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6 A CULTURA GREGA E AS ORIGENS DO PENSAMENTO

i O Homem na Concepção de Homero

6 A CULTURA GREGA E AS ORIGENS DO PENSAMENTO

pá0ea é, de resto interpretado erroneamente nesse significado, como! se poderá ver em seguida.

Prosseguindo no jogo de transportar não a língua de Homero para a nossa, mas a nossa língua para a homérica, descobrimos outros modos de: traduzir a palavra “corpo” Como devemos traduzir “ele lavou o próprio corpo”? Homero diz: %póa ví

Ç

eto

.

Ou então, como diz Homero, “a espada penetrou em seu corpo”? Aqui Homero usa ainda a palavra xpcbç (khrés)v

Çícpoç %poòç òvqAfte. Nas referências a essas passagens. Acreditou-se que %pd)ç significasse “corpo” e não “pele”6

Mas não há dúvida de que %pcbç, na verdade, seja a pele; não, natural­ mente, a pele no sentido anatômico, a pele que se pode destacar e que seria o ôépjxoc {dèrma), e sim a pele como superfície do corpo, como invólucro, como portadora da cor, e assim por diante. Na realidade, %p6ç assume! numa série de frases, ainda mais decisivamente, o significado de “corpo”’

7iepi

xpol ôógeto%aXKÓv, isto é, “ele cingiu em tomo ao busto a couraça”

(literalmente, em tomo à pele).

Parece-nos estranho que não haja existido uma palavra que expri­ misse o significado de corpo como tal. Das frases citadas que podiam ser empregadas naquele tempo para corpo em lugar da expressão mais tar^ dia acopa (soma), somente os plurais y m a (güia), \iÉ \za (mélea) etc?? permanecem indicando a corporeidade do corpo, visto que x p á ç é ape4 nas o limite do corpo e ôápaç (démas) significa estatura, corporatura, & só o encontramos no acusativo de relação. A prova de que, nessa época, o corpo substancial do homem foi concebido não como unidade mas com o pluralidade aparece até mesmo no modo com o a arte grega arcai­ ca delineia a figura do homem.

Fig. I Fig. 2

6. Essa parece ser uma antiga interpretação de Homero. De fato, ao que parece, já Pindaro, quando menino aprendia na escola que %pcbç corresponde, em muitos lugares, a acopa. Quando (Pind. 1,55) diz de Filotetes: òcoôeveí pèv xpcoxi ßaivoov, “aqueles que se ia com sua débil pele”, já tem a noção do “corpo vivo”, e também conhecerá, portanto, a palavra correspondente acopa, mas evita-se (não só aqui como em outros trechos), por não estar consagrada pela dicção poética. Se uma interpretação tardia de Homero diz que xpcoç, em Homero, é sempre a “pele”, e jamais o “corpo” (K. Lehrs, Quaest. ep., 1837, p. 193), isso significa que a palavra fora anteriormente interpretada como “corpo”. Mesmo o fato de que Pindaro use (Nem., 7,73) ymov no singular demonstra que ele já possuía a concep­ ção de “corpo” Também essa é uma substituição poética de acòpa.

Só a arte clássica do século V irá representar o coipo com o um eomplexo orgânico, unitário, no qual as diversas partes estão relaciona­ das umas com as outras. Anteriormente, o coipo era de fato construído juntando-se as partes isoladas, com o foi Gerhard Krahmer o primeiro a demonstrar7 A figura desenhada do coipo humano ao tempo dos poe­ mas homéricos difere, porém, notavelmente, da que nos é dada, por exemplo, pelos desenhos primitivos das nossas crianças, embora tam­ bém elas outra coisa não façam além de juntar membros isolados. Em nosso país, as crianças, quando querem desenhai* um homem, geralmen- te o representam como a Figura 1. Já nos vasos gregos da fase geométrica, o homem é representado como na Figura 2.

Nossas crianças põem no centro, como parte principal, o tronco, e a ele acrescentam a cabeça, os braços e as pernas. Às figuras da fase geo­ métrica, ao contrário, falta exatamente essa parte principal; isto é, elas são autenticamente péÃeoc kocí ymoc (mélea kai güía), membros com músculos fortes, distintos uns dos outros por juntas fortemente acentua­ das. Não há dúvida de que, nessa diferença, também o ornato desempe­ nha seu papel, mas importância ainda maior tem aqui aquela particular maneira de ver as coisas de forma “articulada”, própria dos gregos da primeira era. Para eles, os membros distinguem-se muito claramente uns dos outros, as articulações são acentuadas em sua particular sutileza que se contrapõe à exagerada grossura das partes carnosas. O desenho grego primitivo capta a mobilidade do corpo humano, o desenho infan­ til representa sua compacidade. O fato de que os gregos dos primeiros séculos não concebem o corpo com o unidade, nem na língua nem nas artes plásticas, confirma o que nos haviam demonstrado os diversos verbos de “ver” Os verbos primitivos captam essa atividade nas suas formas evidentes, através dos gestos ou dos sentimentos que a acompa­ nham, ao passo que na língua mais tardia é a verdadeira e autêntica função dessa atividade que é colocada no centro do significado da pa­ lavra. E claro que a tendência da língua é a de aproximar-se cada vez mais do conteúdo; o próprio conteúdo, porém, é uma função que não está ligada, nem em suas formas exteriores nem com o tal, a determina­ dos e bem definidos movimentos do ânimo. Mas a partir do momento em que essa função é reconhecida e lhe é dado um nome, ela adquire existência, e a consciência de sua existência rapidamente se torna pro­ priedade comum. N o tocante ao corpo, as coisas provavelmente se de­ senvolvem da seguinte maneira: quando o homem dos tempos primi­ tivos quer indicar uma pessoa que a ele se apresenta, basta que pronun­ cie o nome dela, que diga: este é Aquiles, ou então: este é um homem. Quando se quer fazer uma descrição mais precisa, indica-se, antes de

7. Figur und Raum in der ägyptischen und grieshisch-arhaischen Kunst, 28.

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tudo, aquilo que impressione aos olhos, a saber, os membros; só m ail tarde é que a relação funcional desses membros passa a ser reconhecidl com o essencial. M esmo nesse caso, porém, a função é algo de real, niM

essa realidade não se revela de modo tão claro e, ao que parece, não;l coisa que se sinta em primeiro lugar, nem mesmo pela própria p essoâ Uma vez descoberta, porém, essa unidade, até então não revelada, in|j

põe-se de forma imediata. í

Esse elemento real existe para o homem somente enquanto é “visi to”, e sua existência reconhecida enquanto é ele determinado por uma pài lavra e, portanto, pensado. Naturalmente, até mesmo os homens hom i! ricos tiveram um coipo com o os gregos da época mais tardia, mas não |j sentiam como “corpo”, e sim, com o um conjunto de membros. Pode-sej portanto, dizer também que os gregos homéricos ainda não tinham uòij corpo na verdadeira acepção da palavra: corpo, acopa (sõma), é uma iifj terpretação tardia do que inicialmente se concebia como pé^/rj (mèle) Í y m a (güía), como “membros”, e, de fato, Homero fala sempre de ágeis] pernas, de móveis joelhos, de fortes braços, visto que esses membros re* presentami para ele uma coisa viva, o que impressiona aos olhos8 9 : O mesmo se pode dizer a respeito do espírito e da alma. Também* para “alma” e “espírito” falta a Homero a palavra correspondente. (psykhe), palavra usada para “alma” no grego mais tardio, nada tem a: ver, na origem, com a alma pensante e senciente. Em Homero, vi/o)%fi só é a alma enquanto “anima” o homem, isto é, enquanto o mantém vivo. Também aqui, num primeiro momento, parece-nos descobrir uma lacu^ na na língua homérica, mas, à semelhança da palavra “corpo”, pode ela ser preenchida por outras palavras que, embora não tendo os mesmo valor das expressões modernas, podem substituir a palavra “alma” Para indicar “a alma”, são usadas em Homero particularmente as palavras xj/oxfj (psykhe), 0\)póç (thymós) e vóoç (nóosf

8. Na verdade, tampouco encontramos em Homero um vocábulo que corresponda | braço e perna, mas apenas palavras que indicam mão, antebraço, braço, pé, parte inferiori parte superior da perna. Falta igualmente uma palavra que designe o tronco em seu conjunt#

9. Essas palavras foram exaustivamente estudadas na dissertação de Gottinga de Joachim Böhme, Die Seele und das Ich bei Homer (1929). Foi também Böhme quelli observou que em Homero não existe um vocábulo que indique o conjunto da vida do seri! timento, isto é, a alma e o espírito, segundo nossa concepção. Esses pensamentos foram expressos por mim numa apreciação do livro de Böhme in “Gnomon”, 1931,74 e ss. Sobre as palavras vóoç e voeiv, cf. Kurt von Fritz, “Class. Philol.”, 38,1943,79 e ss., e 40,1945, 223 e ss. Sobre o subseqüente desenvolvimento da discussão acerca do conceito de alma em Homero, cf., antes de mais nada, Hermann Frankel, Dichtung und Philosophie dei

friithen Griechentums, 1951, 108 e ss.. Eric Robertson Dodds, The Greeks and tiú Irrational, 1951, e - bastante estimulante mas nem sempre convincente - o livro de R. B

Onians, The Origin o f European thought about de body, the mind, the soul, the world,

9 Sobre a xj/uxTl, diz Homero que eia abandona o homem no momento da morte, que vagueia no Hades, mas nada diz ele de como a yv>%r[ se comporta no vivente. As diferentes teorias sobre o que possa ser a yt>%fi enquanto se encontra no homem baseiam-se apenas em suposições e ana­ logias, mas não são atestadas nos poemas homéricos.

Cumpre-nos ter presente que bem poucas são as coisas que Homero nos diz sobre a yuxTl do homem vivente e no momento da morte. A saber: 1 que ela abandona o homem no momento da morte ou quando ele des-

jnaia;

2. que no combate expomos a própria yuxfj, que na luta está em jogo a yv%ri, que a meta é salvar a própria e coisas do gênero. Não encontramos aí nada que nos autorize a atribuir dois significados diferen­ tes à palavra \|/oxfi: por exemplo, o significado de “vida” no segundo caso, mesmo se aqui traduzirmos a palavra xj/cxq por vida. Mas quando se diz que alguém combate pela própria \ja)xti> que empenha a própria xj/DXfi* que procura salvar a xj/uxti, faz-se sempre referência à alma, que, na mor­ te, abandona o homem.

Esse afastar-se da alma em relação ao homem é descrito por Homero em poucos traços; ela sai pela boca e é emitida com a respiração (ou tam­ bém através do ferimento) e voa para o Hades. Ali, torna-se espectro, leva a existência das sombras, como “imagem” (eíôcoÃov) do defunto. A pa­ lavra tem afinidade com \|/\)%£iv, “expirar”, e significa o hálito de vida, e portanto a \|/t>xfi sai Pe^a boca (a saída através do ferimento é, ao que parece, uma forma secundária). Esse hálito vital é quase um órgão físico que, até que o homem esteja vivo, nele vive.

Mas sobre onde essa xj/^xrt se situa e como age, Homero nada diz, e assim tampouco a nós é dado sabê-lo. Com a palavra xj/Dxf] indica-se, evidentemente, nos tempos de Homero, “a alma de um defunto”; uma vez, de fato, diz-se em Homero: “N ele há somente uma xi/'OXfi ”» ele é mortal (//., XXI, 569). Homero não usa, porém, essa palavra se tenciona dizer “até quando o espírito vital permanece no homem” Assim vem ela expressa na ¡lia d a , X, 89: £Íç õ k ’ cnnpr] èv oxfi0£oai pévrj K a i poi (píÃa yoóvax’ òpcbpri, “até quando permanece a respiração em meu peito e movem-se-me os joelhos”. Fala-se aqui em “respiração”, mas o verbo “permanece” demonstra que cabe também, em parte, a idéia da \|n>Xrt e, mais precisamente, a idéia do alento vital.

Ainda encontramos em Homero duas palavras que significam espí­ rito, a saber, 0opóç (thymós) e vóoç (nóos). Oupóç é, em Homero, o que provoca as em oções e vóoç o que faz surgir as imagens; assim sendo, o mundo espiritual, da alma, fica de certo modo dividido entre esses dois diferentes órgãos espirituais. Em muitos pontos, ao falar da morte, diz ele que 0'opóç abandona o homem, daí a suposição de que também a palavra 0opóç estivesse indicando uma forma de “alma” que provavel­ mente tenha disputado terreno com a palavra xj/uxfl- Sete vezes apresen- ta-se-nos a frase: X ím ô ’ oaT£ct 0upóç, isto é, “o 0upóç abandona os

IO A CULTURA GREGA E AS ORIGENS DO PENSAMENTO... 1 ossos” e duas vezes còm 8è Gupòç &xe^ ànò peXécov, “logo o 0\)ji<| destacou-se dos membros” Se dermos a 0t>póç o significado de “órgãff do movimento”, a frase explica-se facilmente. Sabemos que esse órg|| também determina os movimentos do corpo, dai ser naturai dizer quef •/v| no momento da morte, ele abandona os ossos e os membros com seal músculos (este é, basicamente, o significado da palavra péXr|). Entrai tanto, não se diz com isso que o Gopóç continua a viver após a morte? quer-se dizer apenas que o que punha em movimento os ossos e os memí bros se foi. Mais difíceis de interpretar são aqueles trechos em que aparem'; tem ente se emprega sem distinção tanto Gupóç quanto \|n)%fl. Na!

Ilíada, XXII, 67, encontramos: etceí ke t i ç ò^éi %ccXkcò TÓxj/aç f||- ßaX,cbv p£0écov èK Gdjiòv E^rpcoa. “Se alguém golpeando com o ferro tinJ o0D jióçdos pá0ri”

É impossível darmos aqui a péGri outro significado que não o dei membros, o que nos leva a uma imagem semelhante à do verso acima; citado, isto é, que o Gopóç abandone os membros - e essa é a interpreta-/

ção mais antiga da palavra10 * i

Outras dificuldades, porém, apresentam-se em outros pontos onde. aparece, em Homero, a palavra pé0r|: Ilíada, XVI, 856; XXII, 362: ’ v}Tü%ti 8 ’ èk peGécov rcmpévri A i5óa8e ßEßrpcEi, a “psique partiu dos; pé0rj e foi para o H a d es” Isso nos parece estranho, v isto que costumeiramente a \j/t>xt] abandona o corpo através da boca (IL, IX, 409) ou então da ferida (II., XIV, 518, cf. XVI, 505); sempre, portanto, se imagina que a saia através de uma abertura do corpo. Em confronto com estas, a expressão: “dos membros partiu a alma e foi para o Hades” não só parece muito mais desbotada, com o pressupõe^ também que a alma se situe nos membros, coisa a que não se alude eme outros lugares. Presentemente, porém, a palavra péGoç continua viva: no dialeto eólico, no qual, todavia, ela absolutamente não significa “membro” Os comentários ao verso acima citado11 já o demosntram, o que nos faz deduzir que, para Safo e A lceu péGoç tivesse o significado; de “rosto” 12 Sófocles (Antígona, 529), Eurípides (Hémeles, 1204) e Teocrito (29, 16) tomaram a palavra péGoç da lírica eólica com o signi­ ficado de “rosto”. Daí, já D ionisio Tràcio, com o vem os no escolio cita­ do, tira a conclusão de que, também em Homero péGoç teria o signifi­ cado de “rosto”, mas em oposição a isso, observou-se na Antigüidade que, em Homero, 'vj/'oxfl pode abandonar o corpo também através da

10. Apolônio, 138, 17: péGri xà jaéVri xou aójiaxoç; esc. II., XXII, 68: pé0r|8éxà Çcovxa jìéAr| Si’ cov péÇopiv xi.

1 1 . 0 escolio acima indicado continua: AioXeíç 8è xò 7tpóoco7tov (péGoç), Kai peGopaXiSaç xohç EÚrcpoaÓOTODç (paci.

12. Cf. Safo, fr. 33, e Ernest Diehl ; peGojiaXíç deve ter tido, portanto, o mesmo sig­ nificado de |xiAorcápeioç na irase de Teocrito: “Com a cara semelhante a uma maçã” Ver, além disso, o comentário de Pfeiffer a Calimaco, fr. 67,13.

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ferida. E não é fácil resolver o problema. Já que na Ilíada (XXII, 6 8) 13, como foi observado, vem os que Éh)póç sai pelos pé0rj, só que então a palavra deve ter o significado de \ié\r|, dado que, se for exata a inter­ pretação de “m ovimento” para a palavra 0opóç, esse m ovimento pode sair dos membros, mas não do rosto ou m esm o da boca. Mas na Ilíada, XVI, 856, fala-se, pelo contrário, de e, nesse caso, é natural que éla saia através da boca14 O problema resolve-se mais facilmente se pesquisarmos a época a que pertencem essas passagens da Ilíada. O trecho da Ilíada, XXII, 6 8, é, sem dúvida, recente15, com o m e dem ons­ trou E. Kapp, e provavelmente até derive de Tirteu. Quem o com pôs, portanto, não conhecia a palavra eólica pé0oç e, de modo geral, já não entendia bem a língua homérica. Encontrou na Ilíada os trechos (XIII, 671) “o 0\)p,óç logo se afastou dos membros” (jteXti) (XVI, 856), “a

\yx>%ij saiu voando dos p£0rj e foi para o Hades”, e, em conseqüência, estabeleceu a correspondência de 0upóç = yuxri e de piÃrj = pé0ri; em seguida, baseando-se em passagens semelhantes àquela a que nos re­ ferimos (V, 317) \u \ tiç... %ocãkòv évi gtt|0£0gi ßocÄcbv EK 0\)pòv eÃT|xai, formou desta maneira o seu verso: ènei ke t i ç òÇéi %aÃK(p TÍ)\j/aç qè ßocÄcbv p£0éoov ek 0upòv £Ãr|Tai. Se se quiser, porém, inter­ pretar o verso no sentido da língua homérica, obtém-se um resultado absurdo16 Também em outras passagens podemos ver que os signifi-

13. Sià yàp jTüKxripoov q axópaxoç éKrcvéopev (esc. B ad //., XXII, 68).

14. A palavra homéricapé0iy deveria, portanto, ser interpretada como “boca” ; está atestado que, para os poetas eólicos, páGoç = rcpoacorcov, mas não podemos prová-lo; a palavrapeGopaMç demonstra-nos, porém, a exatidão da interpretação e também Sófocles, Eurípides e Teócrito empregam a palavra péGoç para “rosto”. Otto Regenbogen {Synopsis,

Festgabe fü r Alfred Weber, 1949) interpreta novamente péGq como “membros”, sem levai*

em conta as razões aqui adotadas contra tal interpretação, mas prometendo tratar de novo e a fundo a questão. A dificuldade de explicar o plural pé8iq = boca, ao lado do singular péGoç = rosto, parece-me, em todo o caso, menor do que a que surge se interpretarmos péGq como “membros” Cf. M. Leumann, Homerische Wörter, 218 e s., e Eduard Fraenkel, “d o tta ”, 32, 1952, 33.

15. Wolfang Schadewaldt, Von Homers Welt, nota 1 da p. 238, erra ao afirmar que o interpolação só começa no v. 69.

16. É interessante notar que é exatamente dessa interpretação homérica que Crisipo se vale para demostrar que Homero já conhece a psicologia estoica; conclusão que ele extrai da frase: rcvEõpá éaxiv q y o x á Kaxà 7ravxòç oíkoõv tó acopa (esc. B, à IL, XVI, 856; cf. também o escolio acima citado na //., XX, 68: Seíicvoai 5è Kaxà navxòç pékooç xò Çcoxikòv Kai vjruxiKÓv èaxiv; sobre essa interpretação, cf., por exemplo. C ris., fr. 785, II, 218, V. Arn.: yuxú- Twsupa XeTrcopepéç èaxiv ôià rtavxòç ôifjKov xo\> èpyúxou acópaxoç). Esta servirá de base, portanto, para inteipretar-se o fr. 338 em Arnim. Também a etimologia: peörj xà Çcòvxa pé^q remonta certamente a Crisipo ou, pelo menos, tem relação com sua interpretação, na medida em que o queria demonstrar era justamente que pé0q tem o significado de membros viventes. Se o trecho, como ficou demonstrado, não fosse recente, deveria ser corrigido, colocando-se peXéov em lugar de peGécov.

12 A CULTURA GREGA E AS ORIGENS DO PENSAMENTO...

cados de ©upóç e de \jro%f] são amiúde confusos. Na / liada (VII, 131 )Jf temos: 0\)fiòv ãnò jte^ecdv 8b voa Sópov5' AiSoç eÍgcd, ou seja, “o ÔUjiòç! foi-se dos membros (péXri) para o Hades”. Já de há muito se tem obseríj vado17 com o uma contradição em relação às concepções homéricasj dizer que o 0t>pòç vai para o Hades. O verso sofre a influência passagem XIII, 671 e s. cokcx 8e Gupòç ànò pe^écov e III, 322: xòv’

Sòç à7io(p0ípevov Sbvoa Sópov’' AiSoç Eíaco. É possível que também; essa alteração seja atribuível a um poeta tardio desconhecedor da lín< gua homérica. Mais provável, porém, é que, aqui, a alteração se deva a' um rapsodo, o qual, com o acontece na tradição oral, tenha confundidoú na mente um amontoado de vários fragmentos de versos. Teríamos' então de corrigir o verso, e poderíamos facilmente, na verdade, pôr> tudo em seu devido lugar, valendo-nos de outro fragmento de um ver­ so de Homero: com base no trecho XVI, 856 - XXII, 362, reconhece-, mos com o válido e exato o significado do verso: 8’ èK peOécov TCTOtpivrf A i8ó g8e ßEßr|KEi. Segundo esse trecho, pode-se reconstruir o verso VII, 131: \|/d%t]v ek pE0ácov 8bvoa Sópov’' A i8oç eígco. Restam ainda a ser considerados alguns pontos nos quais o 0t>)ióç é a alma do morto e onde se diz que o Gupóç saiu voando no momento da morte18

mas trata-se sempre da morte de um animal, de um cavalo (//., XVI, 469), de um cervo (Od., X, 163), de um javali (Od., XIX, 454) e de uma pomba (//., XXIII, 880). Trata-se aqui, sem dúvida, de uma ima­ gem derivada. N o homem, é a que foge, mas é evidente que a um animai não se poderia atribuir uma \j/d%t|; e assim se achou para ele um Gd j i ó ç que o deixa no momento da morte. A isso ter-se-á chegado por afinidade com aqueles trechos onde se diz, numa referência ao homem, que o 0t>póç abandona os membros e os ossos.

Por outro lado, essas passagens que falam do Gopóç dos animais- terão contribuído para aumentar a confusão entre os conceitos de Gupóç e Mas se a expressão “o Gopoç saiu voando” aparece quatro vezes, e portanto, de maneira relativamente freqüente, sempre relacionada, po­ rém, a animais, e a animais sempre diferentes, isso demonstra que nos primeiros tempos as duas palavras não eram usadas indistintamente.

Portanto, xj/dx^I e ôopóç são, pelo menos no primeiro momento, claramente distintas. É impossível determinarmos com a mesma preci­ são os limites entre Gupóç e vóoç. Se, com o ficou dito, Gupóç é aquele órgão da alma que suscita as em oções e vóoç o que percebe as imagens, então vóoç é, de modo geral, a sede do intelecto, e Gujióça das emoções. N o mais das vezes, porém, os dois significados são confundidos. Nós, por exemplo, consideramos a cabeça com o sede do pensamento, o cora-

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