tos individuais dos cidad˜aos (vida, liberdade, igualdade formal, propriedade, seguranc¸a),
tamb´em conhecidos como direitos de primeira dimens˜ao, cuja concretizac¸˜ao demanda
a abstenc¸˜ao dos ´org˜aos estatais, mas ainda implica a necessidade de efetivar, com a
maior abrangˆencia poss´ıvel, os direitos sociais (educac¸˜ao, sa´ude, trabalho, moradia, as-
sistˆencia social), cuja materializac¸˜ao exige o desenvolvimento de prestac¸˜oes positivas do
Estado. [...] Decerto, a dignidade da pessoa humana n˜ao somente expressa a autono-
mia da pessoa humana que caracteriza os direitos individuais, vinculada `a ideia de
autodeterminac¸˜ao na tomada das decis˜oes fundamentais `a existˆencia, como tamb´em
requer prestac¸˜oes positivas do Estado, especialmente quando fragilizada ou ausente
a capacidade de determinac¸˜ao dos indiv´ıduos no cen´ario coletivo. Os direitos sociais
de cunho prestacional encontram-se, assim, voltados para a substancializac¸˜ao da liberdade
e da igualdade dos cidad˜aos, objetivando, em ´ultima an´alise, a tutela da pessoa humana em
face das necessidades de ordem material, com vistas `a garantia de uma existˆencia digna.
Desse modo, os direitos fundamentais sociais catalisam um projeto de emancipac¸˜ao
e de afirmac¸˜ao da dignidade do ser humano, oportunizando a transic¸˜ao da cidada-
nia do plano jur´ıdico-formal para o campo real das relac¸˜oes socioeconˆomicas, sem a
qual n˜ao se realiza o direito justo (SOARES, 2010, p. 152, 155) (grifos nossos),
o exerc´ıcio do direito humano fundamental de participac¸˜ao pol´ıtica pelo cidad˜ao em busca de
uma atuac¸˜ao eficaz da Jurisdic¸˜ao Constitucional em prol da promoc¸˜ao e da protec¸˜ao dos Direitos
Humanos Sociais se justifica, pois
tendo em conta o [respaldo do] aspecto dirigente do ordenamento constitucional, em
que metas s˜ao impositivamente trac¸adas ao Poder P ´ublico e `a sociedade, requer-se
do Judici´ario que aprecie a implementac¸˜ao das diretrizes (pol´ıticas p ´ublicas), que
concorra para a consecuc¸˜ao dos objetivos e que reprima obst´aculos, distorc¸˜oes e
omiss˜oes na realizac¸˜ao dos valores constitucionais. Isso lhe abre um vasto campo e en-
seja o encontro de suas func¸˜oes judiciais com a atividade legislativa numa dimens˜ao pros-
pectiva. [...] Tomando a tarefa de concretizar os comandos constitucionais, inclusive
de modo corretivo ou supletivo em relac¸˜ao a outros sujeitos, e com isso impugnando
“opc¸˜oes pol´ıticas” destes, o ´org˜ao investido da jurisdic¸˜ao constitucional n˜ao se furta,
ele pr´oprio, a uma atuac¸˜ao pol´ıtica. O reconhecimento de que uma atuac¸˜ao juris-
dicional em ˆambito constitucional (e em qualquer ˆambito) representa uma ineg´avel
atuac¸˜ao pol´ıtica j´a n˜ao surpreende mais. A “juridicizac¸˜ao da pol´ıtica” - e o seu re-
verso indissoci´avel “politizac¸˜ao da justic¸a” - n˜ao deve, assim, ser compreendida como
um medo (CARL SCHMITT), mas como um fato. Como diz PETER H ¨ABERLE: “N˜ao
existe apenas pol´ıtica por meio de interpretac¸˜ao constitucional, mas tamb´em interpretac¸˜ao
constitucional por meio da pol´ıtica!” (ROTHENBURG, 2005, p. 129, 133-134)(grifado
no original somente em it´alico),
e, assim, a ideia da atuac¸˜ao da Jurisdic¸˜ao Constitucional, exclusivamente, como protec¸˜ao da
integridade das normas constitucionais e da regularidade das func¸˜oes estatais125(KELSEN, 2007,
p. 123-124) se modifica, paulatinamente, no decorrer dos anos, para consistir numa Jurisdic¸˜ao
Constitucional em que o exerc´ıcio da atividade judicante do Estado, atrav´es de todos os ´org˜aos do
Poder Judici´ario, cont´em o fim de garantir a observac¸˜ao e a concretizac¸˜ao dos ditames constitu-
cionais na atuac¸˜ao dos poderes p´ublicos e, em especial, dos valores ´eticos-pol´ıticos-jur´ıdicos que
inspiram os objetivos fundamentais da Rep´ublica Federativa do Brasil, e deste modo, propiciar a
protec¸˜ao dos direitos humanos fundamentais em raz˜ao da dignidade da pessoa humana, pois
a jurisdic¸˜ao constitucional emergiu historicamente como um instrumento de de-
fesa da Constituic¸˜ao, n˜ao da Constituic¸˜ao considerada como um puro nome, mas
da Constituic¸˜ao tida como express˜ao de valores sociais e pol´ıticos (SILVA, 2001, p.
557), e, nesse sentido, a pretens˜ao efetiva ´e de que os mecanismos constitucionais postos
`a disposic¸˜ao do cidad˜ao e das instituic¸˜oes sejam utilizados, eficazmente, como instru-
mentos aptos a evitar que os poderes p´ublicos disponham livremente da Constituic¸˜ao. A
Constituic¸˜ao n˜ao ´e simples ferramenta; n˜ao ´e uma terceira coisa que se “interp˜oe” en-
tre o Estado e a Sociedade. A Constituic¸˜ao dirige; constitui. A forc¸a normativa da
Constituic¸˜ao n˜ao pode significar a opc¸˜ao pelo cumprimento ad hoc de dispositivos
“menos significativos” da Lei Maior e o descumprimento sistem´atico daquilo que ´e
mais importante - o seu - n ´ucleo essencial-fundamental. ´E o m´ınimo a exigir-se, pois!
[...] Dito de outro modo, descumprir os dispositivos que consubstanciam o n´ucleo b´asico
da Constituic¸˜ao, isto ´e, aqueles que estabelecem os fins do Estado (o que implica traba-
lhar com a noc¸˜ao de “meios” aptos para a consecuc¸˜ao dos fins), implica solapar o pr´oprio
contrato social(do qual a Constituic¸˜ao ´e o elo entre o pol´ıtico e o jur´ıdico da sociedade)
(STRECK, 2011, p. 170) (grifado no original somente em it´alico).
Desta maneira, os valores ´eticos-pol´ıticos-jur´ıdicos constitucionalizados, em especial, o valor
Justic¸aque determina a realizac¸˜ao da justic¸a social, atrav´es da concretizac¸˜ao dos direitos funda-
125Conforme definic¸˜ao de Hans Kelsen: “A garantia jurisdicional da Constituic¸˜ao - a jurisdic¸˜ao constitucional - ´e um elemento do sistema de medidas t´ecnicas que tem por fim garantir o exerc´ıcio regular das func¸˜oes estatais. Essas func¸˜oes tamb´em tˆem um car´ater jur´ıdico: elas consistem em atos jur´ıdicos. S˜ao atos de criac¸˜ao de direito, isto ´e, de normas jur´ıdicas, ou atos de execuc¸˜ao de direito criado, isto ´e, de normas jur´ıdicas j´a estabelecidas. Por conseguinte, costumam-se distinguir as func¸˜oes estatais em legislac¸˜ao e execuc¸˜ao, que se op˜oem assim como a criac¸˜ao ou a produc¸˜ao do direito se op˜oem `a aplicac¸˜ao do direito considerado como simples reproduc¸˜ao. O problema da regularidade da execuc¸˜ao, de sua conformidade `a lei, e por conseguinte o problema das garantias dessa regularidade, s˜ao objeto corrente do estudo. J´a a quest˜ao da regularidade da legislac¸˜ao, isto ´e, da criac¸˜ao do direito, e a ideia das garantias dessa regularidade, enfrentam certas dificuldades te´oricas.” (KELSEN, 2007, p. 123-124) (grifos nossos).