente a “tratado”, o vocábulo há de receber interpretação extensiva, para encampar o acordo celebrado entre Estado brasileiro e o Estado estrangeiro, independentemente do rótulo que lhe tenha sido atribuído (tratado, convenção, acordo, declaração, protocolo, etc.).272

Com relação às decisões do Tribunal local que ensejam recurso especial por contrariar ou negar vigência a lei federal, cabe trazer à baila ecer mais alguns comentários.

Na Constituição de 1967, a hipótese de cabimento do recurso excepcional existia somente no caso de negativa de vigência a dispositivo legal, o que foi modificado pela Emenda I/69, que estabeleceu ter cabimento o mencionado recurso também quando houvesse a “contrariedade” à legislação.

A rigor:

270 BARIONI, Rodrigo. Ação rescisória e recursos para os tribunais superiores. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2010.p. 236.

271 “O tribunal de origem, ao concluir pelo não cabimento das horas extraordinárias requeridas, ante a quitação

pelo Estado mediante o pagamento da gratificação por condições especiais, analisou o disposto nas Leis estaduais 6.110/94 e 6.107/94. Assim, inviável a revisão do acórdão, por demandar análise de legislação local, o que é vedado nesta Corte, ante a aplicação, por analogia, do disposto na Súmula 280/STF. De igual forma, não procede a tese relativa à violação ao princípio da irretroatividade das leis, disposto no art. 1º da LICC, por demandar apreciação de legislação estadual, visto que o aresto impugnado expressamente consignou que a Lei estadual n. 6.107/94, que preveu a gratificação em comento, é anterior as parcelas requeridas na inicial.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma, REsp n. 1252735/MA, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 06.09.2011, DJe 14.09.2011).

[...] há negativa de vigência à lei federal se o Tribunal a quo deixar de aplicar norma à situação fática que reclamava a sua aplicabilidade. Tanto a omissão (involuntária) quanto a recusa expressa (voluntária) de aplicar o preceito federal, quando deveria fazê-lo, têm a mesma conseqüência jurídica de ofender a integridade do direito federal, que permite o manejo de recurso especial.273

Dessa forma, negar vigência/aplicabilidade pode significar: a) negação expressa de aplicação da norma ao caso concreto; b) omissão involuntária em sua aplicação, o que ocorre quando se ignora a existência do dispositivo legal; c) declarar revogada ou deixar de aplicar norma legal federal que é vigente. Já contrariedade significa “desatender seu preceito, sua vontade”. 274

Verifica-se que o termo “contrariar” implica realizar qualquer ato jurídico no sentido contrário à melhor interpretação sobre o dispositivo legal infraconstitucional federal, ao passo que “negar vigência” consiste em não aplicar uma norma federal ou declará-la inválida. Em adendo, negar vigência também é um ato de contrariar a norma legal. Nesse andar, a expressão “negar vigência” estaria inserida no termo “contrariar”, sendo este último mais amplo e abrangendo o primeiro em sua utilidade prática para fins de cabimento de recurso especial.

Entende a doutrina pátria que a intenção do legislador, quando da promulgação da Emenda I/69, que inseriu o termo “contrariar” à hipótese de cabimento do recurso excepcional, foi justamente ampliar o cabimento do recurso excepcional. José Miguel Garcia Medina275, sabiamente, confirma que os dois termos se equivalem. Para o autor, a intenção do legislador foi dar melhor utilidade pragmática para as hipóteses de cabimento de recurso especial, não sendo possível um recorrente ser penalizado com o não cabimento do recurso quando alegar a “negativa de vigência” e, na verdade, for hipótese de “contradição”. A intenção do legislador, ao inserir o termo “contrariar” foi simplificar, no sentido de que se deve alegar a contrariedade quando houver a interpretação errônea do dispositivo legal pelo Tribunal local, não deixando dúvidas sobre os termos.

A norma constitucional pretendeu deixar claro que o recorrente está apresentando recurso especial pelo fato de o Tribunal local ter “interpretado erroneamente” uma lei federal,

273 BARIONI, Rodrigo. Ação rescisória e recursos para os tribunais superiores. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2010.p. 238.

274 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. v. 2. p. 373.

275 “O constituinte tornou os dois termos equivalentes, propiciando o cabimento do recurso especial em ambos

os casos, deixando clara a intenção de alarga o âmbito de cabimento que possuía o antigo recurso extraordinário (que era cabível apenas na hipótese de negativa de vigência)”. (MEDINA, José Miguel Garcia.

O prequestionamento nos recursos especial e extraordinário. E outras questões relativas aos recursos

independentemente de ser alegada a “negativa de vigência” ou “contrariedade”. A má utilização dos elementos ora ventilados não pode ensejar, de forma alguma, a não admissibilidade do recurso em apreço.

Questão relevante é de como deve ser entendida a contrariedade à lei federal, ou seja, se essa violação ao dispositivo legal, para fins de recurso especial, deve ser no sentido de ofender o que o Superior Tribunal de Justiça entenda correto, ou se pode o Superior Tribunal de Justiça entender pelo não cabimento do recurso especial por afirmar ser aceitável a interpretação do dispositivo legal dada pelo Tribunal local. Melhor dizendo, se há aplicabilidade hodierna para a Súmula 400 do Supremo Tribunal Federal.

O enunciado da referida súmula afirma que “a decisão que deu razoável interpretação à lei, ainda que não seja a melhor, não autoriza recurso extraordinário pela letra a do art. 101, III, da Constituição Federal” é fruto da época em que o STF era competente para julgar o recurso extraordinário por contrariedade não só a Constituição, mas também a lei federal. Assim, entendia o Supremo que a infração a dispositivo legal deveria ser de tal forma que fosse evidente a infração à norma jurídica, sendo inadmissível um recurso excepcional quando a interpretação dada pelo Tribunal local fosse aceitável.

Pois bem, o fato é que o enunciado foi muito utilizado pela Corte Suprema mesmo após a Constituição de 1988. Um exemplo é o voto do Min. Celso de Mello, proferido no julgamento do AgReg no AI n. 145680/SP, no sentido de que a mencionada súmula não se aplica quando se está em voga violação a dispositivo constitucional, dando a entender que se aplicaria somente a infraconstitucionais276. Deste modo, indiretamente, o STF estendeu pela aplicação da mencionada para o recurso especial.

Admitir-se que não cabe recurso especial quando o acórdão do Tribunal local deu interpretação razoável ao dispositivo legal é assemelhar as hipóteses de cabimento do art. 485, V, (violação literal a dispositivo de lei) às do art. 105, III, “a” (contrariar lei federal).

276 “Temas de índole constitucional não se expõem, em função da própria natureza de que se revestem, a

incidência do enunciado 400 da Súmula do Supremo Tribunal Federal. Essa formulação sumular não tem qualquer pertinência e aplicabilidade as causas que veiculem, perante o Supremo Tribunal Federal, em sede recursal extraordinária, questões de direito constitucional positivo. Em uma palavra: em matéria constitucional não há que cogitar de interpretação razoável. A exegese de preceito inscrito na Constituição da Republica, muito mais do que simplesmente razoável, há de ser juridicamente correta. - A eventual inobservância, pelo órgão judiciário, do dever jurídico-processual de proferir sentença certa (CPC, art. 461) não se erige a condição de tema constitucional e nem se confunde, para efeito de acesso a via do recurso extraordinário, com a ausência de prestação jurisdicional.” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal, 1ª Turma, AgReg no AI n. 145680/SP, rel. Min. Celso de Mello, j. 13.04.1993, DJU 30.04.1993. p. 7567).

No primeiro caso, há violação literal quando o acórdão rescindendo der interpretação diferente da interpretação gramatical277 e em desconformidade com a jurisprudência pacífica ou, como se vê em alguns julgados do STJ, diferente da própria jurisprudência dominante278. Essa ação (ação rescisória) não pode ser admitida como recurso, por isso a impossibilidade de discutir questão infraconstitucional quando foi dada interpretação razoável. Já “contrariar lei federal” significa interpretar norma federal de forma diversa da tida como correta, mais precisamente daquela que o STJ entenda como a mais adequada.

Se a função constitucional do STJ é ser guardião da lei federal, não é faculdade, mas dever do Tribunal Superior admitir o recurso especial quando este alegue que a interpretação dada pelo STJ a uma norma jurídica não foi respeitada pelo Tribunal local.

O que salta aos olhos, é que o próprio STJ tem admitido, inconstitucionalmente, a incidência da Súmula 400 do STF, afirmando que não cabe recurso especial quando o acórdão do Tribunal local tiver dado interpretação razoável à lei federal279.

Além do quê, a aplicação da Súmula 400/STF ao recurso especial fere outro tema de suma importância: a competência legislativa.

Admitir que o Tribunal local, no caso de exame de admissibilidade por sua presidência, aprecie se ele mesmo deu interpretação razoável ao dispositivo legal

277 Francesco Carnelutti entende que “a interpretação que atende às palavras recebe o nome de interpretação

literal.” (CARNELUTTI, Francesco. Sistema de Direito Processual Civil. São Paulo: Classic Book, 2000, v. 1, p. 177)

278 “Quanto à ‘literal disposição de lei’, que está no art. 485, V, temos sempre mostrado que não se pode acolher

opinião apegada ao adjetivo. Letra, literal, está aí, como expresso revelado. O art. 4.º da Lei de Introdução ao Código Civil não pode ser postergado: ‘Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito, o juiz, que o ofende, apenas erra in procedendo, é erradíssimo’. Sentenças proferidas contra algum costume, que se aponta como existente, escritível ou já escrito (‘literal’), ou contra algum princípio geral de direito, ou contra o que, por analogia, se havia de considerar regra jurídica, são sentenças rescindíveis. Ao juiz da ação rescisória é que cabe dizer se existe ou não a regra de direito consuetudinário, ou o princípio geral de direito, ou a regra jurídica analógica. Se o juízo rescindente se encontra diante de opiniões divergentes quanto à regra jurídica de costume, ou à interpretação por analogia, ou a determinado princípio geral do direito, é ele quem tem que dizer qual opinião é verdadeira, salvo se a imposição legal da observância de alguma atividade assumida pelo Supremo Tribunal Federal, pelo Superior Tribunal de Justiça ou por outro tribunal. Em princípio, a jurisprudência dominante é a que se há de obedecer.” (STJ, 3.ª S., AR n. 631/SP, rel. Min. Felix Fischer, j. 12.04.2000, DJU 15.05.2000, apud WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recurso especial, recurso extraordinário e ação rescisória. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 504. g. n.).

279 “Além do mais, o acórdão recorrido, ao concluir, na espécie, que seria cabível a conversão em perdas e

danos, deu interpretação razoável à lei, o que atrai a incidência, por analogia, da súmula 400 do Supremo Tribunal Federal.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 4ª Turma, AgRg no Ag 1037944/RJ, rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 15.10.2009, DJe 09.11.2009). “Acórdão que deu razoável interpretação à lei. Aplicabilidade do verbete 400 do STF. Violação ao art. 535 do CPC. Inexistência. Acórdão fundamentado. Não caracterizada a violação ao art. 41 da Lei 8.213/91. Recurso de revista 9.859/74. Recurso conhecido, mas desprovido.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 5ª Turma, REsp n. 480.503/SP, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 17.06.2003, DJe 25.08.2003. p. 360). No mesmo sentido: BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, 1ª Turma, AgRg no Ag n. 2.038/SP, rel. Min. Garcia Vieira, j. 04.04.1990, DJU 30.04.1990. p. 3522.

infraconstitucional, é admitir que o Tribunal local se posicione em matéria de recurso especial, já que ele tem competência para apreciar a admissibilidade de recurso especial, com base no art. 541 do CPC. Assim, pelos mesmos argumentos trazidos no item 2.2.2.1, é inconstitucional a pronúncia do Tribunal local sobre a correta interpretação acerca de lei federal no caso de recurso especial.

Concordar que o Tribunal local possa verificar se ele aplicou “razoavelmente” a norma jurídica ao caso concreto é o mesmo que impedir o cabimento de recursos excepcionais, pois poderia o Tribunal local entender sempre pela inadmissibilidade do recurso especial por ter interpretado de forma razoável a norma federal. Tal atribuição invade a competência do STJ para se pronunciar acerca da adequada interpretação de lei federal, pois o juízo de valor sobre a correta interpretação de uma norma jurídica é tarefa exercida no juízo de mérito dos recursos excepcionais e não no caso de exame de admissibilidade. A súmula 400/STF pode ter uma utilidade prática para os Tribunais Superiores, na tentativa de diminuir os recursos que ingressam nos referidos Tribunais, mas não tem nenhum fundamento jurídico para sua existência.

A interpretação de uma lei federal deve ser única, e dada pelo STJ, para que seja aplicada a todos os casos. Dessa feita, a aplicação em desconformidade com o entendimento do Tribunal Superior “contraria” a lei federal e enseja recurso especial com espeque no art. 105, III, a da CF/88. Conforme assevera Rodolfo de Camargo Mancuso, “o STJ não poderá deixar de conhecer de recurso especial invocando a Súmula 400, na medida em que só ele é o exegeta do direito federal infraconstitucional, e não pode abdicar dessa competência ou ‘dividi-la’ com os tribunais locais ou regionais.”280

Ademais, somente a título de elucidação, se fosse admitido o não cabimento de recurso especial quando o Tribunal local entendesse que deu “interpretação razoável” ao dispositivo legal, dificilmente se poderia alegar desconformidade de entendimento com outros Tribunais, sendo letra morta o art. 105, III, c da CF/88. As desconformidades de interpretações sobre um dispositivo legal fazem parte do cotidiano da vida jurídica, por mínimas que sejam. Cabe ao STJ, por imposição constitucional, o dever de uniformizar a interpretação acerca de um artigo de lei federal, pronunciando-se acerca de qual interpretação, dentre as dadas ao artigo de lei, é a mais correta. No mais, é seu dever dar interpretação única sobre uma questão federal, não admitindo outras “interpretações razoáveis”.

280 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial. 11. ed. São Paulo: Revista

Diante de todo exposto, conforme sustentado no presente estudo, o posicionamento correto é aquele no sentido de não ter aplicação a Súmula n. 400 do STF no âmbito do recurso especial.

3.2 EXISTÊNCIA DE JULGAMENTO DE TRIBUNAL DECLARANDO VÁLIDO ATO

No documento Rafael de Oliveira Guimarao (páginas 97-104)

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