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A impossibilidade jur´ıdica e f´atica do Estado se eximir da responsabilidade de cumprir

ESTADO-PARTE DO PRESENTE PACTO COMPROMETE-SE A ADOTAR MEDIDAS, TANTO POR ESFORC¸O PR´OPRIO COMO PELA ASSIST^ENCIA E COOPERAC¸~AO INTERNACIONAIS, PRINCIPALMENTE NOS PLANOS ECON^OMICOS E T´ECNICO, AT´E O M´AXIMO DE SEUS RECURSOS DISPON´IVEIS, QUE VISEM A ASSEGURAR, PROGRESSIVAMENTE, POR TODOS OS MEIOS APROPRIADOS, O PLENO EXERC´ICIO DOS DIREITOS RECONHECIDOS NO PRESENTE PACTO, INCLUINDO, EM PARTICULAR, A ADOC¸~AO DE MEDIDAS LEGISLATIVAS.]. Pode-se sustentar que a obrigac¸˜ao de observar o minimum core obligation decorre tamb´em do art. 26 da Convenc¸˜ao Americana de Direitos Humanos (OEA) e do art. 1odo Protocolo Adicional `a Convenc¸˜ao Americana sobre Direitos Humanos em mat´eria de Direitos Econˆomicos, Sociais e Culturais

(OEA), haja vista a similitude da sua redac¸˜ao com o art. 2o, § 1o, do Pacto Internacional de Direitos Econˆomicos, Sociais e Culturais (ONU). [...]

Pois bem, interpretando o art. 2o, par´agrafo 1o, do Pacto Internacional de Direitos Econˆomicos, Sociais e Culturais, o Comitˆe esclarece no par´agrafo

10 do Coment´ario Geral n.3 que: “10. (...) o Comit^e entende que corresponde a cada Estado-parte uma obriga¸c~ao m´ınima [minimum core obligation ] de assegurar a satisfa¸c~ao de, pelo menos, n´ıveis m´ınimos essenciais de cada um dos direitos. Assim, por exemplo, um Estado-parte no qual um n´umero significativo de indiv´ıduos esteja privado de uma alimenta¸c~ao adequada, de cuidados m´edicos essenciais, de abrigo e moradia, ou das mais b´asicas formas de educa¸c~ao est´a, prima facie, descumprindo as obriga¸c~oes contidas no Pacto. Se o Pacto fosse lido de um modo a n~ao estabelecer obriga¸c~oes m´ınimas [minimum core obligation ], seria ele completamente privado de raison d’^etre [raz~ao de ser]. Analogamente, h´a de se advertir que toda avalia¸c~ao de um Estado estar cumprindo sua obriga¸c~ao m´ınima deve levar em conta tamb´em as limita¸c~oes de recursos que se aplicam ao pa´ıs de que se trata. O art. 2o (1) obriga cada Estado-parte a adotar as medidas necess´arias ’at´e o m´aximo de seus recursos dispon´ıveis’. Para que um Estado-parte seja capaz de atribuir a sua incapacidade de assegurar ao menos obriga¸c~oes m´ınimas `

a inexist^encia de recursos dispon´ıveis, deve demonstrar que todos os esfor¸cos foram feitos para usar todos os recursos que est~ao `a sua disposi¸c~ao para satisfazer, com prioridade, aquelas obriga¸c~oes m´ınimas.”. Assim, na interpretac¸˜ao do Comitˆe, ainda que a efetivac¸˜ao dos direitos sociais se dˆe gradualmente, os Estados-partes devem, pelo menos, satisfazer o conte´udo ou n´ıvel m´ınimo dos direitos (minimum core obligation), e, mesmo em ´epocas de crise, devem adotar medidas que visem a proteger as pessoas em situac¸˜oes de desvantagem ou vulnerabilidade na sociedade. [...] Ao abordar as medidas regressivas que afetam o cumprimento das obrigac¸˜oes m´ınimas, em um primeiro momento, o Comitˆe, no par´agrafo 10 do Coment´ario Geral n.3, admitia que o Estado justificasse a impossibilidade de assegurar as obrigac¸˜oes m´ınimas de cada direito `a inexistˆencia de recursos financeiros, demonstrando que todos os esforc¸os foram feitos para usar todos os recursos que est˜ao `a sua disposic¸˜ao para satisfazer, com prioridade, essas obrigac¸˜oes. Todavia, nos par´agrafos 47 e 48 do Coment´ario Geral n. 14 (direito ao gozo mais alto n´ıvel poss´ıvel de sa ´ude), o Comitˆe inaugurou um novo entendimento com relac¸˜ao `a possibilidade de n˜ao serem observadas as obrigac¸˜oes m´ınimas, estabelecendo uma proibic¸˜ao absoluta do descumprimento das aludidas obrigac¸˜oes, entendendo que s˜ao “inderrog´aveis”.” (GOTTI, 2012, p. 75-76, 79-80, 83-84) (grifado no original somente em it´alico).

55“O referido dispositivo prevˆe que “tratado deve ser interpretado de boa-f´e e de acordo com o significado dos termos no pr´oprio contexto, ‘a luz de seu objeto de prop´ositos”. Ainda nesse sentido, os Princ´ıpios de Limburgo sobre a Implementac¸˜ao do Pacto Internacional de Direitos Econˆomicos, Sociais e Culturais pontuam que “os Estados-partes devem a todo tempo agir de boa-f´e no cumprimento da obrigac¸˜oes assumidas perante o Pacto (princ´ıpio 7)” e que “todos os Estados-partes tˆem a obrigac¸˜ao de comec¸ar imediatamente a adotar medidas para a plena realizac¸˜ao dos direitos enunciados no Pacto (princ´ıpio 16)” (Los principios de Limburg sobre la aplicaci´on del Pacto Internacional de Derechos Econ´omicos, Sociales y Culturales, cit. - traduc¸˜ao livre)”.

as “obrigac¸˜oes m´ınimas” (minimum core obligation) se torna patente em face do princ´ıpio da

utilizac¸˜ao do m´aximo dos recursos dispon´ıveis

56, do princ´ıpio da implementac¸˜ao progressiva e

do princ´ıpio da proibic¸˜ao do retrocesso social57, os quais vinculam, por forc¸a do art. 5o, § 2oda

CF/88, a atuac¸˜ao dos poderes p´ublicos em prol da materializac¸˜ao de pol´ıticas p´ublicas que garan-

tam o acesso de todos os cidad˜aos aos benef´ıcios do desenvolvimento nacional e, por conseguinte,

as pol´ıticas p´ublicas estatais somente podem deter o status de legitimidade se na escolha pol´ıtica

(legislativa e/ou administrativa) do escopo central estiver a meta da concretizac¸˜ao de meios efica-

zes para a promoc¸˜ao do acesso aos direitos humanos, em especial, aos direitos humanos sociais,

56“Embora a escolha de onde ser˜ao alocados os recursos p´ublicos tenha um importante componente pol´ıtico, n˜ao pode deixar de ser considerado o seu aspecto jur´ıdico, na medida em que devem ser observadas as diretrizes estabelecidas nas normas constitucionais e nos tratados internacionais ratificados pelo Estado brasileiro. Nesse passo, AL´EM DAS DIVERSAS NORMAS CONSTITUCIONAIS CONTIDAS NO T´ITULO VIII - DA ORDEM SOCIAL, QUE DIRECIONAM A UTILIZAC¸~AO DOS RECURSOS P´UBLICOS PARA A IMPLEMENTAC¸~AO, POR EXEMPLO, DO DIREITO ´A EDUCAC¸~AO E DO DIREITO `A SA´UDE, ´E IMPORTANTE TER PRESENTE QUE O ART. 3o, DE FORMA ABRANGENTE, ENDEREC¸A AOS PODERES P´UBLICOS METAS PROSPECTIVAS VOLTADAS AO ATINGIMENTO DA JUSTIC¸A SOCIAL. A PR´OPRIA ORDEM ECON^OMICA, SEGUNDO O CAPUT DO ART. 170 DA CARTA DE 1988, TEM COMO OBJETIVO ASSEGURAR OS DITAMES DA JUSTIC¸A SOCIAL E ASSEGURAR A TODOS EXIST^ENCIA DIGNA. A enuncia¸c~ao dessas metas evidencia a preocupa¸c~ao da Constitui¸c~ao em fortalecer e ampliar o grau de concretiza¸c~ao dos direitos, sobretudo dos direitos sociais, que s~ao, em ´ultima inst^ancia, o pano de fundo para a promo¸c~ao do desenvolvimento nacional, para a efetiva¸c~ao de uma sociedade livre e justa, para a erradica¸c~ao da pobreza e da marginaliza¸c~ao, para a promo¸c~ao do bem de todos e para a redu¸c~ao das desigualdades sociais e regionais. Al´em das prioridades constitucionais, os compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro tamb´em imp~oem a prioriza¸c~ao de recursos p´ublicos para a ´area social. Nesse passo, o art. 2o, par´agrafo 1o[“Cada Estado-parte no presente Pacto compromete-se a adotar medidas, tanto por esforc¸o pr´oprio como pela assistˆencia e cooperac¸˜ao internacionais, principalmente nos planos econˆomicos e t´ecnico, at´e o m´aximo de seus recur- sos dispon´ıveis, que visem a assegurar, progressivamente, por todos os meios apropriados, o pleno exerc´ıcio dos direitos reconhecidos no presente Pacto, incluindo em particular, a adoc¸˜ao de medidas legislativas.”], do Pacto Internacional de Direitos Econˆomicos, Sociais e Culturais (ONU) e art. 1o[“Os Estados-partes neste Protocolo Adicional `a Convenc¸˜ao Americana sobre Direitos Humanos comprometem-se a adotar as medidas

necess´arias, tanto de ordem interna como por meio da cooperac¸˜ao entre os Estados, especialmente econˆomica e t´ecnica, at´e o m´aximo dos recursos dispon´ıveis e levando em conta seu grau de desenvolvimento, a fim de conseguir, progressivamente e de acordo com a legislac¸˜ao interna, a plena efetivac¸˜ao dos direitos reconhecidos neste Protocolo.”] do Protocolo Adicional `a Convenc¸˜ao Americana de Direitos Humanos em Mat´eria de Direitos Econˆomicos, Sociais e Culturais (OEA) exigem que seja priorizada a implementac¸˜ao dos direitos sociais, utilizando-se “o m´aximo dos recursos dispon´ıveis”. [...] Esclarecendo o que significa a alus˜ao ao “m´aximo dos recursos dispon´ıveis”, o Comitˆe de Direitos Econˆomicos, Sociais e Culturais, no par´agrafo 13 do Coment´ario Geral n. 3, assevera que “A FRASE ’O M´AXIMO DOS RECURSOS DISPON´IVEIS’ ABRANGE TANTO OS RECURSOS EXISTENTES NO ESTADO COMO AQUELES DISPONIBILIZADOS PELA COMUNIDADE INTERNACIONAL POR MEIO DA COOPERAC¸~AO E ASSIST^ENCIA INTERNACIONAIS”. No mesmo sentido, os Princ´ıpios de Limburgo sobre a Implementac¸˜ao do Pacto Internacional de Direitos Econˆomicos, Sociais e Culturais estabelecem, no princ´ıpio 26, que A AFETAC¸~AO DO ‘‘M´AXIMO DOS RECURSOS DISPON´IVEIS’’ PARA A IMPLEMENTAC¸~AO DOS DIREITOS ECON^OMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS ‘‘REFERE-SE TANTO AOS RECURSOS PR´OPRIOS, QUANTO `AQUELES OBTIDOS PELA ASSIST^ENCIA OU COOPERAC¸~AO INTERNACIONAIS”. Al´em de sublinhar que o m ´aximo dos recursos compreende tanto os recursos pr´oprios quanto os de procedˆencia internacional, o Comitˆe j´a manifestou o entendimento de que, em ´epocas de crise, o Estado-parte tem o dever de buscar ajuda internacional.” (GOTTI, 2012, p. 87-89) (grifado no original somente em it´alico).

57“A doutrina brasileira entende que o princ´ıpio da proibic¸˜ao do retrocesso social est´a impl´ıcito na Carta de 1988, especialmente nos arts. 1o, III, 3o, 5o, § 1o, 170 e 193, e o princ´ıpio da proibic¸˜ao da implementac¸˜ao progressiva, impl´ıcito nos arts. 3o, 170 e 193. Todavia, ´e

no ˆambito do direito internacional que se delineiam os contornos do princ´ıpio da proibic¸˜ao do retrocesso social de forma inter-relacionada com o princ´ıpio da implementac¸˜ao progressiva. ´E nos instrumentos internacionais, ali´as - especificamente no art. 2o, par´agrafo 1o[“Cada

Estado-parte no presente Pacto compromete-se a adotar medidas, tanto por esforc¸o pr´oprio como pela assistˆencia e cooperac¸˜ao internacionais, principalmente nos planos econˆomicos e t´ecnico, at´e o m´aximo de seus recursos dispon´ıveis, que visem a assegurar, progressivamente, por todos os meios apropriados, o pleno exerc´ıcio dos direitos reconhecidos no presente Pacto, incluindo em particular, a adoc¸˜ao de medidas legislativas.” (grifos nossos)], do Pacto Internacional de Direitos Econˆomicos, Sociais e Culturais, no art. 26 da Convenc¸˜ao Americana e no art. 1odo Protocolo Adicional `a Convenc¸˜ao Americana de Direitos Humanos em Mat´eria de Direitos Econˆomicos, Sociais e Culturais -, que o

princ´ıpio da implementac¸˜ao progressiva est´a previsto expressamente. [...] E, por extens˜ao, pode-se dizer que tais princ´ıpios decorrem tamb´em do art. 26 [“Desenvolvimento Progressivo. Os Estados-partes comprometem-se a adotar as providˆencias, tanto no ˆambito interno, como mediante cooperac¸˜ao internacional, especialmente econˆomica e t´ecnica, a fim de conseguir progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econˆomicas, sociais e sobre educac¸˜ao, ciˆencia e cultura, constantes da Carta da Organizac¸˜ao dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos recursos dispon´ıveis, por via legislativa ou por outros meios apropriados.” (grifos nossos)] da Convenc¸˜ao Americana de Direitos Humanos (OEA) e do art. 1o [“Os Estados-partes neste Protocolo Adicional `a Convenc¸˜ao Americana sobre Direitos

Humanos comprometem-se a adotar as medidas necess´arias, tanto de ordem interna como por meio da cooperac¸˜ao entre os Estados, especialmente econˆomica e t´ecnica, at´e o m´aximo dos recursos dispon´ıveis e levando em conta seu grau de desenvolvimento, a fim de conseguir, progressiva- mente e de acordo com a legislac¸˜ao interna, a plena efetivac¸˜ao dos direitos reconhecidos neste Protocolo.” (grifos nossos)] do Protocolo Adicional `a Convenc¸˜ao Americana de Direitos Humanos em Mat´eria de Direitos Econˆomicos, Sociais e Culturais (OEA) [...]. O simples fato de os princ´ıpios estarem contemplados nos tratados acima mencionados, que foram ratificados pelo Brasil, significa que eles possuem status de norma constitucional [...]. [...] No tocante `as condutas exigidas para seu cumprimento, o princ´ıpio da implementac¸˜ao progressiva requer que o Estado crie as condic¸˜oes materiais necess´arias para a plena fruic¸˜ao dos direitos sociais, priorizando os recursos necess´arios para gradualmente atingir essa finalidade. COMO OS RECURSOS S~AO FINITOS, ´E FUNDAMENTAL QUE O ESTADO ESTABELEC¸A UM PLANEJAMENTO FOCADO, COM METAS DE CURTO, M´EDIO E LONGO PRAZOS, JUSTIFICANDO `A SOCIEDADE A RACIONALIDADE DOS CRIT´ERIOS ADOTADOS. PARA A AFERIC¸~AO DO CUMPRIMENTO DESSE PRINC´IPIO ´E FUNDAMENTAL QUE SEJA GARANTIDO O ACESSO `A INFORMAC¸~AO DOS CRIT´ERIOS UTILIZADOS PELO ESTADO PARA A ELABORAC¸~AO DAS METAS, INCLUSIVE DA JUSTIFICATIVA DAS PRIORIDADES ELEITAS, SENDO ESPECIALMENTE ´UTIL PARA ESSE FIM A UTILIZAC¸~AO DE INDICADORES SOCIAIS. Por sua vez, o princ´ıpio da proibic¸ ˜ao do retrocesso requer que ao longo do processo de efetivac¸˜ao dos direitos sociais n˜ao ocorram pioras no seu grau de fruic¸˜ao. O retrocesso poder´a ser de duas ordens: normativo (aplic´avel a normas jur´ıdicas) ou de resultados (aplic´avel ao resultado de pol´ıticas p ´ublicas) [...]. [...] Relativamente

em conformidade com os ditames do princ´ıpio hermenˆeutico in dubio pro justitia socialis58e, em

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