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MODELOS DE ESTRUTURA DE FAMÍLIA

No documento CONTROLESOCIAL,FAMÍLIAESOCIEDADE (páginas 61-65)

CONTEXTUALIZANDO FAMÍLIA  Conteúdo

MODELOS DE ESTRUTURA DE FAMÍLIA

Para melhor compreensão, discorreremos sucin- tamente sobre 4 modelos de estrutura familiar, con- siderados de abordagem mais relevante quais sejam: família burguesa de meados do século XIX, a família aristocrática dos séculos XVI e XVII, a família cam- ponesa dos séculos XVI e XVII e a família da classe trabalhadora do início da Revolução Industrial.

Em meados do século XIX, a família burguesa, nuclear por defi nição, habitava as áreas urbanas. Sa- be-se que, de 1750 até o presente momento históri- co, o padrão demográfi co da família burguesa evo- luiu gradualmente para um padrão de baixa fertili- dade e baixa mortalidade. O planejamento familiar inicia-se nesse grupo. No dia a dia, as relações entre os componentes da família burguesa assumiram um modelo característico de intensidade emocio- nal e de privacidade. O casamento trouxe para esse grupo o confl ito que oscila entre as necessidades da preservação da acumulação de capital e o valor de escolha individual.

A sexualidade entre os componentes dessa clas- se é uma das características mais surpreendente da história moderna. A burguesia se esforçou para adiar a satisfação sexual como em nenhuma outra classe. As mulheres burguesas eram consideradas seres assexuais, angelicais, acima da luxúria animal.

Para os homens dessa classe, o sexo estava dis- sociado dos sentimentos de ternura e era realizado como conquista de mulheres de classe inferior. A prostituição era requerida pelos homens burgueses porque a plena realização sexual tornou-se impos- sível para os cônjuges. A burguesia defi niu-se mo- ralmente, em contraste com o proletário promíscuo e a nobreza sensual, como uma classe dotada de virtuosa renúncia. O excesso desse comportamento “virtuoso” levou a burguesia à divisão entre o casa- mento e o amor, de um lado, e sexualidade de outro. O casamento burguês torna-se perene. Interesses sociais e fi nanceiros predominavam nessas alian- ças. Entretanto, o jovem burguês era impulsionado por um amor romântico. Ao fi ndar o século XIX, o amor romântico passava a ser a razão central do casamento. Porém, o mais estranho é que na classe média, o amor romântico raramente sobrevivia aos primeiros anos, e a expressão “felizes para sempre” traduzia o viver juntos não com paixão, mas com respeitabilidade.

Na família burguesa, as relações eram consolida- das mediante rigorosas divisões de papéis sexuais. O marido era chefe dominante e provedor de seu sustento e de sua família. A esposa era considera- da ser não pensante e menos capaz, zelava apenas pelo lar, em alguns casos, com a ajuda de criadas. O principal interesse da esposa centrava-se nos fi lhos.

Os fi lhos foram reavaliados pela burguesia tor- nando-se seres signifi cativos para os pais. Uma rela- ção mais íntima, profunda e emocional se estabele- ceu entre pais e fi lhos dessa classe. O sentimento de amor materno foi considerado natural nas mulhe- res, que não tinham somente o dever de zelar pela prole mas também a missão de orientá-la para um lugar respeitável na sociedade, além da atribuição de cuidar do lar e do marido.

As relações internas das famílias burguesas eram preservadas pela sociedade. A família torna-se um santuário em cujo ambiente sagrado nenhum es- tranho tinha direito de adentrar. Sendo assim, até mesmo o local de trabalho dos homens da época não poderia ser próximo à residência, pois o lar não era um lugar de trabalho e sim de lazer, enquanto o

ambiente de trabalho era destinado à ação, à razão. Torna-se assim, ambiente competitivo, hostil em contraposição ao ambiente de refúgio, aconchego, ternura e amor.

As crianças burguesas em idade pré-escolar, em maioria, não conviviam com outras crianças, mas com os adultos da casa. A partir de 1830, o Esta- do começou a elaborar orientação e normas que envolviam assuntos de família, mas, geralmente, só havia intervenção nos assuntos de famílias, ou seja, ninguém fi scalizava o tratamento das crianças bur- guesas. Com inovadoras formas de amor e autori- dade, a família burguesa criou uma nova estrutura emocional.

Família aristocrática (Séculos XVI e XVII)

O segundo modelo de estrutura familiar, oriun- do da aristocracia europeia, incluía uma mistura de parentes, dependentes, criados e clientes. Consistia em grupos com 40 até acima de 200 membros. Os aristocratas consideravam de suma importância a preservação da rede de relações de parentesco e li- nhagem.

A composição da casa nobre estava longe de ser estável. Criados e clientes entravam e saíam da casa nobre; crianças de ambos os sexos eram enviadas para serem criadas em outras residências nobres. Segundo demógrafos, os aristocratas eram propen- sos a ter mais fi lhos do que a classe inferior, e com índice de mortalidade infantil inferior.

Os enormes castelos eram locais públicos e po- líticos. Simbolizavam, pela magnitude material, o poder sobre o campesinato. No castelo não ha- via privacidade. As construções não propiciavam a privacidade. Todos os que chegavam e saíam esbarravam-se pelos caminhos e eram obrigados a passarem por salas em que havia outras pessoas em decorrência da estrutura física dos castelos. Os ocupantes dormiam em toda a parte. O mobiliário também era multifuncional. As relações entre os componentes da casa eram regidas por uma austera hierarquia, estabelecidas pelas tradições.

Ali, a união matrimonial era um ato político da mais alta ordem. O destino da linhagem estava

sujeito a casamentos que mantivessem intactas as propriedades da família. Aos pais, cabia a decisão de quem se uniria a quem. Os dotes eram pequenas fortunas e casar uma fi lha muitas vezes era oneroso. Sendo assim, o casamento pouco combinava com amor ou sexo.

Os aristocratas relacionavam-se sexualmente com a criadagem e com outros da mesma classe. As con- cubinas eram aceitas publicamente. Quase sempre as mulheres eram consideradas criaturas tão sexuais como os homens e assuntos como sexo e amor não eram assuntos privativos e secretos.

A riqueza dessa pequena elite (cerca de 1,5% da população na França do século XVIII), consistia no controle da terra e, em certo grau, nos favores do monarca. A terra, principal forma de enrique- cimento da aristocracia, de um modo geral não era considerada um capital a ser melhorado ou explo- rado. Era, antes de tudo, um patrimônio sob a prer- rogativa da linha de família. A riqueza era para ser herdada e retransmitida, e não para se ganhar ou acumular.

O trabalho dos nobres era na guerra, servindo o rei e mantendo a ordem. As esposas eram fi gu- ras altivas, mas suas funções principais era conce- ber fi lhos e organizar a vida social. Em geral, não se ocupavam da administração da casa e nem com a criação dos fi lhos. A ordem na casa era organi- zada hierarquicamente, independente de infl uência externa. O Rei procurava controlar os nobres, com exceção no ambiente familiar, interferia somente em ocasiões raras.

Em virtude dos meios de transporte da época, os aristocratas em geral viviam longe de suas compa- nheiras. Segundo estudos, as crianças aristocratas fi cavam nas mãos da criadagem desde o momento de seu nascimento. Pai e mãe raramente se preocu- pavam com os fi lhos, principalmente nos primeiros anos de formação. Os cuidados com os fi lhos não eram considerados como procedimento relevantes e as mães ocupavam-se como damas da sociedade. As crianças eram consideradas pequenos animais e não seres que necessitassem de amor e atenção. Os recém-nascidos nobres eram amamentados por

amas de leite. A morte dos pequenos nas mãos das amas não era incomum, tanto que algumas amas eram conhecidas como “amas assassinas”. Os fi lhos não desejados eram certamente encaminhados a es- sas mulheres.

Torna-se perceptível que as famílias aristocratas dispensavam pouco valor à privacidade, cuidados maternos, amor romântico e relações íntimas com as crianças. A vida emocional dos fi lhos não girava em torno dos pais.

Família camponesa (séculos XVI e XVII)

A estrutura familiar camponesa dos povoados que viviam em aldeias era diferente da classe do- minante. O campesinato europeu incluía grandes desigualdades econômicas e de posse de riqueza. Abrangia diferentes modos de produção. Segundo os demógrafos, os camponeses casavam-se perto dos 30 anos de idade e tinham poucos fi lhos vivos (quatro ou cinco). Embora houvesse muitos nasci- mentos, poucos ou somente a metade sobreviria até a idade adulta.

Embora fosse numericamente reduzida, a família camponesa estava interligada num vasto círculo de sociabilidade, onde a unidade básica da vida cam- ponesa no início do período moderno não era a fa- mília conjugal, mas a aldeia. A aldeia era a família do camponês.

A autoridade social não estava embutida na fi - gura do pai, mas na própria aldeia. Em alguns lo- cais, o senhor da terra e o pároco eram autoridades efetivas, mas no controle e nas regras do dia a dia prevaleciam os costumes e as tradições da aldeia. Nenhum fato importante acontecia no seio familiar sem que fosse conhecido ou fi scalizado pela aldeia. Casamento, relações entre marido e mulher, e en- tre pais e fi lhos tudo passava pelo crivo dos aldeões, que impunham regras e sanções.

Camponeses e camponesas tinham funções se- paradas a desempenhar e, geralmente, as mulheres eram submissas, embora o trabalho dessas mulheres fosse imprescindível para a sobrevivência da família e da comunidade. Nessa classe, as mulheres traba- lhavam duramente por longas horas, cozinhavam,

cuidavam dos fi lhos, dos animais domésticos e da horta e juntavam-se ao resto da aldeia nos períodos da colheita. As mulheres regulavam os casamentos e fi scalizavam os namoros. Agindo desta forma, o patriarcado camponês tornava-se diferente do aris- trocrata e do burguês.

Os episódios emocionalmente importantes nas aldeias não tinham signifi cado na família e sim no seio da comunidade. Eventos como festividades, cultos, casamentos e até mesmo a morte eram aber- tos a toda comunidade.

Em alguns lugares da aldeia, os pais tomavam as decisões sobre a união conjugal dos fi lhos, mas, em maioria, a comunidade tinha formas coletivas de namoro em que se providenciava a formação de casais adequados. A partir do século XVI, o Estado interveio nos casamentos, numa tentativa de refor- çar a autoridade patriarcal.

A supremacia da aldeia sobre o parentesco e a fa- mília, mesmo no casamento monogâmico, infl uen- ciava as relações de pais e fi lhos. As genitoras cam- ponesas eram auxiliadas nos deveres de cuidar dos fi lhos por parentes, pessoas idosas e moças soltei- ras. As mulheres da aldeia transmitiam às mulheres mais jovens os conhecimentos sobre o aleitamento, enfaixamento, curas de enfermidades etc. Esse re- passe de informações era fi scalizado pelos aldeões que queriam se certifi car de que os costumes e as tradições estavam sendo realmente repassados para os mais jovens.

No âmbito da família conjugal, as crianças não eram tidas como propriedades dos pais, nem tam- pouco consideradas o centro da vida. Os laços afeti- vos, em vez de limitados a pais e fi lhos, estendiam- se para fora, envolvendo a aldeia e antepassados. Os mortos eram considerados parte da comunidade. Segundo alguns historiadores, as crianças campo- nesas, ainda muito pequenas, eram abandonadas durante o dia todo tendo que se arranjarem sozi- nhas quando o campo exigia a presença de suas pro- genitoras.

Assim, a autoridade da família camponesa difun- dia-se por toda a aldeia com vários adultos partici- pando da vida da criança. A afetividade com que a

criança se defrontava estava também dividida entre uma grande variedade de parentes e aldeões.

As relações entre pai e fi lho não continham inti- midade ou intensidade emocional, as sanções eram impostas com castigos físicos. Provavelmente não internalizava fi guras parentais de forma profunda, uma vez que a vida emocional da criança era condi- cionada pelos ritmos da aldeia, e extensas tradições e costumes.

Família da classe trabalhadora (meados séculos XIX)

A classe trabalhadora surge entre o campesina- to deslocado e os níveis mais baixos da sociedade urbana. e desenvolve uma estrutura de família sob condições de agonia social e econômica, Entretanto, no decorrer do tempo, a família da classe trabalha- dora passou a se parecer muito com a família bur- guesa.

A alta fertilidade, a alta mortalidade e a baixa ex- pectativa de vida marcaram essa classe no período inicial da industrialização. Os salários eram baixos, crianças também precisavam trabalhar para ajudar no sustento da família. As condições de vida eram ruins, as horas trabalhadas giravam em torno de 14 a 17 horas diárias. Os fi lhos a partir dos 13 e 14 anos saiam de casa em busca de trabalho.

Os jovens proletários declaravam muito cedo in- dependência dos pais. Esses grupos de jovens, alvos de preocupação constante, eram denominados “de- linquentes juvenis”. Nessa classe os jovens estavam propensos a casarem-se mais cedo do que na bur- guesia. As relações entre homens e mulheres ten- diam a subverter os padrões patriarcais, dado que as mulheres trabalhavam fora de casa e ainda cuida- vam dos afazeres domésticos.

Na família da classe trabalhadora, os fi lhos eram criados de maneira informal, mais antiga, sem a constante atenção e fi scalização da mãe. As crianças eram forçosamente amamentadas ao peito por mãe subalimentadas, cansadas e preocupadas. Nesse pe- ríodo, os cuidados com a higiene e controle genital eram negligenciados. Assim, os fi lhos do proletaria- do eram muito mais criados pela rua do que pela

família. O padrão de autoridade imposto à criança da classe trabalhadora era semelhante à da classe dos camponeses, sem, contudo, ser fechada dentro de uma aldeia, mas jogada no mundo capitalista in- dustrial.

Infere-se que a maior infl uência sobre as condi- ções de vida da classe trabalhadora, tenha sido os movimentos sindicalistas que, coletivamente, luta- ram pela melhoria de vida dos operários da época. Nesse período também os operários do sexo mascu- lino estavam predispostos a formar pequenos gru- pos que oscilavam entre trabalho e bar. As mulhe- res, por sua vez, passaram a formar comunidades nas residências. Dessa forma, a família passava por novas transformações de organização e atribuição. CONCEITOS DE FAMÍLIA

Para Da Mata (1993, p. 145)

Família não é apenas uma instituição social capaz de ser individualmente, mas constitui também, e particularmente, um valor. Há uma escolha, por parte da sociedade brasileira, que valoriza a famí- lia, como uma Instituição fundamental à própria vida social; é um grupo social e uma rede de rela- ções; funda-se na genealogia e nos elos jurídicos, mas também se faz na consciência social, intensa e longa.

Segundo Ferrari (1994, p. 18)

Família é aquela que propicia aportes afetivos e o bem-estar de seus componentes; ela desempenha papel decisivo na educação formal e informal; é em seu espaço que são absorvidos os valores éticos e humanitários onde se aprofundam laços de solida- riedade; é também em seu interior que se constro- em as marcas entre as gerações e são observadas os valores culturais.

Assim, a família pode ser entendida como um conjunto de relações sociais baseadas em elos con- sanguíneos, adoção e uniões socialmente reconhe- cidas legalmente ou não.

A família abordada enquanto unidade doméstica centra-se nas condições materiais, isto é, na manu-

tenção da vida: alimentação, vestuário, habitação, repouso. No passado, o grupo familiar, era uma uni- dade de produção, encarregando-se, ela própria, da produção dos meios de sobrevivência.

Enquanto instituição, a família pode ser entendi- da como um conjunto de normas e regras, histori- camente constituídas, que governam as relações de sangue, adoção, aliança, e determinam a fi liação, os limites do parentesco, da herança e do casamento. O conjunto de regras e normas está contido nos costu- mes e na legislação, apresentadas no Código Civil.

A família também pode ser entendida como um conjunto de valores determinados como ideologia, estereótipos, preceitos, representações sobre o que ela deve ser. Ao longo da história no mundo ociden- tal, as teorias de como a família deve ser couberam inicialmente à igreja, em seguida ao Estado, e, fi nal- mente, à própria ciência. Estas entidades organiza- ram várias regras e recomendações de como deveria ser o comportamento das pessoas. Atualmente são os meios de comunicação que divulgam e “ditam” novas ideias, orientações e estudos comportamen- tais relativos à família e seus membros.

A família proporciona o marco adequado para a de- fi nição e conservação das diferenças humanas, dan- do forma objetiva aos papéis distintos, mas mutua- mente vinculados, do pai, da mãe e dos fi lhos, que constituem os papéis básicos em todas as culturas. (PICHON-RIVIÉRE, apud OSÓRIO, 1996, p. 15)

Muitas são as conjecturas formuladas sobre famí- lia, algumas se caracterizam pelas funções biológi- cas, outras, pelas funções psicossociais, apontando o inicio às questões concernentes aos laços consan- guíneos, ou seja, aos papéis maternos e paternos como estruturadores do grupo familiar. Dizer que família é a unidade básica da interação social talvez seja a forma mais genérica e sintética de defi ni-la.

Em todos os conceitos apresentados é comum observarmos que a família apresenta-se como uma estrutura social, uma construção humana que se consolida, transformando-se conforme a infl uên- cia do meio social, sendo, portanto, historicamente construída.

Assim sendo, é importante ressaltar que a estru- tura familiar varia conforme os momentos históri- cos, fatores sociopolíticos, econômicos, religiosos e culturais, estando o conceito de família associado ao contexto social no qual está inserido, ou seja, precisamos, antes de qualquer ação, defi nir de que família estamos falando, a época em que ela vive e a qual segmento pertence.

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