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Escala entre Não-actuação e Actuação

Parte 1: Considerações sobre a Abordagem Metodológica a Adoptar 4.1 Natureza Dinâmica e Complexa do Estudo

4.4 Construção do Estudo

4.4.2 Recolha e Tratamento de Dados da Intervenção no Terreno

4.4.2.1 Instrumentos de Observação da Intervenção

A investigação da intervenção no terreno desenvolveu-se junto de um grupo de jovens da Escola de Ensino Secundário de Odemira, em meio rural. Incidiu na forma como foi operacionalizado o laboratório e desenvolvida a criação da performance em Teatro Social, como meio de criar um universo performativo significativo para o grupo de não-

performers, em termos estéticos ao nível individual, grupal e ao nível institucional. Tentou-

se também aferir se as linguagens performativas experimentadas colaboravam na resposta a necessidades verbalizadas, ou pressentidas.

Perspectiva Expressiva e Evocativa e Perspectiva Explanatória

Como já foi mencionado anteriormente, o texto que decorre da observação-acção é o resultado da subjectividade do seu autor e das intersubjectividades que se geram nesse contexto. Na realização do Diário de Campo, houve a intenção de elaborar um texto não só explanatório, mas também expressivo e evocativo (Thompson, 2008). Decidimos assim dividir essas duas perspectivas: por um lado, para criar um espaço sensível e flexível à emergência de variáveis subjectivas e não sacrificar algumas características do processo, do dinamismo das situações, do espírito das interacções e da apropriação embodied do projecto (impressões, dúvidas, correntes, entre outros que constituem “o quê” e o “porquê”); por outro, para oferecer uma visão mais pragmática de como o laboratório e a performance foram desenvolvidos (tipo de jogos, justificação de escolhas, entre outros que constituem o “como”).

O Cristal e as Categorias

Temos consciência de que, enquanto operadora/ investigadora em trabalho participatório, é impossível dar conta da totalidade da grande variedade de ocorrencias. É também verdade que uma análise que favoreça múltiplas perspectivas, valoriza a

complexidade contida nos processos performativos e relacionais. Daí termos optado por uma perspectiva em “Cristal” (Richardson e St. Pierre, 2005; Taylor, 2003), que inclui categorias como os Dados Contextuais, ponto de vista Ética e Política e o Desenvolvimento da Lógica do Teatro e da Dimensão Estética, que se apresentam nesta investigação como eixos importantes. Na análise do Diário de Campo, incluíram-se os indícios recolhidos no trabalho de terreno, que se nos afiguraram mais relevantes.

4.4.2.2 Instrumentos de Observação da Intervenção

Os instrumentos de observação utilizados para recolha de dados foram o Diário de Campo, os Questionários, complementados pelos testemunhos dos participantes e do professor.

Foi elaborado um Diário de Campo que contém a perspectiva da investigadora. Procedeu-se, no final do projecto, à distribuição e preenchimento de um questionário de escolha múltipla e à recolha de testemunhos no género de entrevista semi-estruturada após dois meses do terminus da intervenção, que contém a perspectiva dos participantes filtrada pelo tempo; não se procedeu a uma análise de conteúdo exaustiva dessas entrevistas, já que foram realizadas com o intuito de complementar os questionários. Foi realizada uma entrevista mais desenvolvida ao professor responsável da disciplina de Área de Projecto que acolheu a intervenção, e que foca uma variedade de aspectos, que oferece a visão do professor, ou a componente institucional.

O Diário de Campo, o questionário, a recolha de testemunhos e a entrevista ao professor continham duas intenções principais: a primeira, perceber se os objectivos gerais preconizados pelo TeS para os seus participantes tinham sido atingidos, destacando os momentos, ou situações mais significativas, ou, pelo contrário, destacando momentos, ou situações pouco interessantes; a segunda, aferir o equílibrio e justeza das ilações dos vários instrumentos de observação e do cruzamento entre eles.

Decidiu-se que as categorias que emergiriam da leitura dos textos é que constituiriam a base de estruturação da análise dos mesmos e não fazê-lo em função das categorias previamente delineadas. O encontro dos vários dados surge em Conclusão e na confrontação com os objectivos gerais do TeS.

4.4.2.3 Diário de Campo

No Diário de Campo expuseram-se alguns elementos fundamentais à construção do percurso. Deu-se também particular atenção aos elementos de desordenamento (que se distingue da desordem gratuita), capazes de provocar crises e rupturas e que se tornaram, consequentemente, geradores de alternativas satisfatórias, através do exercício de criatividade, de edificação de pontes e de novas perspectivas. O desordenamento vem associado à desorientação voluntária na tentativa de encontrar novos pontos de orientação que não estavam previstos anteriormente. Segundo Barba (2008), é nesta tensão entre ordem e desordem que se desenvolve a riqueza do processo criativo.

A desordem e a sua posterior reconfiguração é mais receptiva ao contributo de todos, sejam esses contributos intencionais ou não, com resultados em termos pessoais ou relacionais, com uma maior incidência no universo performativo, ou fora dele. A investigadora assumiu o detectar dessa latência de possíveis sem ter a certeza de que a sua interpretação tenha sido a mais correcta.

Já tivemos ocasião de expor algumas das dificuldades em assumir o duplo papel de investigadora e de operadora, já que por vezes ambos entram em conflito. O objectivo é não pôr em cheque as dinâmicas de grupo, nem os momentos onde a vertente intuitiva e criativa se sobrepõe à reflexiva. Como abreviação desta questão, optou-se por escrever o Diário sem grandes preocupações de retórica, favorecendo a escrita espontânea, mas que encerrasse diferentes significados, em vez de proceder a um relato já depurado em sentidos. Para assegurar que importantes detalhes não passavam despercebidos à investigadora, foi importante o contributo dos actores-motores presentes em cada uma das sessões, a troca breve de impressões após cada sessão e o ponto da situação que era realizado no momento de comunicação da estrutura da sessão seguinte. Foram também muito benéficas as várias conversas tidas com o professor já fora da sala de aula.

Resumidamente, o que se pretendeu registar no Diário de Campo foi o seguinte: – As condições que promoveram os espaços e ambientes para a ocorrência da

criatividade.

- A emergência de significados das acções e de insights, num processo de construção de performance de Teatro Social e de Dramaturgia da Comunidade.

– As tácticas que se seleccionaram como sendo as mais adequadas a um universo não-quotidiano onde coexiste o social, o cultural e o estético.

– A existência de espaços onde emergem a eficácia e o entretenimento.

– Os elementos geradores e que fazem sentido em termos individuais e de grupo, ou aqueles que são bloqueadores à sua progressão (ex.: indutores, preconceitos, acidentes, etc.). 137

– A relação entre a mudança e factores de raiz cultural.

– As mudanças e seus entraves nas percepções e nas redes de relações. – Os ciclos sociais atingidos.

– As alterações na instituição onde se desenvolveu a intervenção.

Para a análise foi utilizado o programa de computador NVivo8, já referenciado neste capítulo, para elação das categorias descritas no subcapítulo “Resultados do Diário de Campo” (ver pág. 305).

4.4.2.4 Os Questionários e a Recolha de Testemunhos

Procedeu-se à elaboração e aplicação de Questionários a serem preenchidos pelos participantes no projecto de intervenção. Esta recolha de dados foi complementada pelo registo em gravador de testemunhos de todos os participantes, de forma a colaborar como complemento das respostas aos questionários.

O questionário foi distribuído pelos onze elementos que participaram no projecto “Caleidoscópio”, com idades entre os 15 e os 16 anos, sendo dois elementos do sexo masculino e nove do sexo feminino. Um desses elementos apresentava necessidades educativas especiais. Os níveis utilizados nas respostas foram “Sim” e “Não”, ou “Muito”, “Em Parte” e “Pouco”. No final de cada grupo de questões, para confirmação da consistência da resposta negativa ou positiva, e de forma a propiciar um esclarecimento acerca do seu significado, foram elaboradas perguntas que apelavam a um pequeno desenvolvimento justificativo. Ainda para garantir a justeza das respostas, foram introduzidas em diferentes momentos do questionário perguntas de natureza idêntica que informam sobre a possibilidade de existência de contradições.

Quando a soma das percentagens apresentadas não atinge os 100%, pode ser devido a exclusão de respostas por terem sido consideradas inválidas.

Para aferir da correspondência aos objectivos gerais do projecto, nos moldes de intervenção de Teatro Social, o questionário inclui sete grupos de questões que indagam os

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participantes sobre: I) palavras-chave com que identificaram o processo; II) desenvolvimento do laboratório como espaço não-quotidiano e de relação entre estético, indivíduo e grupo; III) presença do enfoque em dados culturais e na identidade cultural; IV) existência da Dramaturgia da Comunidade e da lógica do teatro; V) empoderamento contido na acção performativa; VI) reconstrução de papéis dentro dos diferentes ciclos; VII) emergência do coro; VIII) Sugestões.

A recolha de testemunhos foi realizada dois meses após o terminus da intervenção. Seguiu-se um procedimento de tratamento de dados semelhante ao utilizado nas entrevistas. Sendo que, neste contexto, a análise foi bastante simplificada pela existência prévia de categorias e grupos de questões, decorrentes da análise aos questionários.

4.4.2.5 Ligação do Trabalho de Campo a Modelos de Investigação

Resumindo, o Estudo recai sobre a performance estética, o social e o cultural. Em termos de escolha epistemológica, temos a complexidade, o caos e criatividade, e os Estudos da Performance (Antropologia, Fenomenologia, Drama Estético, Drama Social, Espaço Liminal).

Em termos de metodologia de investigação e trabalho de campo, temos:

– A Etnografia da Performance, com base em Conquergood, de activismo e transformação social (Freire) com base na performance e a Investigação-Acção Participatória informada pelo humanismo.

– A investigação de carácter etnográfico, de prática criativa e de embodiment a partir dos processos que presidem aos universos criativos, ficcionais e liminais (Schechner).

Em termos operativos, as linhas de orientação resultam de:

– Lugones e a abordagem da comunidade pelo etnógrafo (“World Travelling and Loving Perception”).

– Conquergood e a ética, o perfil do etnógrafo (o que ele não deve ser) e a trajectória com três elementos que formam um circuito a partir do qual o etnógrafo se referencia a fim de identificar as etapas pelas quais o grupo “se transporta” e “se representa”. (Se é um etnógrafo convicto, com ideais e valores humanos na relação com cada um dos sujeitos e domina os procedimentos no terreno.) (Madison, 2005).

– Barba (2008) e os elementos de turbulência, que apoiam o investigador-participante e os participantes no processo criativo. (Se estão imersos num trabalho criativo e não na superfície do óbvio.)

– Finley e Denzin (2005) e a “Qualitative Research”. – Hernandez (2008) e a Investigação Baseada nas Artes.

– Bacon (2006) e técnicas e estratégias de imersão na prática criativa durante as sessões de trabalho, recolha e construção de “textos” de dados e de estruturas discursivas para dissertação final, nomeadamente através do conhecimento de jogos e alternativas que permitam recolher informação gerada em ambientes estranhos ao intelecto, ou ainda pelo domínio de multiliteracias, de princípios teóricos e pela capacidade de síntese.

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