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Pessoas ansiosas frequentemente têm di- ficuldade em tolerar a incerteza. De fato, Dugas, Ladouceur e colaboradores elabo- raram um tratamento da ansiedade genera- lizada com base no aumento da tolerância à incerteza entre pacientes preocupados (Dugas e Robichaud, 2007; veja também Wells, 2009). Na verdade, a intolerância à incerteza também sustenta a avaliação mal- -adaptativa das intrusões obsessivas e acio-

na processos de pensamento ruminativos. Os indivíduos ativam uma estratégia de preocupação ou ruminação para reduzir a incerteza, equiparando-a a resultados ne- gativos e a um senso de irresponsabilidade. Ter sentimentos mistos – ou ambivalência – é uma manifestação emocional de in- certeza, pois os indivíduos experimentam sentimentos potencialmente conflitantes acerca das pessoas, das experiências ou de si próprios. Essa ambivalência pode gerar an- siedade e sensação de “confusão” à medida que os indivíduos procuram “o que de fato sentem”. Porém, sentimentos “univalentes” – ou seja, sentimentos “de mão única” (“eu realmente gosto dele” ou “eu realmente não gosto dele”) – podem não ser realistas, pois as pessoas (e as experiências) costumam oferecer considerável complexidade, as si- tuações mudam, as pessoas mudam dentro dessas situações e a consistência de traços pode ser menos provável que o impacto das situações. De fato, a rejeição de Mischel a respeito da “psicologia dos traços” em favor das conceituações “pessoa-situação” pode ter maior validade empírica (Dugas, Buhr e Ladouceur, 2004; Mischel, 2001; Mischel e Shoda, 2010).

Há vantagens em tolerar ambivalên- cia, ambiguidade e incerteza. Primeiro, as inferências dispositivas podem ser menos precisas na previsão do comportamento do que as descrições contextuais ou situa- cionais. Assim, se as disposições ou traços forem na verdade “mitos”, a ambivalência e a ambiguidade podem ser mais realistas. O comportamento de um indivíduo pode de- pender mais da situação ou do contexto do que de traços fixos. Segundo, focalizando a variabilidade e o contexto, há mais “graus de liberdade” no que diz respeito à flexi- bilidade comportamental. Por exemplo, se eu sei que você pode reagir mais favoravel- mente mediante uma percepção diferente das contingências situacionais, posso consi-

derar reorganizar a estrutura de recompen- sa para beneficiá-lo (e obter o que quero de você). Nossas pesquisas mostram que um dos principais preditores de insatisfação conjugal é a incapacidade de tolerar senti- mentos mistos (Leahy e Kaplan, 2004).

A técnica de aceitação dos sentimen- tos mistos auxilia o paciente a diferenciá- -los, vendo-os de forma dialética (equi- librada e conflitante) e aumentando o reconhecimento de que os “sentimentos mistos” podem simplesmente refletir maior consciência da complexidade, da veracida- de e das realidades da natureza humana. De fato, pode-se argumentar que vermelho e azul se complementam ou que certas no- tas em uma partitura podem completar a melodia. Eles não se contradizem; os sen- timentos não são como afirmações lógicas. Ver as emoções como experiências linea- res e lógicas na fenomenologia da mente pode obscurecer o fato de que elas toquem percepções, necessidades e nuances dife- rentes.

Questão a ser

proposta/intervenção

“Há vantagens em aceitar os sentimentos mistos? Há desvantagens? Quais são? É pos- sível pensar nos sentimentos mistos como se refletissem simplesmente o ato de saber

mais? As pessoas não seriam mais compli-

cadas e, portanto, os sentimentos mistos poderiam ser simplesmente o reflexo da complexidade da natureza humana? Outras pessoas possuem sentimentos mistos? Você tem sentimentos mistos em relação a seus amigos ou membros da família? Eles po- deriam ter sentimentos mistos em relação a você? A dificuldade com os sentimentos mistos é reflexo de seu perfeccionismo? Se aceitasse ou tolerasse sentimentos mistos, você se preocuparia ou ruminaria menos?”

Exemplo

Uma jovem vinha experimentando senti- mentos mistos em relação ao noivo, reco- nhecendo que ele tinha qualidades que ela considerava incômodas e outras que valori- zava bastante. Ela reclamava que não sabia como “realmente se sentia”.

Terapeuta: Você parece achar difícil reco-

nhecer que está tendo sentimentos mistos em relação a Dave, e eu me pergunto por que eles são difíceis de tolerar.

Paciente: Talvez haja algo que eu esteja dei-

xando escapar. Se estou tendo senti- mentos mistos, então talvez esteja co- metendo um erro.

Terapeuta: Bem, é importante sentir que

você está tomando a decisão certa para si mesma. Mas parece que você está equiparando ter sentimentos mistos a “cometer um erro”. [O tera- peuta e a paciente examinam então os pontos positivos e negativos de Dave como parceiro, e ela acaba avaliando estes como 80% positivos e 20% ne- gativos.] Parece que está 80 a 20 em favor de Dave. Como você se sente em relação a isso?

Paciente: Eu sei que ele tem muitas quali-

dades. Ele é um homem maravilhoso, o melhor com quem já estive. Mas eu devo tomar uma decisão com senti- mentos mistos?

Terapeuta: Você está equiparando senti-

mentos mistos com má alternativa. Consegue imaginar alguma decisão importante na vida que não tenha prós e contras? Você tem algum ami- go de longa data por quem você não tenha sentimentos mistos?

Paciente: Acho que tem razão quanto a

isso. Mas eles são amigos, não alguém com quem eu vá me casar.

Terapeuta: Você acha que pessoas casadas

não possuem sentimentos mistos?

Paciente: Sei que meus pais têm, e eles estão

casados há 35 anos.

Terapeuta: Você também poderia pensar

que os sentimentos mistos refletem o fato de que conhece bem a pessoa. Ser capaz de aceitar, tolerar e não julgar pode ser uma forma diferente de ver as coisas.

Paciente: Mas se eu aceitar isso, não signifi-

ca que estaria me acomodando?

Terapeuta: Quando tomamos decisões

importantes não estamos também nos conformando com o equilíbrio entre prós e contras? Não estamos dizendo: “Em geral, parece razoavel- mente bom, apesar de não ser perfei- to”?

Paciente: Acho que Dave também tem sen-

timentos mistos a meu respeito.

Terapeuta: Talvez seja porque vocês se co-

nhecem e simplesmente enxergam que as pessoas são complicadas e que isso também não é um problema.

Tarefa

O paciente pode preencher o Formulário 2.10 (Exemplos de Sentimentos Mistos) e o Formulário 2.11 (Vantagens e Desvanta- gens de Aceitar Sentimentos Mistos).

Possíveis problemas

Alguns pacientes acreditam que tolerar sen- timentos mistos os tornam confusos e, no fim das contas, desamparados. Supõe-se que haja apenas uma forma de se sentir em relação às coisas e que esta maneira deve ser descoberta. Uma analogia útil para desafiar essa suposição é a pintura. Há alguma cor que deva sozinha compreender toda a pin-

tura, ou ela seria mais rica, significativa e comovente com muitas cores?

Referência cruzada

com outras técnicas

O Formulário 2.3 (Diário de Emoções) ajuda a identificar uma variedade de senti- mentos na mesma situação ou em situações distintas. Além disso, monitorar a variação dos pensamentos e sentimentos de acordo com os pensamentos automáticos pode ser uma forma útil de ilustrar que pensamentos e sentimentos mudam e podem se misturar.

Formulários

Formulário 2.10: Exemplos de Sentimentos Mistos.

Formulário 2.11: Vantagens e Desvanta- gens de Aceitar Sentimentos Mistos.

TÉCNICA: EXPLORAÇÃO

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