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2ª Parte – Resultados

5.9 Resultados do Testemunho do Professor

5.9.1 Factores Éticos e Políticos

Recriação de Papéis

“Precisava de ter tempo para fazer este tipo de trabalhos com eles, (…) este tempo que nós não temos e acabamos por centrar tudo na nossa pessoa. Não é que eu goste deste método directo, expositivo, e por aí fora: é porque não há tempo para fazer aquilo, aquilo é que eu gosto e eles também.” (Arm 4)

O professor declarou que a relação com os seus alunos se tinha tornado mais próxima como consequência de ter participado – em acção – em algumas das sessões; se inicialmente teve algum receio em o fazer, devido ao inevitável contacto físico, desde muito cedo concluiu que as situações criadas não eram constrangedoras; antes pelo contrário, essa interacção transportou a uma maior abertura, facilitadora de diálogo e de cumplicidades. (Arm 1)

Realçou que o modelo de aprendizagem em vigor nas escolas não permite desenvolver este tipo de abordagens participatórias e criativas. (Arm 4)

Ponto de Vista da Instituição

“Não há distinção, (entre o papel de professor e o de operador): há complemento com papéis distintos e podíamos trabalhar em equipa melhor, (…) mas perfeitamente com estes papéis diferenciados: eu ocupo-me desta componente e tu ocupas-te daquela componente e funcionar em sintonia (…) Eu senti-me sempre bem com os papéis sem problema nenhum.”

(Arm 6)

Referiu que os objectivos e outros contornos da intervenção se inseriam bem não só em Área de Projecto, mas também no desenvolvimento de competências que são “transversais ao ensino secundário: não há nenhum programa que não trate a questão da cidadania apesar de ela continuar tão mal tratada e tão pouco exercida.” (Arm 5)

Notou que a apropriação do projecto foi gradual e que conseguiu reverter cada uma das suas etapas a favor da sua disciplina, sem nunca perder o fio condutor que dava

consistência à aprendizagem, como por exemplo a autonomia e a reflexão em relatório, autonomia essa que era já um dos enfoques do processo de Teatro Social. (Arm 4)

Não viu como limitação ao bom desenvolvimento da intervenção o pouco tempo disponível para participar nela mais activamente. (Arm 4)

Afirmou que distinguiu claramente entre as questões que dizem respeito à disciplina e aquelas que decorreram da implementação da intervenção e, como tal, simplificou o processo de avaliação sem solicitar o apoio da orientadora para o efeito. Para além disso, em termos institucionais, o não ter previsto alterar alguns critérios de avaliação da disciplina com uma maior antecedência poderia colidir com os procedimentos usuais.

Notou que, a determinada altura, a operadora foi encarada pelo grupo como um substituto do professor. (Arm 6)

Construção de Pontes

“O que eu quis foi que eles – e não foi fácil, mas conseguiu-se – que eles assumissem os projectos como deles, isto é que eu procurei, não lhes dar o pacote já feito.”

A determinada altura desconhecia qual era o objectivo último que a operadora pretendia atingir, mas que interpretou a sua não explicitação como uma tentativa para “(…) que eles pensassem, que chegassem lá sozinhos” e que sendo estes os termos que tudo correra bem. (Arm 3 e 4)

No que respeita à orientação das sessões, confessou que, a certa altura, estava um pouco crítico porque sentia que devia ser exercida uma maior exigência no cumprimento de compromissos, uma maior directividade. Mas, após conversa com a operadora, entendeu que essa atitude era intencional no esbatimento da perspectiva de autoridade entre a orientadora e o grupo e que esta não queria ver associado o seu papel ao do professor na turma.

Encontrou bastante espaço para a coexistência dos objectivos pedagógicos e didácticos do projecto na sua disciplina, com os objectivos artísticos e sociais da intervenção. (Arm 4)

Apontou o quanto os órgãos de gestão da escola são receptivos a projectos inovadores e o quanto facilitaram a criação de condições materiais e organizacionais para o bom andamento do mesmo, dentro dos trâmites institucionais a que é obrigada. Essa característica é tanto mais de louvar, quanto na realidade persistiram situações que são estranhas ao estabelecido nas normas escolares o que comprova alguma predisponibilidade

para a transgressão positiva (ex.: estarem num espaço sem a presença do professor “titular”). (Arm 5 e 6)

Gérmen de Sustentabilidade

“A escola tem que se abrir mais à comunidade e o nosso projecto educativo tem uma

vertente de que eu gosto muito, (…) é a escola como centro de cultura e a escola tem que se assumir como um meio promotor de cultura.”

Todos os participantes da intervenção criaram a necessidade (de se envolver em

projectos futuros). Um indicador dessa necessidade foi a vontade demonstrada em realizar

mais apresentações, nomeadamente no Cine Teatro de Odemira para o grande público, que afinal só não aconteceu pela recusa de um dos elementos do grupo. (Arm 3)

Está convicto de que o “salto” dos alunos foi enorme (…), sendo que, se houvesse ocasião de desenvolver mais outra sessão, não duvidaria que o envolvimento seria ainda superior. (Arm 6)

Emergência de Novas Perspectivas e Inversão de Clichés

Tem a certeza de que com o teatro há-de ser sempre diferente daqui para a frente. (Arm 3)

Emergência de Significados

Uma área que já tem mais dificuldade de aferir é se entenderam que, apesar da abordagem ter sido lúdica e criativa, os assuntos abordados foram sérios, que exigem uma visão crítica e uma renovação dos objectivos iniciais da disciplina de Área de Projecto: só a partir dessa renovação se poderia afirmar que a apropriação do projecto teria ocorrido, que eles o teriam assumido como seu e que são os seus verdadeiros autores. (Arm 2)

Está convencido que fizeram a associação entre o processo teatral e a cidadania, já que a própria construção incluía situações muito claras a esse respeito, sem que o tema estivesse explícito durante a performance; no entanto, já não é tão óbvio que essa percepção por parte da grande parte dos elementos do grupo venha a resultar em “novas formas de exercer a cidadania”. (Arm 2)

5.9.2 O Grupo

“Estes alunos têm um à vontade fantástico – que não tinham – e pensando donde virá

este à vontade, terá muito de vir daqui. Daqui não só pelas reapresentações em si (…) mas também por criar o espírito de turma. Se calhar até é mais importante isto do que o resto.”

Recriação de Papéis

Constatou que os alunos que passaram por esta experiência ganharam mais segurança na apresentação de trabalhos que até aqui não possuíam e que os diferencia dos restantes. Apontou o nome de um dos seus alunos como estando bastante diferente de anteriormente.

Emergência do Coro

Considera um resultado extremamente positivo o fortalecimento de laços que emergiu entre os vários participantes como turma. (Arm 1)

5.9.3 O LABORATÓRIO, a Dramaturgia da Comunidade e a

PERFORMANCE

“Portanto, criaste ali espaços e momentos fantásticos em termos de

comunicabilidade.”

Adequação de Tácticas Teatrais e Comunicacionais ao Grupo

Lembrava-se ainda de uma conversa informal, onde a orientadora tinha referido que assim (sem exercer a autoridade ou ser confundida com uma “professora”) procurava criar um bom clima, um maior espaço de comunicabilidade, uma relação mais aberta e uma clarificação de papéis; a directividade e o aumento de tensões contrariariam essas intenções e poriam em perigo o desenvolvimento da autonomia dos seus participantes. Daí que passou a valorizar a paciência com que por vezes a orientadora lidava com as situações e as contornava através de soluções de última hora para a continuação da sessão. Teve ocasião de testemunhar como assim se construíram afinidades também entre o grupo e ela. (Arm 3 e 4)

O seu interesse pelo processo manifestou-se não só em termos de resultados pedagógicos e didácticos, mas também pela curiosidade suscitada sobre as estratégias que abordavam o tema de origem: o apelo à reacção espontânea, o “brain storming” e a sua

posterior exploração na dramatização de situações. Esse foi o mote para que numa das aulas houvesse a oportunidade de abordar um determinado assunto de forma “descomplexada”, o que nunca tinha acontecido até aí. (Arm 2)

5.9.4 O Laboratório, a DRAMATURGIA da COMUNIDADE e a

Performance

A orientadora, em conversa informal, chamou a atenção para que o mais importante não era a memorização do texto e que o que resultasse dessas dificuldades, contrariedades e contributos é que constituiria de facto “a matéria” do projecto do grupo.

Afirmou que todos gostaram e que isso se pode confirmar pelo tipo de adesão e entusiasmo.

Comentário

Algumas características do professor, que permitiram o encontro de esforços, foram uma visão crítica, mas construtiva da escola, a convicção dos benefícios de um trabalho mais participado e envolvente. Ainda a convicção de que a instituição escolar deve estar mais aberta à comunidade e ser um gerador de cultura, foi um suporte para o diálogo entre a operadora e professor. É ainda de referir como facilitadora do processo a confiança depositada na orientação das actividades, bem como o seu interesse na exploração de capacidades do aluno, que normalmente não têm oportunidade de ser alvo no sistema de ensino.

Outro ponto bastante interessante foi o facto de o professor se referir ao estabelecimento escolar em termos de pessoas e não de instituição abstracta, o que denota a existência de vínculos saudáveis.

5.9.5 Fragilidades

A compreensão do papel da orientadora constituiu-se como um ponto frágil numa determinada fase do percurso. Os participantes, ao terem a percepção da orientadora como sendo “professora”, contrariaram alguns princípios de Teatro Social e do perfil do operador. No entanto, existem indícios de que esta visão sobre o seu papel foi transitória e acabou por

não provocar impedimentos a uma evolução saudável. Após pouco tempo, o trato tornou-se distinto daquele que preside às convenções tradicionais escolares.170

Não ficou claro até que ponto a necessidade de cativar a escola e o professor, utilizando os termos e a filosofia da instituição, quase que obrigaria a omitir os objectivos e abordagens de TeS, já que num primeiro momento pode ser interpretada como “agressiva” em relação aos moldes de funcionamento da escola. Essa “honestidade” ao desvelar os propósitos de TeS, pode ser um elemento de ruptura entre a escola e a intervenção, ainda antes de a instituição ter oportunidade de compreender – através da acção desenvolvida – o carácter pacífico, dialogante, de construção de pontes e reconstrução de papéis que a anima. Por exemplo, a abordagem da Cidadania na escola convencional é realizada de forma normativa e distante, enquanto em TeS a abordagem ao tema da cidadania de forma

embodied e com acções concretas, é um convite à transgressão e à revisão de perspectivas de

hegemonia.

Uma questão de fundo, que terá de ser acautelada numa futura ocasião e cuja falha deve ser imputada à operadora e não ao professor, foi a da distinção entre as questões que dizem respeito à disciplina e aquelas que decorreram da implementação da intervenção. Julgamos que uma demarcação clara entre a intervenção e a disciplina é artificial: atendendo à complementaridade da acção de TeS com a disciplina e o encontro de filosofias, esse tipo de procedimentos tem forçosamente influência, quer no andamento do projecto, quer nas expectativas objectivas e subjectivas que os participantes constroem acerca do seu impacto em termos de aproveitamento e de aprendizagem, quer em termos de mudança de imagem, quer ainda de valorização das suas capacidades performativas. A boa intenção do professor nesta questão ficou patente na resposta dada quando indagado em entrevista sobre o que distinguiria o papel do operador de Teatro Social do de professor, ao que conclui que não existe distinção, apenas complementaridade. Essa visão encerra um paradoxo: se, por um lado, admite uma complementaridade, que é positiva na construção de pontes e relações e agiliza o processo, por outro, deturpa a diferenciação existente.

170

Na realidade, ao final de poucas sessões, a totalidade dos participantes tratava-a pelo nome próprio e uma pequena parte tratava-a inclusivamente por tu; por coincidência (?) estes eram precisamente os dois elementos que se sentiam com menos cumplicidades dentro do grupo e que foram desde o início mais empenhados, entusiastas e co-participativos.

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