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si pr´oprias n´ıveis de sobrevivˆencia razoavelmente compat´ıveis a dignidade humana Esta ´e a ideia corrente de igualdade de chances ou igualdade de oportunidades 37

´

E nesse contexto que se posicionam os dispositivos relativos `a educac¸˜ao e `a sa ´ude.

Imagina-se que uma pessoa saud´avel e que tenha acesso `a educac¸˜ao ser´a capaz de cons-

truir as condic¸˜oes materiais necess´arias para sua existˆencia em uma sociedade capitalista,

que consagra a livre iniciativa, independentemente do aux´ılio da autoridade p´ublica. Ou

seja: o resultado final da posic¸˜ao de cada um na sociedade depende de sua ac¸˜ao in-

dividual. A verdade, todavia, ´e que, em muitas ocasi˜oes, as pessoas simplesmente

n˜ao tiveram acesso a essas prestac¸˜oes iniciais de sa ´ude e educac¸˜ao ou, ainda que te-

nham tido, isso n˜ao foi suficiente para que elas chegassem a assegurar por si pr´oprias

condic¸˜oes materiais compat´ıveis com a dignidade humana (BARCELLOS, 2011, p.

226-227) (grifado no original somente em it´alico).

A Constituic¸˜ao Federal de 1988, como Constituic¸˜ao dirigente ou diretiva

38, n˜ao se reduz a

mero estatuto do poder governamental, mas enuncia as diretrizes, os programas e os fins a serem

implementados pelos ´org˜aos do Estado com a imprescind´ıvel e permanente atuac¸˜ao da sociedade

em fiscalizar e exigir que os atos dos poderes p´ublicos realizem os ditames constitucionais39, ou

seja, a Assembleia Nacional Constituinte de 1988, atrav´es da Constituic¸˜ao Cidad˜a, previamente,

estabeleceu um plano normativo para a Ordem Econˆomica40e para a atuac¸˜ao pol´ıtica41dos Pode-

res P´ublicos, e estabeleceu as diretrizes (CF/88, art. 3o) para o exerc´ıcio da func¸˜ao administrativa

do Estado visando a implementac¸˜ao de pol´ıticas p´ublicas em prol da consecuc¸˜ao material da Justic¸a

Social42, com o fim de assegurar a todos existˆencia digna e concretizar os objetivos fundamentais

37No decorrer da exposic¸˜ao deste entendimento, a jurista Ana Paula de Barcellos, ainda esclarece que: “A igualdade de chances se op˜oe logicamente `a igualdade de resultados. A igualdade de resultados imagina caber ao Estado assegurar, ou determinar, a condic¸˜ao final dos indiv´ıduos na vida, com relativa indiferenc¸a para com a ac¸˜ao pessoal de cada um, e pressup˜oe um Estado totalit´ario ou, no m´ınimo, paternalista. A igualdade de oportunidades, diferentemente, entende que n~ao cabe ao Estado definir a vida e as escolhas do indiv´ıduo, mas assegurar que todos partam de condi¸c~oes iniciais m´ınimas capazes de permitir que cada um alce seu voo independentemente da autoridade p´ublica.” (BARCELLOS, 2011, p. 226) (grifado no original somente em it´alico).

38Neste sentido: “Constituic¸˜ao dirigente que ´e, a de 1988 reclama - e n˜ao apenas autoriza - interpretac¸˜ao dinˆamica. Volta-se `a transforma¸c~ao da sociedade, transforma¸c~ao que ser´a promovida na medida em que se reconhe¸ca, no art. 3o - e isso se imp~oe - , fundamento `a reivindica¸c~ao, pela sociedade, de direito `a realiza¸c~ao de pol´ıticas p´ublicas . Pol´ıticas P´ublicas que, objeto de reivindicac¸˜ao constitucionalmente legitimada, h˜ao de importar o fornecimento de prestac¸˜oes positivas `a sociedade.” (GRAU, 2008, 216) (grifado no original apenas em it´alico).

39CF/88, Art. 74. “Os Poderes Legislativo, Executivo e Judici´ario manter˜ao, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de: I - avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execuc¸˜ao dos programas de governo e dos orc¸amentos da Uni˜ao; II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto `a efic´acia e eficiˆencia, da gest˜ao orc¸ament´aria, financeira e patrimonial nos ´org˜aos e entidades da administrac¸˜ao federal, bem como da aplicac¸˜ao de recursos p´ublicos por entidades de direito privado; III - exercer o controle das operac¸˜oes de cr´edito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da Uni˜ao; IV - apoiar o controle externo no exerc´ıcio de sua miss˜ao institucional. § 1o- Os respons´aveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela dar˜ao ciˆencia

ao Tribunal de Contas da Uni˜ao, sob pena de responsabilidade solid´aria. § 2o-Qualquer cidad˜ao, partido pol´ıtico, associac¸˜ao ou sindicato ´e parte

leg´ıtima para, na forma da lei, denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da Uni˜ao.” (grifos nossos).

40Em relac¸˜ao a Ordem Econˆomica na CF/88, o jurista Eros Roberto Grau aduz que: “A ordem econˆomica (mundo do dever ser) produzida pela Constituic¸˜ao de 1988 consubstancia um meio para a construc¸˜ao do Estado Democr´atico de Direito que, segundo o art. 1odo texto, o Brasil constitui. N˜ao a afirma como Estado de Direito Social - ´e certo - mas a consagrac¸˜ao dos princ´ıpios da participac¸˜ao e da soberania popu- lar, associada ao quanto se depreende da interpretac¸˜ao, no contexto funcional, da totalidade dos princ´ıpios que a conformam (a ordem econˆomica), aponta no sentido dele. A inexistˆencia de contradic¸˜ao entre tais princ´ıpios, a textura das regras constitucionais considera- das e, ainda, a atribui¸c~ao, `a sociedade, de legitimidade para reivindicar a realiza¸c~ao de pol´ıticas p´ublicas podem fazer do Estado efetivo agente - por ela respons´avel - da promo¸c~ao do bem-estar. A busca da realizac¸˜ao do bem-estar a` Constituic¸˜ao apresta a sociedade e o Estado, busca que se h´a de empreender n˜ao em nome ou func¸˜ao de uma ideologia, mas como imposic¸˜ao de determinac¸˜oes hist´oricas que s˜ao mais do que ideol´ogicas. O alcance do bem-estar ´e, historicamente, o m´ınimo que tem a almejar a sociedade brasileira. [...] A ordem econˆomica na Constituic¸˜ao de 1988 - digo-o - postula um modelo de bem-estar.” (GRAU, 2008, p. 308, 309) (grifado no original apenas em it´alico).

41Em relac¸˜ao ao contexto da atuac¸˜ao pol´ıtica dos poderes p´ublicos ´e importante enfatizar, mais uma vez, os esclarecimentos do jurista Jos´e Afonso da Silva sobre a total vinculac¸˜ao da atuac¸˜ao dos Poderes P´ublicos `as diretrizes constitucionais: “as normas program´aticas tˆem efic´acia jur´ıdica imediata, direta e vinculante nos casos seguintes: I - estabelecem um dever para o legislador ordin´ario; II - condicionam a legislac¸˜ao futura, com a consequˆencia de serem inconstitucionais as leis ou atos que as ferirem; III - informam a concepc¸˜ao do Estado e da sociedade e inspiram sua ordenac¸˜ao jur´ıdica, mediante a atribuic¸˜ao de fins sociais, protec¸˜ao dos valores da justic¸a social e revelac¸˜ao dos componentes do bem comum; IV - constituem sentido teleol´ogico para a interpretac¸˜ao, integrac¸˜ao e aplicac¸˜ao das normas jur´ıdicas; V - condicionam a atividade discricion´aria da Administrac¸˜ao e do Judici´ario; VI - criam situac¸˜oes jur´ıdicas subjetivas, de vantagem ou de desvantagem.” (SILVA, 2012, p. 160) (grifos nossos).

do Estado Democr´atico de Direito Brasileiro com a determinac¸˜ao, em especial, atrav´es dos artigos

1o 43, 3o 44

e 17045

de um modelo de economia de bem-estar que n˜ao poder´a ser alterado para a

adoc¸˜ao de um programa estatal de pol´ıtica anti-social46.

Assim, as disposic¸˜oes constitucionais que determinam a existˆencia f´atica dos fundamentos

do Estado Democr´atico de Direito com a implementac¸˜ao dos direitos fundamentais, notadamente

os direitos de cunho social, por serem normas program´aticas47

visando implementar um padr˜ao

conforme - diz o art. 170, caput - os ditames da justic¸a social. Na referˆencia a ela, a consagrac¸˜ao de princ´ıpio constitucionalmente conformador (CANOTILHO). O princ´ıpio da justic¸a social, assim, conforma a concepc¸˜ao de existˆencia digna cuja realizac¸˜ao ´e o fim da ordem econˆomica e comp˜oe um dos fundamentos da Rep ´ublica Federativa do Brasil (art. 1o, III). Justic¸a social ´e conceito cujo termo ´e indeterminado (note-se

que “conceitos indeterminados”, n˜ao os h´a), contingencial. Do que seja justic¸a social temos a ideia, que fatalmente, no entanto, sofreria reduc¸˜oes - e ampliac¸˜oes - nesta e naquela consciˆencia, quando enunciada em qualificac¸˜oes verbais. ´E que justic¸a social ´e express˜ao que, no contexto constitucional, n˜ao designa meramente uma esp´ecie de justic¸a, por´em um seu dado ideol´ogico. O termo “social”, na express˜ao, como averbei em outra oportunidade, n˜ao ´e adjetivo que qualifique uma forma ou modalidade de justic¸a, mas que nela se comp˜oe como substantivo que a integra. N˜ao h´a como fugir, assim, `a necessidade de discernirmos sentido pr´oprio na express˜ao, naturalmente distinto daquele que alcanc¸amos mediante a adic¸˜ao dos sentidos, isolados, dos voc´abulos que a comp˜oem. Justic¸a social, inicialmente, que significar superac¸˜ao das injustic¸as na repartic¸˜ao, a n´ıvel pessoal, do produto econˆomico. Com o passar do tempo, contudo, passa a conotar cuidados, referidos `a repartic¸˜ao do produto econˆomico, n˜ao apenas inspirados em raz˜oes micro, por´em, macroeconˆomicas: as correc¸˜oes na injustic¸a da repartic¸˜ao deixam de ser apenas uma imposic¸˜ao ´etica, passando a consubstanciar exigˆencia de qualquer pol´ıtica econˆomica capitalista.” (GRAU, 2008, p. 224-225) (grifado no original somente em it´alico).

43CF/88, Art. 1o“A Rep´ublica Federativa do Brasil, formada pela uni˜ao indissol´uvel dos Estados e Munic´ıpios e do Distrito Federal, constitui-

se em Estado Democr´atico de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo pol´ıtico. Par´agrafo ´unico. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituic¸˜ao”.

44CF/88, Art. 3o“Constituem objetivos fundamentais da Rep´ublica Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solid´aria; II

- garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalizac¸˜ao e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, rac¸a, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminac¸˜ao”.

45CF/88, Art. 170 “A ordem econˆomica, fundada na valorizac¸˜ao do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existˆencia digna, conforme os ditames da justic¸a social, observados os seguintes princ´ıpios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - func¸˜ao social da propriedade; IV - livre concorrˆencia; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e servic¸os e de seus processos de elaborac¸˜ao e prestac¸˜ao; VII - reduc¸˜ao das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constitu´ıdas sob as leis brasi- leiras e que tenham sua sede e administrac¸˜ao no Pa´ıs. Par´agrafo ´unico. ´E assegurado a todos o livre exerc´ıcio de qualquer atividade econˆomica, independentemente de autorizac¸˜ao de ´org˜aos p´ublicos, salvo nos casos previstos em lei”.

46O jurista Eros Roberto Grau fez uma an´alise do conte´udo do modelo da economia de bem-estar: “A Constituic¸˜ao do Brasil, de 1988, define, como resultar´a demonstrado ao final desta minha exposic¸˜ao, um modelo econˆomico de bem-estar. Esse modelo, desenhado desde o disposto nos seus arts. 1oe 3o, at´e o quanto enunciado no seu art. 170, n˜ao pode ser ignorado pelo Poder Executivo, cuja vinculac¸˜ao pelas definic¸˜oes constitucionais de car´ater conformador e impositivo ´e ´obvia. Assim, os programas de governo deste e daquele Presidentes da Rep ´ublica ´e que devem ser adaptados `a Constituic¸˜ao, e n˜ao o inverso. A incompatibilidade entre qualquer deles e o modelo econˆomico por ela definido consubstancia situac¸˜ao de inconstitucionalidade, institucional e/ou normativa. Sob nenhum pretexto, enquanto n˜ao alteradas aquelas definic¸˜oes constitucionais de car´ater conformador e impositivo poder˜ao vir a ser elas afrontadas por qualquer programa de governo. E assim h´a de ser, ainda que o discurso que agrada `a unanimidade nacional seja dedicado `a cr´ıtica da Constituic¸˜ao. A substituic¸˜ao do modelo de economia de bem-estar, consagrado na Constituic¸˜ao de 1988, por outro, neoliberal, n˜ao poder´a ser efetivada sem a pr´evia alterac¸˜ao dos preceitos contidos nos seus arts. 1o, 3oe 170. [...] H´a marcante contradic¸˜ao entre o neoliberalismo - que exclui,

marginaliza - e a democracia, que sup˜oe o acesso de um n ´umero cada vez maior de cidad˜aos aos bens sociais. Por isso dizemos que a racionalidade econˆomica do neoliberalismo j´a elegeu seu principal inimigo: o Estado Democr´atico de Direito. O discurso neoliberal confronta o discurso liberal, que viabilizou o acesso da generalidade dos homens n˜ao apenas a direitos e garantias sociais, mas tamb´em aos direitos e garantias individuais. Pois ´e contra as liberdades formais, no extremo, que o discurso neoliberal investe. A exclus˜ao social se d´a sob m ´ultiplas modalidades - s˜ao exclu´ıdos, afinal, tanto a v´ıtima do crime quanto o criminoso. Vivemos um momento marcado pela inseguranc¸a e pelo comprometimento da coes˜ao social. Como reagem os intelectuais diante disso? Como reagem os intelectuais em face das novas formas da Revoluc¸˜ao? Faltam horizontes aos intelectuais, preocupados com a restaurac¸˜ao das condic¸˜oes m´ınimas para que se assegure a dignidade dos homens. N~AO OBSTANTE, A REVOLUC¸~AO ASSUME NOVAS FORMAS, FREQUENTANDO O NOSSO COTIDIANO. MAIS TR´AGICA E CRUEL DO QUE JAMAIS SE PUDERA IMAGINAR, ELA EST´A `AS NOSSAS PORTAS; NAS RUAS E EM NOSSAS CASAS, ONDE J´A N~AO VIVEMOS MAIS TRANQUILOS, EM SEGURANC¸A, EM PAZ; EM CADA SINAL DE TR^ANSITO, ONDE NOS ESPERAM NOSSAS POBRES CRIANC¸AS ASSASSINAS. N~AO BASTAR´A, PARA CONT^E-LA, O ‘‘ESTADO-JAVERT’’, QUE A ISSO PRETENDEM REDUZIR O ESTADO OS NEOLIBERAIS MAIS EXALTADOS, CRENTES DE QUE A QUEST~AO SOCIAL ´E UM CASO DE POL´ICIA. URGE RECONSTRUIRMOS O ESTADO SOCIAL, PROJETO QUE N~AO PODE SER RECUSADO MESMO PELO ADEPTOS BEM-INTENCIONADOS DO CAPITALISMO.” (GRAU, 2008, p. 45, 46, 55, 56) (grifado no original somente em it´alico).

47Em relac¸˜ao aos argumentos cr´ıticos da d´ecada de 90 sobre o discurso jur´ıdico-constitucional da “Constituic¸˜ao Dirigente”, o jurista portuguˆes Jos´e Joaquim Gomes Canotilho aduziu que “a teoria da Constituic¸˜ao dirigente procurou associar o recorte categorial de tipos de normas constitucionais - normas-fim, normas-tarefa, imposic¸˜oes constitucionais - a uma teoria das tarefas do Estado. Tamb´em este ponto - o da articulac¸˜ao da normatividade jur´ıdico-constitucional de normas-fim e normas-tarefa com a teoria das tarefas do Estado - tem sido interpretado no sentido de uma Constituic¸˜ao dirigente n˜ao poder deixar de ser outra coisa que um simples instrumento de estatizac¸˜ao do mundo e da vida. Falar de Constituic¸˜ao dirigente ´e falar de tarefas do Estado; falar de tarefas do Estado equivale a legitimar um Estado- Moloc ou Leviatan. Aqui reside, por´em, uma quest˜ao cuja an´alise mereceria aprofundamentos te´oricos que n˜ao ter˜ao cabimento no contexto deste trabalho. Mas n˜ao deixaremos de equacionar o problema no seu n ´ucleo fundamental. Este reconduz-se a estas interrogac¸˜oes: (1) - deve

min´ımo de justic¸a

48

social

49, n˜ao podem ser consideradas como “normas de intenc¸˜ao, como

se jur´ıdicas e imperativas n˜ao fossem” (SILVA, 2012, p. 136) para embasar as demandas dos

cidad˜aos, pois cont´em a imposic¸˜ao de fins, tarefas e programas50que vinculam os ´org˜aos compe-

tentes (legislac¸˜ao, execuc¸˜ao e jurisdic¸˜ao) para regulamentar e concretizar suas diretivas materiais

permanentes em prol de prestac¸˜oes sociais eficazes para propiciar as condic¸˜oes materiais m´ınimas

indispens´aveis para uma vida com dignidade51.

Os objetivos fundamentais da Rep´ublica Federativa do Brasil52

determinam as finalidades do

Estado Brasileiro para que as ac¸˜oes estatais, atrav´es das pol´ıticas p´ublicas, estejam em confor-

midade com os valores ´eticos-pol´ıticos-jur´ıdicos que foram escolhidos pela sociedade brasileira

o Estado ter tarefas; (2) - essas tarefas devem ser ordenadas e conformadas pela Constituic¸˜ao? A discuss˜ao das tarefas do Estado num Estado-Constitucional n˜ao pode simplificar-se em termos caricaturais, como se depreende, por vezes, de alguma literatura, que quase chega `a conclus˜ao da necessidade liberal de um Estado sem tarefas. [...] O estado moderno surgiu, l´ogica e historicamente, como um tipo de organizac¸˜ao b´asica e origin´aria, devendo a Constituic¸˜ao articular-se com este modelo pr´e-constitucional. Como primeiro fim e o ´unico adequado `a sua essˆencia, o Estado garante a paz e a seguranc¸a. N˜ao compete `a Constituic¸˜ao acrescentar constitutivamente novas tarefas a um Estado pr´e-constitu´ıdo segundo a natureza das coisas. Isso traduzir-se-´a na convers˜ao de uma lei fundamental em instrumento introvertido e auto-suficiente de um projecto incerto e inseguro, mas progressivamente sobrecarregado com tarefas definidas e impostas a n´ıvel constitucional. Os perigos de uma teoria deste g´enero, ultimamente defendida por Josef Isensee est˜ao `a vista: regresso a uma teoria apriorista do Estado que poder´a esgrimir-se contra a constituic¸˜ao democr´atica. O outro “modelo” responde `a quest˜ao do Estado em sentido diametralmente oposto: ´e `a Constituic¸˜ao que pertence “decidir” vinculativamente sobre as tarefas do Estado. O fundamento e a medida jur´ıdica para o exerc´ıcio de tarefas ´e a Constituic¸˜ao. Neste sentido, as tarefas do Estado s˜ao tarefas constitucionais. Problema diferente ser´a o de saber se, a n´ıvel constitucional, deve formular-se um cat´alogo de tarefas concretas, ou se bastar´a reconhecer ao Estado uma competˆencia em branco, tendencialmente geral, deixando-se `a pol´ıtica normal a concretizac¸˜ao das tarefas. Um “Estado em branco” afigura-se-nos um Estado materialmente deslegitimado. N˜ao admitira, assim, que um conhecido juspublicista alem˜ao, P. H¨aberle, pudesse, recentemente, considerar a constitucionalizac¸˜ao de normas-fim como uma caracter´ıstica do actual est´adio de evoluc¸˜ao das constituic¸˜oes estatais. Dizer isto n˜ao significa aplaudir uma esgotante concretizac¸˜ao de tarefas estatais a n´ıvel de uma lei fundamental, nem significa que o desempenho de tarefas p´ublicas implique uma monopolizac¸˜ao estatal dessas mesmas tarefas.” (CANOTILHO, 2008, p. 113-116) (grifado no original somente em it´alico).

48Neste sentido ´e o entendimento do jurista portuguˆes Jos´e Joaquim Gomes Canotilho: “Uma constituic¸˜ao deve estabelecer os fundamentos adequados a uma teoria da justic¸a, definindo as estruturas b´asicas da sociedade sem se comprometer com situac¸˜oes particulares. Todavia, e tendo sobretudo em conta o incumprimento do pr´oprio projecto da modernidade em alguns pa´ıses, a Constituic¸˜ao n˜ao teria de incor- porar um projecto emancipat´orio sob a forma de “constitucionalizac¸˜ao dos exclu´ıdos”, mas uma teoria da justic¸a sobre a indiferenc¸a das condic¸˜oes particulares. A nosso ver, uma completa desregulac¸˜ao constitucional dos “exclu´ıdos da justic¸a” legitima uma separac¸˜ao cres- cente dos in e dos out e n˜ao fornece qualquer arrimo `a integrac¸˜ao da marginalidade. Precisamente por isso, as “ilhas de particularismo”, detectadas em algumas constituic¸˜oes - mulheres, velhos, crianc¸as, gr´avidas, trabalhadores -, n˜ao constituem um desafio intoler´avel ao “univer- sal” e ao “b´asico”, t´ıpico das normas constitucionais. Exprimem, sim, a indispensabilidade de refracc¸˜oes morais ao ˆambito do contrato social constitucional.” (CANOTILHO, 2008, p. 126-127) (grifado no original somente em it´alico).

49O jurista Celso Antˆonio Bandeira de Mello analisando o tema da “Aplicabilidade das Normas Constitucionais sobre Justic¸a Social”, esclarece que “uma vez que a nota t´ıpica do Direito ´e a imposic¸˜ao de condutas, compreende-se que o regramento constitucional ´e, acima de tudo, um conjunto de dispositivos que estabelecem comportamentos obrigat´orios para o Estado e para os indiv´ıduos. Assim, quando disp˜oe sobre a realizac¸˜ao da Justic¸a Social - mesmo nas regras chamadas program´aticas - est´a, na verdade, imperativamente, constituindo o Estado Brasileiro no indeclin´avel dever jur´ıdico de realiz´a-la. Al´em disto, a Constituic¸˜ao n˜ao ´e um mero feixe de leis, igual a qualquer outro corpo de normas. A Constituic¸˜ao, sabidamente, ´e um corpo de normas qualificado pela posic¸˜ao altaneira, suprema, que ocupa no conjunto normativo. ´

E a Lei das Leis. ´E a Lei M´axima, `a qual todas as demais se subordinam e na qual todas se fundam. ´E a lei de mais alta hierarquia. ´E a lei fundante. ´E a fonte de todo o Direito. ´E a matriz ´ultima da validade de qualquer ato jur´ıdico. `A CONSTITUIC¸ ˜AO TODOS DEVEM OBEDI ˆENCIA: O LEGISLATIVO, O JUDICI ´ARIO E O EXECUTIVO, POR TODOS OS SEUS ´ORG ˜AOS E AGENTES, SEJAM DE QUE ESCAL ˜AO FOREM, BEM COMO TODOS OS MEMBROS DA SOCIEDADE. Ningu´em, no territ´orio nacional, escapa ao seu imp´erio. Segue-se que sujeito algum, ocupe a posi¸c~ao que ocupar, pode praticar ato - geral ou individual, abstrato ou concreto - em descompasso com a Constitui¸c~ao sem que tal ato seja nulo, e da mais grave nulidade, por implicar ofensa ao regramento de escal~ao m´aximo.” (BANDEIRA DE MELLO, 2011a, p. 12) (grifos nossos).

50O jurista portuguˆes Jos´e Joaquim Gomes Canotilho expressa sua convicc¸˜ao sobre este aspecto da constituic¸˜ao dirigente dizendo que “n˜ao

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