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OCASO DE VIDA EM CRIANÇA E ADOLESCENTE EM UNIDADES DE CUIDADOS CRÍTICOS: IMPLICAÇÕES ÉTICAS À ENFERMAGEM

No documento ANAIS SEMINARIO BIOETICA 21 12 (páginas 189-193)

SANTA MARIA: DADOS PRELIMINARES

48. OCASO DE VIDA EM CRIANÇA E ADOLESCENTE EM UNIDADES DE CUIDADOS CRÍTICOS: IMPLICAÇÕES ÉTICAS À ENFERMAGEM

Vania Marta Pradebon2

Dolores Reginato Chagas3

Suzinara Beatriz Soares de Lima4 Descritores: Enfermagem Pediátrica; Assistência Paliativa; Ética em Enfermagem.

INTRODUÇÃO. Falar em morte e pensar no direito das pessoas morrerem em paz quando se exerce uma profissão que seu fulcro é exatamente o oposto, ou seja, o de preservar a vida é, no mínimo, antagônico, concorrente e complementar (MORIN, 1982). Paradoxal! Porque no cotidiano laboral dos trabalhadores de saúde referente a crianças e adolescentes em fim de vida, observam-se alguns dilemas éticos, como os de assistência paliativa promotoras de intervenções que podem fomentar o desrespeito e ferir a dignidade humana destas pessoas, quando em processo de ocaso de vida, não ficando o Enfermeiro e demais profissionais da Equipe Infanto-Juvenil incólumes a estas ações. Assim, o OBJETIVO deste excerto é refletir com profissionais e graduandos em enfermagem sobre as intervenções de enfermagem promotoras, ou não, de dignidade humana às crianças e aos adolescentes em situação de terminalidade de vida, internados em Pronto Socorro Pediátrico (PSP) ou em Unidades de Terapia Intensiva Pediátricas (UTIP), inclusas também as neonatais, visando aclarar as contradições e suas implicações éticas no processo de morte e morrer infanto-juvenil. DESENVOLVENDO o texto. Nesta ótica, discutir sobre questões éticas no campo da saúde parece complexo (MORIN, 2000) e inacabado uma vez que se relaciona à compreensão das dimensões que o vocábulo assume em termos de sua origem, semântica e significados filosóficos adquiridos no passar dos tempos em sua conceptualização e na (in)evolução histórica da humanidade em geral, buscando-se, neste caso, autores contemporâneos, como Schramm (1996), que contextualizando sobre a temática afirma que o “aspecto ético é relativo às relações humanas, às condutas necessariamente inscritas nas relações com o ‘outro’, qualquer que seja a entidade concreta (ou imaginária) ocupante deste lugar – humano, outro ser vivo, biosfera...” (p. 17). Todavia, compreende- se ética a partir da definição de Souza e Goldim (2008, p. 2), ou seja, “ética é a construção do sentido da vida humana desde o encontro com o Outro”. Assim, emergiram as seguintes indagações: qual é o sentido da vida humana quando o Outro está com agravos no seu processo de saúde-doença e, por conseguinte, coloca-o em circunstância de terminalidade da vida? Especialmente, se este Outro for uma criança ou um adolescente? Como agir? A morte infanto-juvenil, para grande parte dos trabalhadores do campo da saúde, apresenta-se como um fracasso profissional. Nesse enfoque, colabora Hoffmann (1993, p. 364) ao dizer que: “a morte na infância é revestida de especial       

1 Modalidade: Reflexão Teórica no Ensino-Serviço.

2 Enfermeira. Mestre em Enfermagem pela UFSC. Enfermeira do Pronto Socorro Pediátrico do HUSM/UFSM. Profª da Disciplina Saúde da Criança e do Adolescente, na URI/Campus Santiago- Brasil.

3 Enfermeira. Mestre em Enfermagem pela UFSC. Enfermeira do Pronto Socorro Psquiátrico do HUSM/UFSM. Profª da Disciplina Saúde Mental e Enfermagem Psiquiátrica, na URI/Campus Santiago-Brasil.

crucialidade” e, “a maioria das pessoas assume uma dificuldade maior em relação à morte da criança” (p. 367), visto que a representação social, no ocidente, é de que o natural é os pais morrerem antes que os filhos. Às crianças e aos adolescentes é esperado e desejado que realizem seus sonhos e projetos de vida, cumpram seu ciclo vital; além disso, cada vez que uma criança ou adolescente morre, infalivelmente deparamo-nos com a condição inexorável de seres finitos e, que, portanto, as crianças e adolescentes com as quais se tem relações parentais e ou afetivas também são mortais, havendo possibilidade de morrerem antes de nós, (pré)ocupando-nos e nos trazendo sofrimento. Nessa linha pensamento, o cotidiano laboral da UTIP e do PSP é um cenário de contradição de onde emergem a autonomia ou alienação dos sujeitos, o que permite considerar que o conflito ético pode ser negado ou desvelado. Pois, no vivido, as tensões decorrentes das pressões que a equipe de saúde sofre para alcançar desempenho individual ou coletivo eficiente, eficaz, resolutivo, aliados às repetidas perdas ou “fracassos” - de modo geral, morte, no contexto destas unidades, costuma ser sinônimo de perda e falha - desencadeiam dúvidas, incertezas, estranhamentos, sentimentos controversos, questionamentos éticos relevantes, que, na cotidianidade, não recebem a atenção necessária, as quais tornam a UTIP e o PSP lugares férteis para que atitudes desumanizadas aflorem e se proliferem (PRADEBON, 2002). Então, é usual interrogações como: qual é o limite de respeito que os profissionais de enfermagem e os demais profissionais de saúde devem guardar sobre as decisões (ou indecisões) que os pais (ou seus responsáveis) tomam, particularmente, em relação aos bebês e lactentes internados em unidades críticas? Até que ponto, deve-se respeitar as crenças, valores, costumes, hábitos, que eles cultivam em relação a essas crianças as quais, ainda, não possuem capacidade para tomada de decisão, por ser inerente ao seu período de crescimento e desenvolvimento? É ético impor uma terapêutica à criança, ainda que contrária à vontade dos pais? Por outro lado, é ético os pais recusarem tratamento para seu filho se ele poderia propiciar melhora às condições de vida da criança (op. cit.)? Nesse caso, como fica o respeito à autonomia dos pais, princípio tão defendido pela bioética (KOTTOW, 1995)? Se for ético, é legal? A legislação do país acompanha o avanço da ética aplicada, que é a bioética? E quanto a nós, trabalhadores da equipe de enfermagem – assistenciais e ou docentes - que postura adotar nessas situações? Assumir a defesa da criança, ou respeitar a decisão autônoma dos pais e familiares, ainda que contrária a de toda uma equipe de saúde? Em contrapartida, quando o indivíduo está na condição de paciente terminal, é ético os profissionais das equipes da UTIP, neonatal e do PSP manterem uma criança ou um adolescente ligado e dependente de equipamentos, de tecnologias indefinidamente, para a manutenção do seu corpo físico-biológico? “Não haveria (...) contradição entre quantidade e qualidade de vida (MORIN, 2005, p. 51)”? Será essa, uma vida digna para o paciente e para sua família? Mas, de fato, o que seria uma vida digna? Pois, têm-se conhecimento que com a evolução dos aparatos tecnológicos e das técnicas do intensivismo pediátrico se tornam múltiplas as possibilidades de se interferir no curso da vida humana. Essa concepção remete a outras indagações, dentre elas: os profissionais da UTIP, da neonatal e do PSP estão preparados para possibilitar que crianças e adolescentes tenham uma morte digna? O que é ter uma morte ou morrer com dignidade no curso deste ciclo vital? Interrogações dessa natureza

ocorrem, com freqüência, nestes cenários. Todavia, como a equipe de enfermagem atua em um contexto desfavorável à reflexão, torna-se superficial, simplista, até alienada e, muitas vezes, incapaz de refletir sobre as suas ações e, também, em relação à necessidade de participar e contribuir ativamente para as transformações que a profissão e a sociedade exigem na contemporaneidade, porque a partir de reflexões grupais podem surgir soluções melhores para situações tão complexas como as que envolvem a terminalidade da vida infanto-juvenil. Por outro lado, a obstinação terapêutica ou distanásia é entendida como as possibilidades da equipe, no campo da biomedicina, “iniciar e ou manter um conjunto de intervenções sem aparente vantagem para a pessoa e que poderão comprometer a sua dignidade” (MARQUES; VIEIRA, 2007, p. 47). Ainda, neste exercício reflexivo, cabem outros questionamentos, no sentido de se pensar quais intervenções não preservariam a dignidade da pessoa? Ou, “em que momento a ação terapêutica intensiva se torna obsessão terapêutica, deixando de respeitar o sofrimento para respeitar somente a vida bruta” (MORIN, 2005, p. 51)? Notadamente, há possibilidades de todas as disciplinas que integram a biomedicina, tanto no ensino como nos serviços de saúde, concretizar ações de desrespeito e desconsideração à pessoa, visto que conforme Marques e Vieira (2007) o conceito de dignidade “encerra estima, consideração, respeito pelos direitos individuais fundamentais da pessoa humana” (p.47). Então, o trabalho em equipe, a manutenção da esperança, a competência profissional no tratamento e alívio da dor, a valorização dos cuidados básicos, que podem minimizar dúvidas, angústias (op. cit.), incertezas, áleas dos profissionais influenciam na preservação da dignidade humana da pessoa em circunstância de ocaso de vida. FINALIZANDO, pode-se dizer que tudo o que se deseja é que o evento de fim de vida de crianças e adolescentes não seja jogado no limbo, que os trabalhadores da saúde não se empenhem em mantê-lo nas adjacências, nas áreas sombrias do cotidiano laboral, que eles, trabalhadores, também possam desvelar seus medos e angústias e livres apóiem as crianças ou adolescentes e seus familiares. Assim, o desafio dos profissionais da biomedicina, especialmente do Enfermeiro e da Equipe de Enfermagem, é conscientizarem-se de que a ciência pode ser eficaz na provisão de ferramentas tanto para o bem quanto para o mal. Que sua utilização está sujeita ao refletir-saber-fazer humano, pois ela fomenta as tecnologias e os processos técnicos, que dependendo do seu uso, ora dignificam a pessoa, ora a desrespeita, a desumaniza e a desconsidera, como é o episódio da criança e do adolescente em condição de fim de vida, quando submetidos a terapêuticas e procedimentos considerados fúteis ou inúteis, como no teatro da reanimação cardiopulmonar (PRADEBON, 2008), os quais apenas prolongam seu sofrimento e o de suas famílias. Neste enfoque, há que se respeitar muito a vida para se dignificar a assistência paliativa e a morte infanto-juvenil.

REFERÊNCIAS

HOFFMANN, L. A Morte na Infância e sua Representação para o Médico: Reflexões sobre a Prática Pediátrica em Diferentes Contextos. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, V. 9, nº 3, p. 364- 74, jul/set, 1993.

MARQUES, P; VIEIRA, M. Princípios éticos gerais no agir em enfermagem: condicionamentos às intervenções de enfermagem promotoras de dignidade das pessoas em fim de vida, internadas em unidades de cuidados intensivos. Bioethikos, Centro Universitário São Camilo, V. 1, nº 2, p. 45-55, 2007.

MORIN, E. Ciência com Consciência. Portugal: Europa-América, 1982 (Coleção Biblioteca Universitária, n. 32).

_____. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro. 2 ed. São Paulo: Cortez; Brasília: UNESCO, 2000.

_____. O Método 6: ética. Porto Alegre: Sulina, 2005.

PRADEBON, V. M. O Cotidiano da Chefia de Enfermagem da Unidade de Tratamento Intensivo Pediátrica: que Trabalho é Esse? Dissertação de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem. UFSC. Florianópolis/SC, 2002.

_____. Criança e Adolescente em Fim de Vida: implicações à enfermagem infanto-juvenil. Trabalho apresentado à Disciplina Ciência e Sociedade, Universidad Tres de Febrero. Buenos Aires, 2008. (mimeografado).

SCHRAMM, F. R. A Terceira Margem da Saúde: ética natural, complexidade, crise e responsabilidade no saber-fazer sanitário. Brasília: UnB, 1996.

SOUZA, R.T; GOLDIM, J.R. Ethics, genetics and pediatrics. Jornal de Pediatria, Rio de Janeiro, V.84, nº 4 (sup.), p. 2-7, 2008.

49. PARTO CESÁREO DESNECESSÁRIO – UM PROBLEMA DE SAÚDE

No documento ANAIS SEMINARIO BIOETICA 21 12 (páginas 189-193)

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