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SOFRIMENTO PSÍQUICO NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

No documento ANAIS SEMINARIO BIOETICA 21 12 (páginas 101-105)

12 A SAÚDE E O TRABALHO NO CONTEXTO DA PRÁTICA DE UMA EQUIPE DE ENFERMAGEM DE PRONTO-SOCORRO 1

22. SOFRIMENTO PSÍQUICO NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

Dolores Reginato Chagas2 Vania Marta Pradebon3

Suzinara Beatriz Soares de Lima4 Descritores: Estresse psicológico; Psicotrópicos; Depressão.

INTRODUÇÃO: Neste texto, procuramos abordar as questões da mente e da neurociência, mais especificamente sobre a depressão, considerada a “doença do século XXI” considerando a questão ética do profissional que atua na área que esta diretamente ligada às relações humanas e suas condutas. Para realizar esta breve reflexão sobre o fenômeno “depressão” na contemporaneidade e sua medicalização, adotamos como base algumas concepções da ciência biomédica, psicanálise e psicologia. OBJETIVO: ampliar a compreensão sobre o sofrimento psíquico na pós-modernidade e as conseqüências para a subjetividade humana. DESENVOLVIMENTO: Ao pesquisar o assunto verificamos um arsenal teórico sobre depressão e a condição de sofrimento psíquico na atualidade. Ao mesmo tempo, assistimos as repercussões das pesquisas do paradigma naturalista-biologicista proporcionadas pelo avanço da neurociência e um elevado investimento tecnológico na indústria farmacêutica, decorrendo na biologização do comportamento e da medicalização da afetividade. Igualmente, encontramos reflexões teóricas que criticam ou defendem o uso de fármacos antidepressivos; por vezes, discussões sobre os efeitos controversos destes para a subjetividade humana. Nesse contexto, Dantas e Tobler (sd) avaliam que pesar do progresso tecnológico e científico e de todas as tentativas da sociedade contemporânea em escondê-lo, camuflá-lo ou banalizá-lo, reduzindo-o a uma circunstância particular, relativa, transitória e mesmo vergonhosa e inaceitável, o sofrimento psíquico segue se constituindo como uma experiência presente, inquietante e até mesmo lucrativa. De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) citado por Baptista (2004), a depressão responde por 12% do total de afastamentos de atividades profissionais e educacionais em todo o mundo. Desta forma, a depressão é considerada a principal causa de incapacitação, além disso, é responsável por um considerável impacto econômico nas sociedades. Neste sentido, O Global Burden of Disease Study de 1990, estudo realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre o impacto das doenças globais, classificou a depressão como a quarta doença que mais causa incapacidade, por meio da avaliação dos anos de vida perdidos. Estima-se, também, que no ano de 2020, esta se posicione em segundo lugar, só sendo superada pelas doenças cardiovasculares. Quanto a epidemiologia do transtorno depressivo, Kaplan e Sadock (1997), classificam-no como um transtorno comum, com uma prevalência durante a vida de cerca de 15%, talvez, até 25% em mulheres. A incidência da depressão também é mais alta que a habitual em pacientes de clínica geral, nos quais chega a 10% e em pacientes internados por motivos médicos,       

1 Modalidade: Reflexão Teórica no Ensino-Serviço.

2 Mestre em Enfermagem pela UFSC. Enfermeira do Pronto Socorro Psiquiátrico do HUSM/UFSM. Profª da Disciplina Saúde Mental e Enfermagem Psiquiátrica, na URI/Campus Santiago-Brasil.

3Enfermeira. Mestre em Enfermagem pela UFSC. Enfermeira do Pronto Socorro Pediátrico do HUSM/UFSM. Profª da Disciplina Saúde da Criança e do Adolescente, na URI/Campus Santiago- Brasil.

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nos quais aproxima-se a 15%. Salkovskis (1997) afirma que em qualquer ponto determinado do tempo, 15 a 20% dos adultos sofrem níveis significativos de sintomatologia depressiva. Pelo menos 12% experimentam a depressão num grau suficiente para pedirem tratamento em algum período em suas vidas, e se estima que a depressão responda por 75% das internações psiquiátricas. De acordo com o Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (DSM IV, 1994) os principais transtornos depressivos (unipolares) são: a depressão maior e a distimia. O transtorno depressivo maior caracteriza-se por um ou mais episódios depressivos maiores, isto é, pelo menos duas semanas de humor deprimido ou perda de interesse, acompanhados por pelo menos quatro sintomas adicionais de depressão que são: perda ou ganho significativo de peso; insônia ou hipersonia; agitação ou retardo psicomotor; fadiga ou perda de energia; sentimento de inutilidade, culpa excessiva ou inadequada; capacidade diminuída de pensar ou concentrar-se, indecisão e pensamentos de morte recorrente. A distimia, ou transtorno distímico, caracteriza-se por pelo menos dois anos de humor deprimido na maior parte do tempo (em crianças e adolescentes a duração mínima é de apenas um ano), acompanhado por sintomas depressivos adicionais que não satisfazem os critérios para um episódio depressivo maior. A depressão pode ser analisada do ponto de vista de três teorias diferentes, conforme Parma (2000): no caso da visão psicanalítica, a depressão costuma conceber-se como uma experiência de perda afetiva inconsciente frente a qual o paciente reage com as mesmas emoções que em face de perdas anteriores em sua vida; dita perda inconsciente pode ter uma natureza muito diversa, fracassar no ganho de uma necessidade afetiva ou no de um ideal do eu mais ou menos inconsciente. O tratamento teria como fim trazer à luz esses fatos para desativá-los afetivamente. Sob o enfoque cognitivo comportamental, a depressão está associada a modos errôneos de pensar que a pessoa depressiva adquiriu ao longo da sua vida, e que lhe levam a interpretar as vivências afetivas de um modo que lhe conduz reiteradamente à depressão. Desta forma, o trabalho da terapia será reeducar o paciente e fazê-lo compreender as suas falhas cognitivas, isto é, os seus modos anômalos de pensar, para substituí-los por outros não depressivos. E uma terceira visão está fundamentada na psicobiologia, sendo assim, a depressão é concebida como uma conseqüência de alterações nos neurotransmissores cerebrais. O tratamento neste caso é com antidepressivos, dada à evidência de que estes psicofármacos agem normalizando o funcionamento da função cerebral. Desta forma, ao longo do século XX, profundas mudanças ocorreram na área da saúde, com reflexos diretos em todos os campos da medicina, quando a psiquiatria ocupou um lugar de destaque pela introdução de novas e potentes substâncias apresentadas como “novos milagres” para cura ou controle de várias formas de distúrbios mentais e/ou do comportamento. Todavia, o tratamento com psicofármacos só existe há pouco mais de 50 anos, antes o tratamento para os males da mente era utilizado técnicas terapêuticas como: confinamento, lobotomia, eletroconvulsoterapia (ECT), insulinoterapia, entre muitas outras, além da ampla utilização das psicoterapias e psicanálise. Assim, a ampla adesão aos psicofármacos, foi fundamental para a expansão da indústria farmacêutica, uma vez que ela direciona seu marketing de vendas não só aos médicos responsáveis pelo conhecimento e prescrição da medicação, mas também, ao público em geral que, a partir do “esclarecimento” dos sintomas apresentados nas

propagandas dos medicamentos poderiam se tornar consumidores potenciais da mercadoria. Os anúncios dos medicamentos, protagonistas desse processo, associam imagens de bem-estar, alegria e sociabilidade aos seus produtos. Trabalham com as expectativas e o imaginário social que são atravessados pela crença da “cura” para seu sofrimento psíquico. Sobre a medicalização do sofrimento, diversos estudiosos das ciências da saúde e sociais alertam para o poder da industrialização farmacêutica que, com campanhas de marketing, transmitem a idéia de que seus medicamentos são capazes de resolver todos os problemas e dificuldade das pessoas. Vale lembrar que os psicotrópicos têm o efeito de normalizar comportamentos e eliminar os sintomas mais dolorosos do sofrimento psíquico, sem lhes buscar a significação. No entanto, Bezerra (1989) explica que a medicação pode ser necessária em alguns momentos, principalmente quando tem uma função de ajudar o sujeito a retomar as rédeas de sua existência ou para corrigir estados ou funcionamentos físicos, porém, salienta que não tratamos de cérebros, e sim de sujeitos. Para Kelh (2008), do ponto de vista da psicanálise, a depressão resulta do empobrecimento da vida psíquica, sobretudo no que se refere ao enfrentamento de conflitos, e o abuso de soluções medicamentosas acaba por ser cúmplice deste encolhimento subjetivo. CONCLUSÃO: Por conseguinte, o avanço mercadológico dos antidepressivos não corresponde a uma diminuição dos casos de depressão. Bem ao contrário: a supressão química do sujeito do inconsciente só faz aumentar o mal-estar. A introspecção, a tristeza, o recolhimento, a contemplação – a vida do espírito, enfim – são desvios que atrapalham o rendimento de uma vida, cuja qualidade se mede por critérios de eficiência, competência e disponibilidade para o entretenimento. Assim, tanto a crise ética quanto a depressão (sintoma emergente do mal-estar contemporâneo) deve ser considerada como a perda do sentido da vida, no mundo atual, diante das demandas de sucesso e eficácia que assolam nossas vidas. Portanto, considerando as diferentes concepções sobre depressão, existem inúmeras alternativas de tratamento, seja a opção pela mais avançada tecnologia, aqui incluído o arsenal psicofarmacológico, ou pela compreensão das relações conflituosas e inconscientes por meio das psicoterapias, ou até mesmo recorrendo ao misticismo de todo gênero no qual podemos citar oráculos, terapias alternativas, duendes, cristais e manuais de auto-ajuda (CHAGAS, 2008). Em fim, o homem busca constantemente soluções para seus problemas existenciais e suprimir o sofrimento psíquico.

REFERÊNCIAS

BAPTISTA, M. N. Depressão: histórico, epidemiologia, fatores de risco e modelos integrativos. In: __________, M. N. Suicídio e depressão: atualizações, São Paulo: Guanabara Koogan, 2004.

BEZERRA Jr., B. “A subjetividade moderna e o campo da psicanálise”. In:___________ Freud 50 Anos depois. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1989.

CHAGAS, D. R. Sofrimento psíquico na sociedade contemporânea. Trabalho apresentado à Disciplina ciência e sociedade. Buenos Aires, 2008. (mimeografado).

DANTAS, M. A., TOBLER V. L. O sofrimento psicológico é a pedra angular sobre a qual repousa a cultura de consumo. Disponível em http://psicologia.com.pt/artigos/ver_artigo.php?codigo=A0175. Acessado 22/12/2008.

DSM-IV. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. Porto Alegre: Artes Médicas, 2004.

KAPLAN, H.I, SADOCK, B.J. Compêndio de psiquiatria. 2 ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

KEHL, M. R. Antidepressivos, graças a Deus. Disponível em: http://clinicaampliada.blogspot.com/2008/04/antidepressivos-graas-deus-maria-rita.html. Acessado em 18/12/2008.

PARMA, C.B. A depressão. Disponível em http://adepressao.wordpress.com. Acessado em

12/12/2008.

SALKOVSKIS, P. M. Problemas somáticos. In: HAWTON, K., SALKOVSKIS, P. M. Terapia Cognitivo-Comportamental para Problemas Psiquiátricos: Um Guia Prático. São Paulo: Martins

23. STRESS E PROFISSIONAIS DA SAÚDE: A PRODUÇÃO DO

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