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114 A CULTURA GREGA E AS ORIGENS DO PENSAMENTO

O Hino Pindàrico a Zeus

114 A CULTURA GREGA E AS ORIGENS DO PENSAMENTO

Eurípides. Se eram características de Ésquilo as roupas luxuosas, para| Eurípides o comum são os andrajos que vestem certas personagens. A4

vida sim ples do dia-a-dia é mais verdadeira para ele do que o fausto^ solene. Sentim os, nessa concepção, além da influência de idéias filo-| sófico-em píricas, o influxo de novas idéias sociais, mas, no fundog também elas nos demonstram que, na Atenas do século V, vai-se ex;, tin g u in d o a c o n v ic ç ã o de que o D iv in o se r e v e la através da* m agnificência do mundo das aparências; elas nos dizem que os pro-J blemas da retidão no agir tornam-se cada vez mais determinantes na^ busca da realidade dotada de valor autêntico. E mais; em Ésquilo^ também as coisas podem tomar parte na ação, com o, por exem plo, em1

Agamemnon, o velho machado homicida ou o tapete que o rei pisano retorno à pátria. Diríamos que esses objetos constituem sím bolos, e é sob esse nome que determinados objetos significativos são introduzi­ dos também no drama moderno. Mas para Ésquilo ainda não existe essa categoria de objetos de valor derivado; nele, eles têm um valor imediato e são quase vivos. E diante do novo senso da realidade que nascia nessa época, isso devia parecer ¡natural, dar impressão de ma­ gia: os objetos são coisas mortas, agir só o homem pode.

Influxo ainda mais duradouro têm essas novas conquistas do cof nhecim ento sobre a interpretação e a representação do agir humanov Quanto mais se tende a considerar o espírito humano com o a verdat deira realidade vivente, tanto mais rica parece a vida da alma e, a par­ tir do momento em que a realidade da existência humana passa a s e i cada vez mais encontrada no campo espiritual, cada vez maior será o em penho do drama em investigar os m otivos espirituais. Todos sabé-: m os quão vasto foi o campo aberto por Eurípides com suas tragédias: Liberto do emaranhado das forças divino-terrenas, o homem torna-se fonte de efeitos e de ações, deixa-se guiar apenas por suas paixões e pelo conhecimento: todo o resto não passa de vaidade e aparência. Mas quem ousará penetrar na essên cia humana? Quem ousará sondar o próprio eu até o fundo? O conhecim ento do homem e do próprio eu torna-se agora tarefa da reflexão, com o tarefa da investigação era q conhecimento da natureza. A realidade não é mais simplesmente algo dado. Seu verdadeiro valor não mais se apresenta de forma imediata através dos acontecim entos terrenos, e o sign ificad o do mundo das aparências não mais se revela diretamente ao homem: isso significa exatam ente que o m ito está morrendo. As figuras m íticas já não se apresentam aos olhos do poeta em sua realidade mítica, com suas qua­ lidades características, com suas empresas de reconhecido valor; e as^ sim é que Eurípides crê ser sua tarefa nelas buscar um valor que as torna de novo fidedignas. Para ele, essa não é uma transformação arbitrária do mito; ao contrário, ele acredita voltar à verdadeira essência dessa figuras, aprofundando-lhes os m otivos espirituais e psicológicos.

115 Por conseguinte, Eurípides desenvolve aquilo que Ésquilo havia iniciado: a realidade que o drama procura está no mundo do espírito e, para dar realce a essa realidade, deve ele, por sua vez, reduzir os acontecimentos a formas estilizadas e puras; cria, assim, situações exasperadas; onde tudo tende para uma ação decisiva, mas esforça-se em fazê-las parecer naturais por m eio de um ambiente mais próximo da realidade e mediante m otivações psicológicas. A necessidade de representar a essência da ação também leva Eurípides ao jogo cênico, isto é, a uma realidade artística que não é a realidade da vida. Melhor: a essa nova forma de tragédia, embora na aparência mais próxima da realidade, a realidade da vida oferece menos matéria do que a Frínico e a Ésquilo. As tentativas de uma tragédia histórica foram logo abando­ nadas pelos gregos, dado que o mito se prestava mais facilmente do que a história a uma interpretação do espírito humano e, portanto, ao jogo cênico. E por isso, m esm o deixando de ser considerado realidade, o mito continuou sendo para eles o mundo da realidade artística.

É na tragédia que o mito perde toda relação com situações deter­ minadas, concretas. Já não serve, com o na poesia lírica arcaica, para a representação de fatos da vida humana fixados no tempo e no lugar, como vitórias, núpcias, festas do culto, mas para a representação de fatos universais. É evidente que assim o interesse da tragédia se des­ loca para a filosofia, e não está longe o m om ento em que a problemá­ tica da ação humana de que se ocupa a tragédia se transformará num problema do conhecimento, e que Sócrates pretenda resolvê-la atra­ vés do conhecim ento do bem. Mas desse m odo a realidade passa a ser concebida em sentido totalm ente abstrato, isto é, com o con ceito teleologico. A quele estrato da realidade que encerrava em si o sign ifi­ cado das coisas está, diante da realidade que esse significado acolhia, na mesma relação em que o universal está para o particular. Eurípides ainda está longe desse m omento, é poeta e não filósofo, vê a realidade em figuras vivas, não em conceitos; mas é através de suas tragédias que podemos compreender por que Aristóteles afirma que a poesia é mais filosófica do que a história.

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