• Nenhum resultado encontrado

fizessem frente ao paradigma capitalista ora vigente Ademais, a simples existˆencia de normas constitucionais que consagrem direitos sociais de cidadania n˜ao garante a

sua consequente implementac¸˜ao concreta no mundo dos fatos, pois direitos n˜ao s˜ao

auto-realiz´aveis e demandam mobilizac¸˜ao pol´ıtica e social para serem concretizados

em n´ıveis democraticamente satisfat´orios. Prova disso ´e o fato de que nunca existiu no

Brasil algo parecido com um Welfare State, portanto n˜ao basta, per si, a mera proclamac¸˜ao

normativa de um modelo de estado e de direitos para que estes sejam materializados.

Eis a importˆancia de se conjugar a pol´ıtica com o direito constitucional. EMBORA

IN ´UMERAS TENTATIVAS DE SUPRESS ˜AO FORMAL DOS DIREITOS SOCIAIS

DOS SISTEMAS CONSTITUCIONAIS OCIDENTAIS TENHAM FRACASSADO, A

MELHOR FORMA QUE SE ENCONTROU PARA ASSEVERAR A IDEOLOGIA NE-

OLIBERAL FOI A UTILIZAC¸ ˜AO DE PR ´ATICAS POL´ITICAS, ECON ˆOMICAS E

CULTURAIS (OS VELHOS “FATORES REAIS DE PODER”) QUE INVIABILIZAM

A SUA EFETIVIDADE. ISTO ´E, COMO N ˜AO SE CONSEGUIU ELIMINAR A PRE-

VIS ˜AO CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS SOCIAIS, TRATA-SE DE IGNOR ´A-LOS E

FAZ ˆE-LOS “LETRA MORTA”(BELLO, 2010, p. 199-201) (grifado no original somente

em negrito e it´alico).

Assim, neste contexto, surgiu no Brasil o fenˆomeno da judicializac¸˜ao da pol´ıtica122

que con-

siste no fato de que, a cada dia, cada vez mais, os cidad˜aos recorrem ao Poder Judici´ario com o

intuito de obter a concretizac¸˜ao das diretrizes constitucionais para a consecuc¸˜ao dos objetivos fun-

damentais apontados para a atuac¸˜ao estatal (CF/88, art. 3o), em especial, a execuc¸˜ao das normas

de direitos humanos sociais, assim,

nos ´ultimos anos vem se afirmando no Brasil, a exemplo do que j´a ocorria nos pa´ıses

democr´aticos, o fenˆomeno da judicializac¸˜ao da pol´ıtica. Consiste na interferˆencia do

Judici´ario sobre as quest˜oes pol´ıticas ´ınsitas `a elaborac¸˜ao legislativa, principalmente na

via do controle da constitucionalidade. [...] O juiz deixa de ser o aplicador formalista

da lei para se tornar tamb´em agente das transformac¸˜oes sociais, utilizando no exerc´ıcio

de suas func¸˜oes os instrumentos da razoabilidade, da proporcionalidade e da morali-

dade para enfrentar as novas quest˜oes colocadas pelo pluralismo de interesses da soci-

edade moderna (TORRES, 2010, p. 327) (grifado no original). [...] A desneutralizac¸˜ao

pol´ıticado Judici´ario ´e uma consequˆencia das alterac¸˜oes resultantes do advento do Es-

tado Social e da complexa sociedade tecnol´ogica, surgida a partir de meados do s´eculo

XX. A consagrac¸˜ao de direitos fundamentais sociais, econˆomicos e culturais, nas

122“No Brasil em particular assistimos a duas ondas simultˆaneas de judicializac¸˜ao: conflitos envolvendo os novos direitos (lutas por moradia e reforma agr´aria, por exemplo) e conflitos englobando a efetiva aplicac¸˜ao dos antigos direitos em novos contextos (a luta contra a discriminac¸˜ao ´etnica, de cor, sexual - de gˆenero - mulheres, e de orientac¸˜ao - homossexuais, religiosa, pol´ıtica). O QUE EST´A EM JOGO ´E O CONJUNTO DE INSTITUIC¸~OES B´ASICAS DA SOCIEDADE: leva-se ao Judici´ario o conflito entre projetos distintos de institui¸c~ao social, uns conservando as discrimina¸c~oes sociais e pessoais, outro propondo uma sociedade menos excludente e opressiva. Em outras palavras, o processo de judicializa¸c~ao dos conflitos no Brasil est´a atravessado por demandas de justi¸ca din^amica (altera¸c~ao de regras), algo que s´o pode ser realizado judicialmente na esfera da discuss~ao da constitucionalidade de leis, atos e programas. AL´EM DISSO, EST´A EM QUEST~AO A JUSTIC¸A DISTRIBUTIVA (realoca¸c~ao de riqueza e autoridade). [...] Justic¸a distributiva ´e a regra e a virtude da distribuic¸˜ao igual (proporcional) de: (a) coisas comuns (n˜ao produzidas por ningu´em); (b) coisas produzidas em comum; (c) autoridade e poder - liberdade (que por definic¸˜ao s˜ao sociais), com as respectivas responsabilidades e recompensas; (d) incentivos a talentos individuais socialmente relevantes e desejados (embora na sociedade capitalista o talento para fazer dinheiro seja o talento por antonom´asia). Neste sentido, a adequada e justa distribuic¸˜ao destes acervos comuns ´e que propicia o bem comum, aquela condic¸˜ao de realizac¸˜ao de bens individuais, a “busca da felicidade” lembrada belamente por Thomas Jefferson na Declarac¸˜ao de Independˆencia. Os temas que tˆem chegado ao Judici´ario s˜ao predominantemente de justic¸a distributiva. Dizem respeito `a participac¸˜ao dos pobres no fundo econˆomico comum (socialmente produzido, mesmo que por meio da propriedade privada). Dizem respeito `a participac¸˜ao de todos no respeito devido a cada membro da humanidade (direito `a n˜ao-discriminac¸˜ao em raz˜ao de cor, religi˜ao, convicc¸˜ao pol´ıtica, sexo ou orientac¸˜ao sexual). Dizem respeito `a defesa do patrimˆonio comum da humanidade (hist´oria, ecologia, cultura). [...] Aqui est´a uma das dificuldades enfrentadas pelo Judici´ario hoje: a discuss˜ao judicial, a discuss˜ao pol´ıtica, faz-se ainda sob o signo do confronto de vontades, de interesses, de atores individualizados (mesmo que os atores sejam sindicatos, corporac¸˜oes). Uma pol´ıtica p´ublica (uma pol´ıtica industrial, um regime de importac¸˜oes, uma pol´ıtica educacional, um plano de estabilizac¸˜ao monet´aria) n˜ao pode ser compreendida sen˜ao em referˆencia plurilateral, e `as disputas em torno de um bem comum, que n˜ao ´e o interesse do Estado, nem da maioria, nem dos mais ruidosos detentores de espac¸os privilegiados nos meios de comunicac¸˜ao social. Neste sentido, chegam ao Judici´ario, como f´orum de discuss~ao p´ublica, quest~oes que o sistema representativo brasileiro e a sociedade n~ao t^em conseguido resolver.” (LIMA LOPES, 2006, p. 124-125, 127-128) (grifos nossos).

Constituic¸˜oes contemporˆaneas, gerou, nas ´ultimas d´ecadas, uma explos˜ao de litigi-

osidade, trazendo ao Judici´ario ac¸˜oes individuais e coletivas voltadas a efetivac¸˜ao

desses direitos constitucionais. O desempenho judici´ario passou a ter maior relevˆancia

social e suas decis˜oes se tornaram objeto de controv´ersias p´ublicas e pol´ıticas. O Po-

der Judici´ario est´a constitucionalmente vinculado `a efetivac¸˜ao dos direitos fundamentais

e, por isso, `a pol´ıtica estatal (CAMBI, 2009, p. 194) (grifado no original somente em

it´alico).

E, ent˜ao, diante deste contexto no Estado Brasileiro, em que as prescric¸˜oes constitucionais

imp˜oem ao Estado atuar com prestac¸˜oes positivas em prol da efetivac¸˜ao dos direitos humanos

sociais, os agentes p´ublicos

123

se questionam de que forma se deve estabelecer uma adequada

interac¸˜ao entre os ditames constitucionais para a conformac¸˜ao das ac¸˜oes do Estado em prol da

concretizac¸˜ao da cidadania integral124atrav´es da atuac¸˜ao da Jurisdic¸˜ao Constitucional no exerc´ıcio

da func¸˜ao de guardar e de velar para a efetivac¸˜ao da Constituic¸˜ao, considerando, em especial, a

incumbˆencia de garantir a concretizac¸˜ao do perfil constitucional (CF/88, arts. 1o, 3o) pois,

no Brasil, est´a em voga a discuss˜ao sobre os limites de atuac¸˜ao do Poder Judici´ario

na concretizac¸˜ao dos direitos sociais, pois ´e ineg´avel que o discurso do m´ınimo existen-

cial ora esbarra no entendimento da protec¸˜ao judici´aria total (ou seja, na possibilidade

de conferir efetividade ampla a qualquer previs˜ao program´atica de direito social), ora es-

barra no pr´oprio alargamento da ideia do que seja o m´ınimo essencial a ser protegido pelo

Judici´ario. [...] Mas a pr´atica reiterada de intervenc¸˜oes pode gerar um enorme desgaste

para o Judici´ario e um grande preju´ızo final para a sociedade. QUAL O SENTIDO EM

PROFERIR DECIS ˜OES INEXEQU´IVEIS, COMO AQUELAS ONDE SE DETERMINA

A PRESTAC¸ ˜AO DE SERVIC¸ OS ACIMA DAS CAPACIDADES FINANCEIRAS DO

ENTE P ´UBLICO? OU QUAL O SENTIDO EM SE ALTERAR JUDICIARIAMENTE

AS POL´ITICAS P ´UBLICAS, PASSANDO O JUIZ A ADMINISTRADOR, MUITAS

VEZES UM ADMINISTRADOR QUE SOMENTE ENXERGA O ESPAC¸ O DE SUA

JURISDIC¸ ˜AO E O OBJETO RECLAMADO NA CAUSA, E N ˜AO AS NECESSIDA-

DES DA POPULAC¸ ˜AO EM GERAL? [...] A tarefa do Judici´ario na concretizac¸˜ao dos

chamados direitos sociais ´e ingente e essencial para a construc¸˜ao e definic¸˜ao do Es-

tado social brasileiro. Afinal de contas, ´e o direito social quem sustenta o Estado, ao

aproximar e integrar o indiv´ıduo `a sociedade (BAHIA, 2007, p.19, 22-23, 26) (grifos

nossos).

Assim, considerando este contexto e, ainda, se considerando que a dignidade da pessoa hu-

mana (CF/88, art. 1o, III), como fundamento da Rep´ublica Federativa do Brasil,

n˜ao se apresenta como um conceito vazio de conte ´udo. Do mesmo modo, n˜ao pode

nem deve ser tomado como pura abstrac¸˜ao epistemol´ogica de fundamentac¸˜ao de

um sistema ass´eptico e pretensamente “neutro”. ´E um conceito valorativo, um valor

123“Agentes p´ublicos s˜ao todas as pessoas f´ısicas incumbidas, definitiva ou temporariamente, do exerc´ıcio de alguma func¸˜ao estatal.” (MEI- RELLES, 2006, p. 75). “A express˜ao “agentes p´ublicos” ´e abrangente e abriga os agentes pol´ıticos, funcion´arios, servidores, contratados por tempo determinado para servic¸o de excepcional interesse p´ublico e, ainda, os que obtiveram estabilidade por meio da Constituic¸˜ao de 1988, das “Disposic¸˜oes Gerais e Transit´orias”. Tamb´em inclui os particulares em colaborac¸˜ao com a Administrac¸˜ao P´ublica. Agente p´ublico ´e, destarte, o termo correto e que, na verdade, expressa a atividade que esteja sendo exercida por algu´em em nome do Estado.” (FIGUEIREDO, 2008, p. 597).

124Conforme j´a exposto no cap´ıtulo 2 (O perfil da democracia brasileira na CF/88) - Sec¸˜ao O paradigma democr´atico substancial e a cidada- nia, o sentido do termo cidadania integral empregado no texto: “´e o entendimento e pr´atica de uma cidadania integral, que abrange um espac¸o substancialmente maior do que o mero regime pol´ıtico e suas regras institucionais. A cidadania exige, ´e claro, um sistema eleitoral eficiente, de transparˆencia e equidade, de uma cultura de participac¸˜ao eleitoral. Entretanto, a cidadania integral implica, em harmonia com os direitos pol´ıticos, a efetividade dos econˆomicos, sociais e, em geral, de condic¸˜oes objetivas que permitam seu desenvolvimento” (LORA ALARC ´ON, 2011, p. 138) (grifos nossos).

constitucional, que se apresenta como “fundamento” e “base” da ordem jur´ıdico-

constitucional. Um conceito que se apresenta, simultaneamente, como “norma fun-

damental” e “direito fundamental” - numa palavra, como “compromisso fundamen-

tal do Estado”. Por isso, o conceito de “dignidade” n˜ao pode ser visto unicamente na

sua dimens˜ao meramente “negativa”, de exclus˜ao de intromiss˜oes arbitr´arias por parte do

poder p´ublico; mas essencialmente como um conceito de teor “positivo”, de tal sorte que

n˜ao deve sequer ser tomado como crit´erio de “ponderac¸˜ao”, sempre relativa, entre valo-

res, bens e princ´ıpios constitucionais. O homem - e a sua “dignidade preferente” - ´e

um fim em si mesmo, n˜ao um meio ou instrumento na resoluc¸˜ao de conflitos, que

s´o podem, em ´ultima an´alise, ser aferidos perante os dados do “caso”. [...] Neste

sentido, n˜ao vemos como, em relac¸˜ao aos direitos fundamentais sociais mais b´asicos -

como o trabalho, a sa´ude e a educac¸˜ao - , estes n˜ao possam ser concebidos e valorados

como “direitos prestacionais de natureza subjetiva” naquilo que neles possa ser tido por

eminentemente “pessoal”, isto ´e, diretamente decorrente do princ´ıpio da “dignidade da

pessoa humana” na sua dupla dimens˜ao “individual” e “pessoal” - numa palavra, como

ser socialmente integrado. Neste contexto, o princ´ıpio da dignidade da pessoa humana

como “conceito-chave de direito constitucional” poder´a ser chamado a desempenhar,

em sede de interpretac¸˜ao e aplicac¸˜ao dos direitos fundamentais, o papel de motor do

“desenvolvimento” e “aperfeic¸oamento” da ordem jur´ıdico-constitucional. Isto tanto

por “impulso” do legislador pol´ıtico democr´atico (entre n´os, organicamente, a Assembleia

da Rep´ublica e o Governo) como parte dos ´org˜aos espec´ıficos de controle de constituci-

onalidade, genericamente, os tribunais e o poder judicial (QUEIROZ, 2010, p. 174, 192)

(grifado no original somente em it´alico),

Outline

Documentos relacionados