• Nenhum resultado encontrado

toda pessoa tem deveres para com a comunidade, em que o livre e pleno desenvolvi mento de sua personalidade ´e poss´ıvel No exerc´ıcio de seus direitos e liberdades, toda

pessoa estar´a sujeita apenas `as limitac¸˜oes determinadas pela lei, exclusivamente com o

fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem

e de satisfazer `as justas exigˆencias da moral, da ordem p´ublica e do bem-estar de uma

sociedade democr´atica (DUDH, art. XXIX, 1, 2) (grifos nossos).

E, especialmente, no contexto do Estado Democr´atico de Direito Brasileiro, por forc¸a da

“Constituic¸˜ao Cidad˜a”, elaborada com ampla participac¸˜ao popular, com o fim prec´ıpuo de propi-

ciar a plena realizac¸˜ao da cidadania (SILVA, 2001, p. 90, 108-109), o exerc´ıcio pleno da cidadania

n˜ao se restringe ao acesso aos direitos pol´ıticos, mas depende das prestac¸˜oes positivas do Estado

“que venham a concretizar a democracia econˆomica, social e cultural, a fim de efetivar na pr´atica

a dignidade da pessoa humana” (SILVA, 2001, p. 110), uma vez que

sem a efetividade dos direitos econˆomicos, sociais e culturais, os direitos civis e pol´ıticos

se reduzem a meras categorias formais, enquanto, sem a realizac¸˜ao dos direitos civis e

pol´ıticos, ou seja, sem a efetividade da liberdade entendida em seu mais amplo sentido,

os direitos econˆomicos e sociais carecem de verdadeira significac¸˜ao. N˜ao h´a mais como

cogitar da liberdade divorciada da justic¸a social, como tamb´em infrut´ıfero pensar

na justic¸a social divorciada da liberdade. Em suma, todos os direitos humanos cons-

tituem um complexo integral, ´unico e indivis´ıvel, em que os diferentes direitos est˜ao

necessariamente inter-relacionados e interdependentes entre si (PIOVESAN, 2009, p.

9) (grifos nossos),

deste modo, o exerc´ıcio da cidadania solid´aria propiciar´a que o Estado Democr´atico de Direito,

atrav´es das pol´ıticas p´ublicas, instaure a democracia substancial17, com a ac¸˜ao eficaz dos Poderes

16Por exemplo: o Preˆambulo do Pacto Internacional de Direitos Civis e Pol´ıticos (1966) que proclama “Considerando que, em conformi- dade com os princ´ıpios proclamados na Carta das Nac¸˜oes Unidas, o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da fam´ılia humana e dos seus DIREITOS IGUAIS E INALIEN´AVEIS, constitui o fundamento da liberdade, da justic¸a e da paz no mundo, Re- conhecendo que esses direitos decorrem da dignidade inerente `a pessoa humana, [...] Compreendendo que o indiv´ıduo, por ter DEVERES para com seus semelhantes e para com a coletividade a que pertence, tem A OBRIGAC¸ ˜AO DE LUTAR PELA PROMOC¸ ˜AO E OBSERV ˆANCIA DOS DIREITOS RECONHECIDOS NO PRESENTE PACTO [...]” (grifos nossos). E, a Declarac¸˜ao Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948) que proclama no Preˆambulo: “Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos e, como s˜ao dotados pela natureza de raz˜ao e consciˆencia, devem proceder fraternalmente uns para com os outros. O CUMPRIMENTO DO DEVER DE CADA UM ´E EXIG ˆENCIA DO DIREITO DE TODOS. Direitos e deveres integram-se correlativamente em toda a atividade social e pol´ıtica do homem. Se os direitos exaltam a liberdade individual, os deveres exprimem a dignidade dessa liberdade. Os deveres de ordem jur´ıdica dependem da existˆencia ante- rior de outros de ordem moral, que apoiam os primeiros conceitualmente e os fundamentam. [...]” e nos artigos XXVIII: “Os direitos do homem est˜ao limitados pelos direitos do pr´oximo, pela seguranc¸a de todos e pelas justas exigˆencias do bem-estar geral e do desenvolvimento democr´atico.” e XXIX: “O indiv´ıduo tem o DEVER DE CONVIVER com os demais, de maneira que todos e cada um possam formar e desenvolver integralmente a sua personalidade.” (grifos nossos).

17O sistema pol´ıtico-administrativo da democracia material (substancial) “se realiza n˜ao apenas pela satisfac¸˜ao de formalidades procedimentais para a escolha dos pol´ıticos, mas pela adoc¸˜ao de novos instrumentos de participac¸˜ao para a escolha das pol´ıticas e para a confirmac¸˜ao de que elas est˜ao sendo executadas a contento.” (MOREIRA NETO, 2005, p. 109) (grifos nossos).

do Estado para permitir, em respeito a dignidade da pessoa humana, a todos os indiv´ıduos, o acesso

as min´ımas condic¸˜oes materiais imprescind´ıveis ao pleno desenvolvimento das potencialidades de

sua personalidade humana, para tanto,

o povo precisa perder a apatia e tornar-se ativo, agente das mudanc¸as do Estado e da

sociedade. Tem de saber que ´e elemento central destas instituic¸˜oes, que ´e ator e n˜ao

expectador. O Estado vive para o cidad˜ao, mas este ´e parte indissol ´uvel integrante

daquele.

18

. Ent˜ao, h´a responsabilidades m´utuas, conquanto de dimens˜oes e naturezas

diferentes. [...] A contribuic¸˜ao dos cidad˜aos ´e fundamental. Eles tamb´em possuem

deveres e possuem meios de ajudar a p´atria, o Estado e os seus semelhantes. E ´e jus-

tamente nos momentos de maior dificuldade que as instituic¸˜oes p´ublicas mais necessitam

dos compatriotas; ora para limpar a corrupc¸˜ao que as infectam, ora para conferir-lhe le-

gitimidade, ora para dar-lhes a forc¸a necess´aria aos empreedimentos e ora para assegurar

suas decis˜oes, tornando-as fortes na execuc¸˜ao. [...] Esta participac¸˜ao popular ´e fun-

damental para o fiel desempenho do servic¸o p ´ublico. ´E preciso que haja cooperac¸˜ao

m ´utua, que as pessoas se conscientizem do importante papel que possuem perante a

sociedade, seus semelhantes e o Estado. [...] Assim, a par dos direitos, os cidad˜aos

possuem deveres que exigem posturas muito mais ativas e requerem disposic¸˜ao para

lutar pelos direitos, pelo respeito ao ordenamento jur´ıdico e a outros institutos e va-

lores sociais, morais, pol´ıticos e jur´ıdicos. ´E pelos deveres, por exemplo, que se pode

sustentar seguramente a eticidade imprescind´ıvel nas relac¸˜oes jur´ıdicas e n˜ao-jur´ıdicas;

os valores que elevam os seres humanos, considerando a proximidade dos deveres com

as virtudes; e a participac¸˜ao pol´ıtica dos cidad˜aos, t˜ao essencial ao desenvolvimento da

Nac¸˜ao (LIMA, 2006, p. 179, 178, 179, 185) (grifos nossos).

O direito de participac¸˜ao pol´ıtica inclui, portanto, o dever de exercitar a cidadania

19

para

atuar em conformidade com os objetivos, princ´ıpios e fundamentos do Estado Democr´atico de

Direito Brasileiro (CF/88, arts. 1o 20, 3o 21, 4o 22), e exigir dos Poderes P´ublicos o respeito e

18No contexto da realidade atual da democracia brasileira, em relac¸˜ao ao aspecto da Democracia meramente Formal que se op˜oe a existˆencia f´atica da Democracia Material (Substancial), ´e esclarecedor a seguinte an´alise das possibilidades de um controle democr´atico fundado na capacidade da populac¸˜ao de manter sob controle o estado e o mercado: “o controle democr´atico somente ´e vi´avel na sociedade consciente e organizada. Aqui aparece o lugar do associativismo com toda sua forc¸a, tradic¸˜ao e perip´ecias, bem como com todas as suas fraquezas hist´oricas. De uma parte, est´a a cidadania individual, tamb´em importante, quando as pessoas em si mesmas elaboram a capacidade de confronto com o Estado e o mercado. De outra, est´a a cidadania organizada coletiva, que potencializa sumamente a competˆencia para o confronto. Associar-se significa potencializar a competˆencia humana democr´atica, realizando a regra da maioria, que deveria prevalecer. A qualidade democr´atica poderia ser resumida como qualidade associativa. A sociedade desorganizada ´e t´ıpica massa de manobra, presa nas m˜aos dos poderosos e ricos. O CULTIVO DA POBREZA POL´ITICA SEMPRE FOI ESTRAT ´EGIA CENTRAL DOS PRIVILEGIADOS, PARA QUE, AFINAL DE CONTAS, OS EXCLU´IDOS SE CONTENTEM COM SUA CONDIC¸ ˜AO SUBALTERNA. CHEGA-SE AO PONTO DE QUERER INFLIGIR AOS EXCLU´IDOS QUE OS PRIVIL ´EGIOS SERIAM M ´ERITO, OU SEJA, INQUESTION ´AVEIS. [...] Enquanto os poderosos se organizam mais facilmente - o cultivo do poder sup~oe como regra alguma forma de organiza¸c~ao privilegiada para que seja poss´ıvel o privil´egio sistem´atico - os exclu´ıdos aparecem na cena como um bando disperso, al´em de destitu´ıdo de instrumenta¸c~oes que favorecem a consci^encia cr´ıtica organizada, como educa¸c~ao, acesso `a informa¸c~ao, manejo de bens culturais cr´ıticos e assim por diante.” (DEMO, 2001, p. 22, 23) (grifado no original somente em it´alico).

19O jurista e magistrado do Tribunal Constitucional Italiano Gustavo Zagrebelsky expressa entendimento neste sentido: “La aspiraci´on cons- titucional al orden justo hace que la dimensi´on del deber, de ser simple reflejo o la otra cara de los derechos, pase a convertirse en un elemento aut´onomo propiamente constitucional. Una vez m´as, se muestra el car´acter compuesto del derecho constitucional actual y la necesidad de combinar sus elementos integrantes. Digamos entonces que la vida colectiva, desde el punto de vista del derecho constitucional actual, no es s´olo el conjunto de los derechos individuales y de los actos que constituyen su ejercicio, sino que es tambi´en un orden objetivo que corresponde a ideas objetivas de justicia que imponen deberes.” (ZAGREBELSKY, 2011, p. 95) (grifos nossos).

20CF/88, Art. 1o“A Rep ´ublica Federativa do Brasil, formada pela uni˜ao indissol´uvel dos Estados e Munic´ıpios e do Distrito Federal, constitui-

se em Estado Democr´atico de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo pol´ıtico. Par´agrafo ´unico. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituic¸˜ao”. (grifos nossos).

21CF/88, Art. 3o “Constituem objetivos fundamentais da Rep ´ublica Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e

SOLID ´ARIA; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalizac¸˜ao e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, rac¸a, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminac¸˜ao.” (grifos nossos).

22CF/88, Art. 4o“A Rep ´ublica Federativa do Brasil rege-se nas suas relac¸˜oes internacionais pelos seguintes princ´ıpios: I - independˆencia

nacional; II - prevalˆencia dos direitos humanos; III - autodeterminac¸˜ao dos povos; IV - n˜ao-intervenc¸˜ao; V - igualdade entre os Estados; VI - defesa da paz; VII - soluc¸˜ao pac´ıfica dos conflitos; VIII - rep´udio ao terrorismo e ao racismo; IX - cooperac¸˜ao entre os povos para o progresso da

o cumprimento das cl´ausulas constitucionais protetivas dos direitos fundamentais, em especial,

os direitos sociais por serem indispens´aveis a realizac¸˜ao das condic¸˜oes prop´ıcias a uma existˆencia

digna (LIMA, 2006, p. 170-171). E, desta maneira, ´e imprescind´ıvel a cont´ınua participac¸˜ao cidad˜a

nas deliberac¸˜oes para a elaborac¸˜ao e, tamb´em, durante os processos de execuc¸˜ao das pol´ıticas

p´ublicas sociais, pois

n˜ao tem mais atualidade, portanto, o argumento que pretenda entrever alguma usurpac¸˜ao

ou intromiss˜ao indevida na crescente participac¸˜ao da sociedade organizada junto aos cen-

tros de Poder e de decis˜ao, quando se leva em conta que cada indiv´ıduo - isoladamente ou

em dimens˜ao coletiva -, na condic¸˜ao de destinat´ario e credor da boa gest˜ao dos neg´ocios

p´ublicos, tem t´ıtulo origin´ario para dela participar ativamente (MANCUSO, 2011, p. 129)

(grifado no original),

para que a tem´atica da promoc¸˜ao do acesso aos direitos humanos esteja na determinac¸˜ao das

prioridades a serem implementadas por meio das pol´ıticas p´ublicas e, previamente, se defina, em

func¸˜ao da realidade econˆomica social e cultural e por consenso, o entendimento sobre as prestac¸˜oes

materiais indispens´aveis para garantir o m´ınimo existencial23, de forma que seja compat´ıvel com

a dignidade da pessoa humana, indispens´avel para possibilitar ao indiv´ıduo `a fruic¸˜ao de qualquer

direito fundamental, e n˜ao apenas a mera sobrevivˆencia f´ısica (m´ınimo vital) (SARLET, 2006, p.

324-332).

Desta maneira, o indiv´ıduo-pessoa humana com existˆencia social, considerando que, no Es-

tado Democr´atico de Direito Brasileiro, o exerc´ıcio da soberania pertence ao povo (CF/88, art. 1o,

§ ´unico

24) com fundamento no direito humano fundamental de participac¸˜ao pol´ıtica

25

poder´a,

como indiv´ıduo-cidad˜ao, exercitar o seu direito de cidadania para questionar e se opor `as normas

infraconstitucionais ou a atos administrativos

26

que possam violar ou obstar `a consecuc¸˜ao das

humanidade; X - concess˜ao de asilo pol´ıtico. Par´agrafo ´unico. A Rep´ublica Federativa do Brasil buscar´a a integrac¸˜ao econˆomica, pol´ıtica, social e cultural dos povos da Am´erica Latina, visando `a formac¸˜ao de uma comunidade latino-americana de nac¸˜oes.” (grifos nossos).

23O jurista Ingo Sarlet esclarece o conte´udo adequado para o m´ınimo existencial: “a noc¸˜ao de m´ınimo existencial, compreendida, por sua vez, como abrangendo o conjunto de prestac¸˜oes materiais que asseguram a cada indiv´ıduo uma vida com dignidade, que necessariamente s´o poder´a ser uma vida saud´avel, que corresponda a determinados patamares qualitativos que transcendam a mera garantia da sobrevivˆencia f´ısica (m´ınimo vital), nos revela que a dignidade da pessoa atua (ainda que n˜ao exclusivamente) como diretriz jur´ıdico-material tanto para a definic¸˜ao do n´ucleo essencial, quanto para a definic¸˜ao do que constitui a garantia do m´ınimo existencial, que, na esteira de farta doutrina, abrange bem mais do que a garantia da mera sobrevivˆencia f´ısica, n˜ao podendo ser restringido, portanto, `a noc¸˜ao de um m´ınimo vital ou a uma noc¸˜ao estritamente liberal de um m´ınimo suficiente para assegurar o exerc´ıcio das liberdades fundamentais.” (SARLET, 2006, p. 325-326) (grifos nossos).

24CF/88, art. 1o, § ´unico: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta

Constituic¸˜ao.” (grifos nossos).

25Com estudo sobre o tema: MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Direito da Participac¸˜ao Pol´ıtica: legislativa, administrativa, judicial: fundamentos e t´ecnicas constitucionais da democracia, Rio de Janeiro: Renovar, 1992.

26Por exemplo, a adoc¸˜ao pelos agentes p´ublicos governamentais, para as deliberac¸˜oes em prol da definic¸˜ao do conte´udo material das pol´ıticas p´ublicas, da “perspectiva neoliberal mais recente [que] parte do suposto de que ´e imposs´ıvel a preservac¸˜ao das regras que orientam a pol´ıtica social no marco da concepc¸˜ao do Estado de Bem-Estar, devido `a crise fiscal, `a excessiva intervenc¸˜ao da esfera estatal no ˆambito do mercado, aos poss´ıveis est´ımulos negativos que os dispositivos institucionais geram no ˆambito do comportamento dos indiv´ıduos, alimentando, supostamente, comportamentos morais indesej´aveis, como um “poss´ıvel parasitismo dos trabalhadores `as custas do esforc¸o das coletividades e/ou o uso clientel´ıstico nas transac¸˜oes”. Assim, por esta vis˜ao, a ´unica via de retomada do crescimento consistiria em romper a articulac¸˜ao entre “emprego e protec¸˜ao social”, sacrificando o “social” - a protec¸˜ao social, a pol´ıtica de sal´ario m´ınimo, etc. O desenho da nova pol´ıtica de redistribuic¸˜ao no quadro neoliberal pressup˜oe, portanto, a distenc¸˜ao da relac¸˜ao entre protec¸˜ao social e emprego, rompendo o modelo que caracterizou a construc¸˜ao parcial do Estado social (Este Estado foi apenas parcialmente implantado no Brasil, nos anos do p´os-guerra, mais particularmente a partir do final da d´ecada de 1950, acompanhando o projeto nacional-desenvolvimentista de substituic¸˜ao das importac¸˜oes e implantac¸˜ao de um projeto de industrializac¸˜ao de bens de consumo dur´aveis. Os direitos sociais restringiam-se `a camada de trabalhadores assalariados vinculados ao mercado de trabalho formal. A Constituic¸˜ao de 1988 universalizou o direito `a assistˆencia), no Brasil, institu´ıdo no p´os-guerra. O centro dessa mudanc¸a situa-se, como disse, na ruptura da protec¸˜ao atrav´es das reformas da Previdˆencia, afetando fundamentalmente os direitos dos trabalhadores protegidos, e na reorientac¸˜ao da concepc¸˜ao de universalidade das pol´ıticas sociais para a implementac¸˜ao de diferentes programas estrat´egicos e compensat´orios da assistˆencia focalizada na linha da pobreza, segundo diferentes “p ´ublicos-alvo”

condic¸˜oes de uma existˆencia digna, pois a exclus˜ao do indiv´ıduo dos benef´ıcios do desenvolvi-

mento27

do pa´ıs, obsta a consecuc¸˜ao da existˆencia f´atica das circunstˆancias m´ınimas de inserc¸˜ao

social que possibilitariam a plenitude de “sua participac¸˜ao ativa e co-respons´avel nos destinos da

pr´opria existˆencia e da vida em comunh˜ao com os demais seres humanos” (SARLET, 2006, p.

299).

4.2

As pol´ıticas p ´ublicas e o exerc´ıcio da cidadania em prol de uma sociedade justa

A Assembleia Nacional Constituinte de 1988, ao delinear o perfil do Estado Democr´atico de

Direito Brasileiro (CF/88, arts. 1o 28

e 2o 29), impˆos, especialmente atrav´es da positivac¸˜ao do

ideal ´etico-pol´ıtico-jur´ıdico contido no artigo 3o 30

da Constituic¸˜ao Cidad˜a31, a observˆancia de

valores e diretrizes com ineg´avel poder de coerc¸˜ao sobre o exerc´ıcio da discricionariedade dos

poderes p´ublicos. E, desta maneira, imprimiu-lhe ineg´avel relevˆancia axiol´ogica e teleol´ogica para

garantir que os processos decis´orios governamentais estejam em consonˆancia com a principiologia

constitucional que imp˜oe a realizac¸˜ao do direito justo na definic¸˜ao do teor das pol´ıticas p´ublicas

(SOARES, 2008, p. 77-87).

Assim, diante da atual realidade vivenciada pela populac¸˜ao brasileira no contexto do mundo

globalizado, o Estado Brasileiro deve efetivar condic¸˜oes materiais adequadas (prestac¸˜oes estatais

de natureza material ou f´atica) que propiciem a concreta inclus˜ao de todos numa vida social digna,

ou seja, deve atuar em harmonia com a expressa determinac¸˜ao constitucional (CF/88, art. 3o, I)

de realizar o objetivo fundamental de construir uma sociedade livre, justa e solid´aria32, pois, “a

(ESTA RECONVERS~AO, POR EXEMPLO, TRANSFORMA O COMBATE AO DESEMPREGO EM AC¸~OES DE ASSIST^ENCIA E N~AO NUM PROJETO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTADO PARA O PA´IS, QUE POSSIBILITE A GERAC¸~AO DE NOVAS ATIVIDADES E EMPREGO).” (LEAL IVO, 2006, p. 64-65) (grifado no original somente em it´alico).

27O conceito de desenvolvimento se vincula ao entendimento da necess´aria concomitˆancia de duas facetas: crescimento quantitativo da economia - aumento do ´ındice do PIB (Produto Interno Bruto) com o aumento da qualidade do padr˜ao de vida na sociedade - aumento do ´ındice IDH (´Indice de Desenvolvimento Humano). Neste sentido: GRAU, 2008, p. 216-217, SILVA NETO, 2001b, p. 97-98.

28CF/88, Art. 1o“A Rep´ublica Federativa do Brasil, formada pela uni˜ao indissol´uvel dos Estados e Munic´ıpios e do Distrito Federal, constitui-

se em Estado Democr´atico de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo pol´ıtico. Par´agrafo ´unico. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituic¸˜ao”.

29CF/88, Art. 2o“S˜ao Poderes da Uni˜ao, independentes e harmˆonicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judici´ario.”

30CF/88, Art. 3o“Constituem objetivos fundamentais da Rep ´ublica Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solid´aria;

II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalizac¸˜ao e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, rac¸a, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminac¸˜ao”. (grifos nossos).

31“ ´E a primeira vez que uma Constituic¸˜ao assinala, especificamente, objetivos do Estado brasileiro, n˜ao todos, que seria despropositado, mas os fundamentais, e, entre eles, uns que valem como base das presta¸c~oes positivas que venham a concretizar a democracia econ^omica, social e cultural, a fim de efetivar na pr´atica a dignidade da pessoa humana.” (SILVA, 2001, p. 109-110) (grifos nossos).

32No cap´ıtulo 2 (O perfil da Democracia Brasileira na CF/88) - item “A Constitui¸c~ao como diretriz ´etica-pol´ıtica-jur´ıdica para uma atua¸c~ao estatal com efic´acia social” e no cap´ıtulo 3 (Os objetivos do Estado e os Direitos Humanos como Direitos Fun- damentais) - item “O paradigma do Constitucionalismo Social da CF/88” deste trabalho foi realizada uma an´alise descritiva do perfil ideol´ogico adotado pela Assembleia Constituinte de 1988 ao promulgar a Constituic¸˜ao Cidad˜a: “instituir um Estado Democr´atico, destinado a assegurar o exerc´ıcio dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a seguranc¸a, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justic¸acomo valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos”. E, com base nos esclarecimentos dos doutrinadores que foram apon- tados nos referidos cap´ıtulos podemos obter uma compreens˜ao do ideal humanista contido no objetivo fundamental de “construir uma sociedade livre, justa e solid´aria”, ent˜ao, desta maneira, se percebe que a realizac¸˜ao do objetivo da construc¸˜ao de uma sociedade livre, justa e solid´aria comec¸a a existir, no ˆambito da vida real de cada cidad˜ao, quando os poderes p´ublicos (Legislativo, Executivo, Judici´ario) passam a cumprir as diretrizes do valor fim Justic¸a Social que orienta a Ordem Econˆomica e a Ordem Social do Estado Brasileiro para possibilitar a consecuc¸˜ao, na esfera do mundo dos fatos, da Democracia com igualdade de oportunidades, na qual cada indiv´ıduo, pela raz˜ao de existir como pessoa humana, tenha acesso `as prerrogativas da cidadania integral e, deste modo, a chance real de participar de tudo o que a vida social permite `a pessoa humana.

Outline

Documentos relacionados