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Escala entre Não-actuação e Actuação

III. ENQUADRAMENTO TEÓRICO: RAÍZES DO TEATRO SOCIAL

3.3. Animação Teatral

3.3.4 Métodos e Técnicas em Animação Teatral

Os formatos em AniT são variados: desde a oferta de espectáculos oferecida por companhias e profissionais de teatro, à criação de ateliers de teatro e jogo dramático,

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Em certa medida, aproxima-se do programa de intervenção teatral feito pelas companhias de “Theatre in Education”, do mesmo período, em Inglaterra.

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Um movimento internacional que uniu os esforços francófonos e portugueses foi o ASSITEJ (Associação Internacional de Teatro para a Infância e Juventude) que, infelizmente, devido à falta de suporte financeiro e ao fim de 20 anos de vida, foi forçado em 2008 a terminar a sua tarefa. Tinha como marco a organização bi-anual do Encontro de Teatro para a Infância e Juventude, tendo sido um importantíssimo contributo para o desenvolvimento e afirmação do teatro para a infância.

passando por eventos que implicam a participação do público, numa atmosfera lúdica, com propensões ritualistas e de festa.

O foco de destinatários em AniT incide nas populações desfavorecidas e noutros ciclos que se encontram descompensados quanto a uma participação activa, criativa e expressiva na esfera pública. Esta postura tem como consequência a dissipação do mito de que uma arte só pode ser exercida por especialistas. A sua abordagem localiza-se sobretudo na criação e na dinamização. A intervenção realiza-se em diferentes contextos desde a comunidade em geral até instituições específicas, com especial incidência nas escolares.

Existem várias propostas de jogo teatral que seria exaustivo apresentar aqui e que variam consoante os contextos, intenções e objectivos com que são realizadas. No entanto, em traços gerais, as técnicas e os conteúdos mais divulgados são os seguintes:

– A utilização e exploração das capacidades vocais (respiração, ressoadores, imaginação vocal, coro).

– A dramatização (relaxamento da tensão muscular, ritmo do gesto, relação com o centro, domínio do corpo, dos sentidos, ginástica criativa, arquétipos e tipos fixos, movimento, observação, concentração, estímulo e dinâmica de grupo, domínio e consciência do corpo e do espaço, improvisação, tempo e ritmo, jogo dramático, desenvolvimento lúdico, jogo de narradores, conflito, intensidade em crescendo e diminuendo, cumplicidade e contracena dramática, épica animal, análise do texto, pantomina).

– A metodologia (Copeau e a escola francesa, Brecht, Meyerhold, Boal). (Ventosa, 2006)

Intervenção em Contextos Específicos

A AniT e o processo de como que é construída envolve outras áreas de expressão que não apenas o teatro, onde é fundamental a exploração de materiais e consequente concretização das imagens ficcionais geradas pela descoberta. É utilizado o teatro de figuras com marionetes, objectos, artes figurativas, trabalho criativo, ginástica criativa, narrativas, jogos criativos, fotografias, entre outros indutores, sempre com fins expressivos e privilegiando o acto comunicativo entre protagonistas e espectadores.

Por oposição às habituais recitações de final de ano, uma das linhas promove um conjunto de improvisações onde a criança/ jovem está “genuinamente” envolvida, já que as situações surgem em grande parte do seu universo experiencial e imaginário infantil, que ela

mesmo constitui em linguagem teatral e parateatral, estimulando a autonomia de acção sem o tradicional domínio e intervenção do adulto sobre os resultados; procura-se que o protagonismo se centre na criança/ jovem e na possibilidade de dar a conhecer o seu mundo e a sua percepção do meio envolvente, dentro dos códigos de representação que lhe são familiares. Muito em comum com o movimento de Teatro Educação, centra-se também na dramatização para exploração de conteúdos didácticos de forma a que a assimilação de novos conhecimentos seja realizada de uma maneira lúdica associada à eficiência da aprendizagem (Pontremolli, 2005).

Em contexto comunitário, cedo a AniT entendeu que o teatro não dependia fundamentalmente de um texto e da sua encenação. Para tal, como já referimos, apropriou-se de um conjunto de processos e metodologias avançadas com o “68 do Teatro”, nomeadamente a ideia da não necessidade de especialistas para a execução performativa.

Compreendeu também que, para ser bem recebida, o público deveria ter realizado um percurso na arte dramática ou, a não existir tal percurso anterior, o público teria de ser iniciado com base no que é mais significativo em termos espectaculares e festivos nessa comunidade particular. Esta sensibilização reparte-se em, pelo menos, duas vertentes: levar o teatro às pessoas e as pessoas, especialmente crianças, experienciarem a expressão dramática. Ou seja, desvendar a teatralidade dos rituais existentes, dos eventos colectivos, dos marcos históricos que reforçam a identidade local. As estratégias para o fazer são das mais variadas, desde entrevistas feitas à população, ao levantamento de eventos do local, às pequenas intervenções-surpresa, de carácter lúdico, às passagens televisivas de eventos de AniT anteriores, à criação de oficinas de Teatro e Expressão Dramática num período de tempo limitado, à colaboração com a população local na preparação da dramaturgia e da encenação (Bernardi, 2005).

Para chegar a todos os habitantes, a AniT desenvolve uma sensibilização em diferentes locais que não apenas aqueles inicialmente previstos para a ocorrência do espectáculo. Assim, constrói produções de carácter itinerante, mas também adaptáveis a diferentes espaços (escolas, locais de trabalho, sociedades desportivas e recreativas), que a população tenha por hábito frequentar. O conceito do sujeito se deslocar ao local de acontecimento teatral é precedido pelo conceito do acontecimento teatral se deslocar ao local onde pode interpelar o sujeito. Este processo de “estranhamento” pela utilização espectacular de um local que está carregado de uma rotina e eventualmente apatia quotidiana65 favorece a

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queda de bloqueios para aceder a uma leitura simbólica de “o que é” uma realidade para “o que pode vir a ser” essa realidade. Coadjuvante a esta intervenção, pode existir um diagnóstico elaborado anteriormente com base em entrevistas à população e associações locais, que edificam o programa de intervenção (Perissinotto, 2004).

3.3.4.1 Renovação de Animação Teatral

Segundo Pontremolli (2005), a prática da Animação Teatral degradou-se pelas imposições institucionais, pela rotina que contagiou as intervenções, pela banalização das práticas e pela absorção das mesmas pelo sistema governativo. 66

Como vimos, a AniT procedeu à sua renovação, acrescentando às preocupações mais radicadas no Homem, na sua identidade cultural e no seu potencial criativo, outras de aprimoramento artístico na sua relação com o acto comunicativo e social. Nesta renovação, entre outras alterações de fundo, deixa de ser parte integrante de teatro “na” escola, para se tornar elo de ligação “entre” teatro e escola. A esta alteração segue-se outra que nos parece indicadora de uma transformação profunda: o termo animador social é substituído pelo termo operador social (Perissinotto, 2004). Esta alteração não é inocente e, se atendermos à análise de Bernardi, corresponde a uma mudança de paradigma. Bernardi é de opinião que o afastamento da utopia inicial de AniT como arte de emancipação lúdica do Homem representa o final “glorioso” da AniT que “afundou simultaneamente as duas utopias paralelas do panteatralismo, ou seja, a ideia da AniT como refúgio do teatro, e do panpedagogismo, ou a ideia da AniT como refundação da pedagogia.” (Bernardi, 2004: 45). No entanto, este autor admite que a AniT procurou novas vias muito profícuas no campo da investigação, do desenvolvimento da área e da vitalidade. Indica, então, que uma dessas vias é o Teatro Social, sendo que este reclama para si e renova as quatro fases com que iniciámos este capítulo e que caracterizaram a AniT nos anos 70, auge do seu dinamismo ideológico e prático.

Já Vieites (2000a), atento à necessidade de afirmação da AniT, afirma, por um lado, a sua diferenciação em relação à Animação Sociocultural, por outro, reflecte e teoriza sobre as matérias e os saberes que podem ser considerados os mais estruturantes na sua construção e afirmação como disciplina independente. Esta recente linha de AniT em Espanha coloca-se

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Pontremolli (2005) acrescenta que esse mesmo risco paira sobre Teatro Social.

num território suspenso, de transição entre uma perspectiva que encara a AT adjacente à Animação Sociocultural e outra que se inspira nesta, mas se autonomiza ao inscrever-se numa nova genealogia.

Notas Finais

Todos os modelos de intervenção de AniT, ao longo do seu percurso, foram a seu modo inovadores na época em que surgiram e souberam questionar-se para poderem evoluir. Foram inovadores nas formas de comunicação e nos temas, na intervenção social, na interpelação aos participantes e no seu envolvimento na ficção e acção, na exploração criativa, nas formas de abordagem aos locais de intervenção, nos próprios locais como espaços de comunicação privilegiados, no pensamento sobre o que é o teatro e para que serve. Enfim, na energia que tenta mobilizar e expandir seja ao fazer teatro, seja ao ver teatro, seja na transversalidade entre ambos, explorada sobretudo em Itália.

Por fim, realçando o exemplo português, Bento (2003) encontra um vasto território conceptual para a afirmação da Animação Teatral. Fragateiro (2000) entrevê o potencial de ampliação da área ao afirmar que:

“Uma prática teatral que aborde as temáticas de hoje, as grandes preocupações que nos atravessam a vida, questionando as diferentes áreas de saber, criando pontes, ligações, interferências entre esses saberes, provocando a emergência de outras ideias, tornando visíveis as descobertas tanto da ciência como da arte e experimentando as múltiplas possibilidades de utilização de tecnologias no desenvolvimento da comunicação humana e na emergência de uma cultura mundial.” (Fragateiro, 2000: 301)

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