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ser reconhecida atuando como protagonista vinculada aos direitos humanos, numa socie dade civil que se est´a construindo possibilitada pelos fluxos de transrelac¸˜oes atuais, e va

se fazendo em n´ıvel global, implicando o exerc´ıcio dos direitos e a realizac¸˜ao da cidadania

dentro e fora do territ´orio e mesmo contra os Estados. A partir de sua ressignificac¸˜ao,

possibilita-se a proposic¸˜ao do reconhecimento do cidad˜ao como sujeito de direitos

universais e a cidadania como uma pol´ıtica dos Direitos Humanos, podendo ser ga-

rantida n˜ao restrita ao territ´orio de um determinado Estado. A realizac¸˜ao da cidada-

nia, dessa maneira, exige do cidad˜ao o reconhecimento do outro e o de ser reconhecido

pelo outro, independentemente de sua origem. Pode-se sustentar, a partir da legitimi-

dade de agir do cidad˜ao a qual prov´em da pr´atica dos direitos humanos incidindo sobre a

organizac¸˜ao da sociedade, que a participac¸˜ao na forma de cidad˜ao/ator, interferindo

na hist´oria individual e coletiva de sua(s) vida(s) transita de cidad˜ao com excessos de

representac¸˜ao para ator social,

implicando nova modalidade participativa

pol´ıtica/c´ıvica/(solid´aria) e, pelo conhecimento e reconhecimento do outro na

pluralidade do mundo social, ambiental e cultural, envolvendo tolerˆancia `as diferenc¸as

na/com a pluralidade do mundo cultural. Assim, a cidadania, al´em de um status le-

gal de exerc´ıcio de direitos, pode ser tomada como respeito ao direito humano e a

dignidade; como dever de preservac¸˜ao e de cuidados culturais, ecol´ogicos e ambi-

entais; como capacidade/potˆencia de interferir pol´ıtica e socialmente nas decis˜oes e

nos assuntos que norteiam a esfera p ´ublica, seja ela estatal ou n˜ao, local ou global

(BERTASO, 2004, p. 12-13) (grifos nossos).

Neste contexto, o direito de participac¸˜ao pol´ıtica inclui o dever do cidad˜ao de exercitar a

cidadania para, em conformidade com os fundamentos (CF/88, art. 1o 10), objetivos (CF/88, art.

3o 11) e princ´ıpios (CF/88, art. 4o 12) do Estado Democr´atico de Direito Brasileiro, atuar e cobrar

natureza, que os direitos s˜ao necess´arios. ´E por essa raz˜ao que Hannah Arendt realc¸a, a partir dos problemas jur´ıdicos suscitados pelo totalitarismo, que o primeiro direito humano ´e o direito a ter direitos. Isto significa pertencer, pelo v´ınculo da cidadania, a algum tipo de comunidade juridicamente organizada e viver numa estrutura onde se ´e julgado por ac¸˜oes e opini˜oes, por obra do princ´ıpio da legalidade. A experiˆencia totalit´aria ´e, portanto, comprobat´oria, no plano emp´ırico, da relevˆancia da cidadania e da liberdade p´ublica enquanto condic¸˜ao de possibilidade, no plano jusfilos´ofico de asserc¸˜ao da igualdade, uma vez que a sua carˆencia fez com que surgissem milh˜oes de pessoas que haviam perdido seus direitos e que n˜ao puderam recuper´a-los devido `a situac¸˜ao pol´ıtica do mundo, que tornou sup´erfluos os explusos da trindade Estado-Povo-Territ´orio. Num mundo ´unico a cidadania, como base para o direito a ter direitos e como condic¸˜ao para um indiv´ıduo beneficiar-se do princ´ıpio da legalidade, evitando-se dessa maneira o surgimento de um novo “estado totalit´ario de natureza”, n˜ao pode ser examinada apenas no ˆambito interno de uma comunidade pol´ıtica. Em verdade, s´o pode ser assegurada por um acordo da comitas gentium, pois este primeiro direito humano, como todos os demais que dele derivam, s´o pode existir, observa Hannah Arendt em artigo publicado em 1949, por meio de acordo e garantias m´utuas, pois n˜ao se trata de algo dado, mas constru´ıdo, e este constru´ıdo, no caso, requer um entendimento de alcance internacional. [...] O que Hannah Arendt estabelece ´e que o processo de asserc¸˜ao dos direitos humanos, enquanto invenc¸˜ao para convivˆencia coletiva, exige um espac¸o p ´ublico. Este ´e kantianamente uma dimens˜ao transcendental, que fixa as bases e trac¸a os limites da interac¸˜ao pol´ıtica. A este espac¸o s´o se tem acesso pleno por meio da cidadania. ´E por essa raz˜ao que, para ela, o primeiro direito humano, do qual derivam todos os demais, ´e o direito a ter direitos, direitos que a experiˆencia totalit´aria mostrou que s´o podem ser exigidos atrav´es do acesso pleno `a ordem jur´ıdica que apenas a cidadania oferece.” (LAFER, 1988, p. 153-154, 166) (grifado no original somente em it´alico).

9Conforme j´a relatado no cap´ıtulo 3 deste trabalho, no item “Breve relato da metamorfose do Estado com a constitucionalizac¸˜ao dos Di- reitos Humanos”, a Declarac¸˜ao Universal dos Direitos Humanos consistiu na tentativa de contemplar os direitos civis e pol´ıticos origin´arios das revoluc¸˜oes burguesas, os direitos de igualdade exigidos pelos socialistas e, ainda, os direitos de solidariedade reivindicados por muitos, inclusive por organizac¸˜oes religiosas, a exemplo da Igreja Cat´olica.

10CF/88, Art. 1o: “A Rep´ublica Federativa do Brasil, formada pela uni˜ao indissol´uvel dos Estados e Munic´ıpios e do Distrito Federal, constitui-

se em Estado Democr´atico de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo pol´ıtico. Par´agrafo ´unico. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituic¸˜ao.” (grifos nossos).

11CF/88, Art. 3o: “Constituem objetivos fundamentais da Rep´ublica Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solid´aria; II

- garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalizac¸˜ao e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, rac¸a, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminac¸˜ao.” (grifos nossos).

12CF/88, Art. 4o: “A Rep´ublica Federativa do Brasil rege-se nas suas relac¸˜oes internacionais pelos seguintes princ´ıpios: I - independˆencia

nacional; II - prevalˆencia dos direitos humanos; III - autodeterminac¸˜ao dos povos; IV - n˜ao-intervenc¸˜ao; V - igualdade entre os Estados; VI - defesa da paz; VII - soluc¸˜ao pac´ıfica dos conflitos; VIII - rep´udio ao terrorismo e ao racismo; IX - cooperac¸˜ao entre os povos para o progresso da humanidade; X - concess˜ao de asilo pol´ıtico. Par´agrafo ´unico. A Rep´ublica Federativa do Brasil buscar´a a integrac¸˜ao econˆomica, pol´ıtica, social e cultural dos povos da Am´erica Latina, visando `a formac¸˜ao de uma comunidade latino-americana de nac¸˜oes.” (grifos nossos).

13dos Poderes P´ublicos o respeito e o cumprimento das cl´ausulas, constitucionais e internacionais,

indispens´aveis a realizac¸˜ao das condic¸˜oes prop´ıcias a uma existˆencia digna (LIMA, 2006, p. 170-

171).

No Estado Democr´atico de Direito Brasileiro, a “Constituic¸˜ao Cidad˜a” elaborada com ampla

participac¸˜ao popular (SILVA, 2001, p. 90), no Cap´ıtulo I do T´ıtulo II (Dos Direitos e Garantias

Fundamentais) - item “Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos” (art. 5o) expressa que,

ao lado dos direitos da cidadania, existem os deveres de cidadania, os quais imp˜oem ao cidad˜ao,

al´em da obrigatoriedade do voto (CF/88, art. 14, § 1o, I14), o dever de cooperar (CF/88, art. 5o,

LXXIII15), ou seja, “exercer seu direito de forma solid´aria e levando em considerac¸˜ao os interesses

da sociedade” (DIMOULIS, 2008, p. 78) para a consecuc¸˜ao do objetivo fundamental da Rep´ublica

Federativa do Brasil de construir uma sociedade livre, justa e solid´aria (LIMA, 2006, p. 164-170),

portanto,

O CIDAD ˜AO ´E RESPONS ´AVEL PELA CONSTITUIC¸ ˜AO FEDERAL: NA SUA EFE-

TIVIDADE, NO COBRO DOS PROGRAMAS QUE ELA TRAZ, NO COMPROMISSO

EXPRESSO EM SUAS NORMAS, NA SUA OBSERV ˆANCIA PELO PODER P ´UBLICO

E PELOS PARTICULARES, NA SUA DEFESA ENFIM. O bom texto constitucional ´e

o que nasceu em ambiente democr´atico, no qual a sociedade participou direta ou indi-

retamente para a sua elaborac¸˜ao. Mas esta participac¸˜ao popular tamb´em deve ser

reivindicada pelos cidad˜aos, buscada por eles e postulada atrav´es dos instrumentos

que se fizerem necess´arios (LIMA, 2006, p. 167) (grifos nossos).

A existˆencia dos deveres (c´ıvicos-pol´ıticos (defesa da P´atria, dever de voto), deveres de car´ater

econˆomico, social e cultural (como o dever de defender, valorizar, promover e proteger a sa´ude,

a educac¸˜ao, o patrimˆonio cultural, ambiental e econˆomico do pa´ıs)) no Ordenamento Jur´ıdico se

funda na reserva da constituic¸˜ao quanto `a fixac¸˜ao destes deveres fundamentais, a qual vincula a

13A importˆancia da cont´ınua participac¸˜ao pol´ıtica do cidad˜ao como protagonista vinculado aos direitos humanos se deve ao fato de que “todos os direitos da humanidade foram conquistados na luta; todas as regras importantes do direito devem ter sido, na sua origem, arrancadas `aquelas que a elas se opunham, e todo o direito, direito de um povo ou direito de um particular, faz presumir que se esteja decidido a mantˆe-lo com firmeza. [...] O direito ´e um trabalho incessante, n˜ao somente dos poderes p ´ublicos, mas ainda de uma nac¸˜ao inteira. A vida completa do direito, considerada no seu conjunto, apresenta `a nossa vista o mesmo espet´aculo da luta, o trabalho sem tr´eguas de uma nac¸˜ao que nos patenteia a atividade dos povos na posse plena da produc¸˜ao econˆomica e intelectual. Cada particular, obrigado a sustentar o seu direito, toma a sua parte neste trabalho nacional e leva o seu ´obolo `a realizac¸˜ao da ideia do direito sobre a terra. [...] A atitude de um homem ou de um povo em presenc¸a de um ataque dirigido contra o seu direito ´e a mais segura pedra de toque do seu car´ater. Se n´os entendemos por car´ater a personalidade plena, repousando sobre si pr´opria e defendendo-se, n˜ao h´a melhor ocasi˜ao para julgar esta preciosa qualidade do que quando o d´espota ataca a pessoa ao mesmo tempo que o direito. [...] a luta pelo direito ´e dever do interessado para consigo pr´oprio. [...] Quem defende o seu direito, defende tamb´em na esfera estreita deste direito, todo o direito. O interesse e as consequˆencias do seu ato dilatam-se portanto muito para l´a da sua pessoa. O interesse geral a que ent˜ao se liga n˜ao ´e somente o interesse ideal de defender a autoridade e a majestade da lei, mas ´e o interesse muito real, muito pr´atico, que em todos se manifesta e todos tamb´em compreendem, mesmo aqueles que daquele primeiro interesse n˜ao tem a menor inteligˆencia, em que a ordem estabelecida da vida social, na qual cada um pela sua parte ´e interessado, seja assegurada e mantida. [...] O direito e a Justic¸a s´o prosperam num pa´ıs, quando o juiz est´a todos os dias preparado no tribunal e quando a pol´ıcia vela por meio dos seus agentes, mas cada um deve contribuir pela sua parte para essa obra. TODA A GENTE TEM A MISS ˜AO E OBRIGAC¸ ˜AO DE ESMAGAR EM TODA A PARTE, ONDE ELA SE ERGA, A CABEC¸ A DA HIDRA QUE SE CHAMA O ARB´ITRIO E A ILEGALIDADE. TODOS AQUELES QUE FRUEM OS BENEF´ICIOS DO DIREITO DEVEM TAMB ´EM CONTRIBUIR PELA SUA PARTE PARA SUSTENTAR O PODER E A AUTORIDADE DA LEI; em resumo, cada qual ´e um lutador nato, pelo direito, no interesse da sociedade [...] Sem luta n˜ao h´a direito, como sem trabalho n˜ao h´a propriedade. `A m´axima: ganhar´as o p˜ao com o suor do teu rosto, corresponde com tanta mais verdade esta outra: s´o na luta encontrar´as o teu direito.” (VON IHERING, 2011, p. 1, 2, 41-42, 44, 48, 50, 93) (grifado no original somente em it´alico).

14CF/88, art. 14 “A soberania popular ser´a exercida pelo sufr´agio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo; III - iniciativa popular. § 1o- O alistamento eleitoral e o voto s˜ao: I - obrigat´orios para

os maiores de dezoito anos; II - facultativos para: a) os analfabetos; b) os maiores de setenta anos; c) os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos. § 2o- N˜ao podem alistar-se como eleitores os estrangeiros e, durante o per´ıodo do servic¸o militar obrigat´orio, os conscritos.” (grifos nossos). 15CF/88, art. 5o, LXXIII - “qualquer cidad˜ao ´e parte leg´ıtima para propor ac¸˜ao popular que vise a ANULAR ATO LESIVO ao

patrim^onio p´ublico ou de entidade de que o Estado participe, `a moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrim^onio hist´orico e cultural , ficando o autor, salvo comprovada m´a-f´e, isento de custas judiciais e do ˆonus da sucumbˆencia.” (grifos nossos).

sua obrigatoriedade ao “princ´ıpio da assinalagmaticidade ou da assimetria entre direitos e deve-

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