• Nenhum resultado encontrado

mento fundamental dos ensinamentos ori- ginais de Buda.

Uma vez que as práticas de meditação com atenção plena entraram na corrente principal da TCC, uma definição opera- cional padrão da atenção plena surgiu. De acordo com Jon Kabat-Zinn, que desenvol- veu o método de redução do estresse com base na atenção plena (MBSR, em inglês) (Kabat-Zinn, 1994), esta é definida como “a consciência que emerge ao se prestar atenção propositadamente no presente e, de forma não julgadora, à experiência que se desdobra momento a momento” (p. 4). Esse processo envolve o desenvolvimento de uma forma especial de prestar atenção nas experiências, que é consideravelmente diferente da maneira cotidiana típica de prestar atenção. A atenção plena representa uma observação focada e flexível, momen- to a momento, do fluxo de pensamentos, sentimentos e sensações corporais que se apresentam em nossa consciência. Da pers- pectiva de um paciente, observador cons- ciente, passamos a experimentar os pen- samentos como pensamentos, as emoções

como emoções e as sensações físicas como

sensações físicas. Somos convidados a sus- pender o julgamento dessas experiências e, diligentemente, mas de modo suave, voltar a atenção, uma vez após a outra, ao fluxo de eventos em nossa consciência.

Uma forma de esclarecer a distinção entre a prática da atenção plena e nossa ma- neira típica de funcionar é contrastar “modo de fazer” com “modo de ser”. Quando faze- mos nossas atividades típicas, perseguindo metas, tentando efetuar mudanças no meio e correndo atrás de objetivos em nosso mun- do, pode-se dizer que agimos no “modo de fazer”. Segal e colaboradores (2002) ressal- tam que o “modo de fazer” entra em ação quando a mente não está satisfeita com o estado da realidade que encontra. Quando desejamos obter o que não temos ou afastar

o que não queremos, nossas mentes entram no “modo de fazer”. Um sentimento ou im- pulso negativo é ativado, e a mente entra em ação, com base nos padrões habituais de pensamento, sentimento e comportamento para atingir o objetivo ou uma mudança de estado. Frequentemente, isso não é um pro- blema. Sentimos sede e, então, buscamos algo para beber. Vemos um obstáculo no ca- minho e damos a volta.

Às vezes, contudo, a discrepância en- tre a forma como as coisas são e a forma como gostaríamos que fossem é um pouco mais difícil de apontar. Talvez a ação neces- sária seja vaga ou impossível. Pode haver uma atitude que possamos tomar, porém, não seja algo que se possa fazer agora. Em tais casos, o “modo de fazer” não serve.

Similarmente, com frequência somos perturbados por sentimentos ou pensa- mentos. É natural que o “modo de fazer” sugira que devemos agir. Muitas vezes, tal ação equivale a afastar os pensamentos e tentar evitar certas experiências. Conforme veremos, muitos pesquisadores sugeriram que as tentativas de tratar as experiências pessoais internas dessa forma podem le- var a mais sofrimento (Hayes et al., 2001). Quando tentamos suprimir sentimentos, pensamentos e eventos mentais, eles com frequência se intensificam e se apresentam mais repetidamente na consciência (Weg- ner, Schneider, Carter e White, 1987). De fato, as características do “modo de fazer” costumam ser falta de satisfação, monito- ramento compulsivo da própria situação, pressa, autocrítica e esforços fúteis para mudar o que não pode ser mudado. Quan- do aplicamos o “modo de fazer” às emo- ções, podemos lutar para nos livrar dos sen- timentos desagradáveis, mas simplesmente criamos uma onda crescente de sofrimento que aumenta de tamanho e intensidade em proporção semelhante à força e à persistên- cia da luta.

O modo de prestar atenção envolvido na atenção plena é chamado de “modo de ser”. Nesse estado, não focamos a busca de metas ou objetos no mundo dos fenômenos. Ao praticar a atenção plena, simplesmente observamos o fluxo da consciência, sem jul- gar, descrever ou avaliar. Assim, podemos ter um contato profundo com nossa existência presente. Diz-se que experimentar a atenção plena consiste no aumento da atenção, da clareza de percepção e do espírito de disposi- ção para aceitar a realidade presente da forma como ela é. Cultivando essa perspectiva, po- demos vivenciar mais plenamente a riqueza do que significa estar vivo.

O mestre contemporâneo de medita- ção tibetana Yongyey Mingyur Rinpoche (2007) descreveu a atenção plena como “a chave e o como da prática budista que consiste em apenas aprender a repousar na simples consciência dos pensamentos, sentimentos e percepções à medida que ocorrem” (p. 24). O desenvolvimento da atenção plena cultiva o modo intencional de atenção que envolve a paradoxal desi- dentificação dos conteúdos da mente cons- ciente enquanto se permite delicadamente uma experiência plena e não julgadora do momento atual (Segal et al., 2002).

Vários estudiosos já compararam o estado mental típico a um modo sonâmbu- lo de existência. As formações mentais, as projeções de experiências passadas, as ex- pectativas generalizadas de relacionamentos e as lembranças emocionais que cultivamos moldam e afetam nossa experiência indi- vidual da realidade, de forma a traçar uma experiência quimérica e distorcida do ato de ser. Conforme indicamos, a raiz linguística da palavra “buda” (um ser plenamente ilu- minado) significa “aquele que despertou”. Portanto, o ideal psicoespiritual que domi- nou o pensamento oriental por milênios simplesmente representa um despertar do sonho doloroso de experimentar a vida sob

o véu de cognições e padrões de memória emocional literais e disfuncionais (Gilbert e Tirch, 2007). Vários estudos demonstraram os benefícios do treinamento da atenção plena, inclusive no tratamento de recaídas da depressão, dos transtornos de ansiedade, da dor crônica, da forma de lidar com doen- ças e de muitos outros problemas psicoló- gicos (Baer, 2003). Pesquisas recentes sobre a neurobiologia da atenção plena sugerem que o treinamento pode melhorar o fun- cionamento do processamento emocional, intensificando a tradução direta das sensa- ções corporais em emoções, sem relacionar excessivamente as emoções com memórias narrativas. Esse processo parece envolver um potencial aumento de função da ínsula e do córtex cingulado anterior (Farb et al., 2007).

As técnicas descritas neste capítulo foram selecionadas por suas relativa simpli- cidade e relevância para lidar com as emo- ções. Primeiro, elas são empregadas como práticas básicas em vários modos de treina- mento de atenção plena. Segundo, são re- lativamente simples de ensinar e aprender no contexto atual da TCC, desde que haja compromisso e consistência por parte do terapeuta e do paciente. Por fim, todas elas estão relacionadas diretamente com o cul- tivo de melhores capacidades de regulação emocional.

TÉCNICA: ESCANEAMENTO CORPORAL

Outline

Documentos relacionados