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113Nessa sentença hipotética, o estado ini-

A realização morfológica dos campos semânticos

113Nessa sentença hipotética, o estado ini-

cial GREEN está localizado no ponto (a), o estado final YELLOW no ponto (b) e a mu- dança de um para outro seria denotada por um sinal cujo movimento de trajetória é de (a) para (b). Conforme o asterisco indica, entretanto, essa sentença é agramatical na LSI. A agramaticalidade origina-se, primei- ramente, do fato que os estados iniciais e finais não podem ser localizados. Isso pode ser parte de uma restrição geral na língua em que somente expressões referenciais po- dem ser localizadas. Os estados nas senten- ças acima são predicados, não argumentos. Conseqüentemente, não são referenciais e, portanto, não podem ser localizados (Meir 2004). Qualquer locus-R estabelecido neste discurso seria interpretado como se estivesse associado à expressão referencial na senten- ça (LEAVES), ao invés de estar associada às suas propriedades. Além disso, visto que há somente uma expressão referencial na sen- tença, a mesma não pode conter dois loci-R, já que se espera que cada locus-R esteja as- sociado a um referente diferente. Portanto, um modelo espacial não tem a função de ex- pressar mudança de estado na LSI.

Como a língua expressa tais eventos, en- tão? Há duas possibilidades. Uma é utilizar o verbo BECOME/CHANGE-TO [tornar- se/mudar para]. O estado final seria expres- so como complemento do verbo e o estado inicial como um modificador do nominal que se refere à entidade sofrendo mudan- ça, como em (24). A segunda, é utilizar um modelo temporal, onde os estados finais e iniciais são marcados pelos advérbios tem- porais THEN [então] e NOW [agora], como em (25-26):

24. LEAVES GREEN CHANGE YELLOW [FO- LHAS VERDES MUDAM AMARELO].

‘The green leaves turned yellow’ [As fo- lhas verdes ficaram amarelas].

25. DOCTOR INDEXa THEN FAT NOW CHANGE THIN [MÉDICO INDICA-

DORa ENTÃO GORDO AGORA MUDA

FINO].

‘The doctor that used to be fat has become thin’ [O médico que costumava ser gordo ficou magro].

26. BOY INDEXa THEN SICK NOW HEALTHY [MENINO INDICADORa EN- TÃO DOENTE AGORA COM SAÚDE]. ‘The boy that was sick became healthy’ [O menino que estava doente ficou bom].

Uma MUDANçA de evento no domínio de

identificação, então, difere consideravelmen- te dos tipos similares de eventos, em outros campos semânticos. Os verbos MDE pos- suem um movimento de trajetória invarian- te, completamente especificado no léxico. Ademais, os estados finais e iniciais (os argu- mentos Y e Z na LCS) não podem ser locali- zados. Portanto, nenhum meio espacial está disponível nesse domínio e a língua recorre à morfologia não espacial e à estrutura de fra- se para expressar uma mudança de evento de propriedade.

6. Resumo: As propriedades morfoló- gicas dos quatro campos semânticos

Os verbos denotando MUDANçA nos quatro

campos semânticos examinados possuem propriedades morfológicas diferentes. Nos campos espaciais e de posse, as locações fi- nais e iniciais dos sinais não são especifica- das lexicalmente e são determinadas pelos loci-R dos argumentos origem e alvo (Y and Z) dos verbos. Esses loci, por sua vez, determinam a direção do movimento de

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trajetória do verbo. A diferença entre os dois campos está nos seus usos de espaço – contínuo versus descontínuo. O espaço, no domínio espacial, é semelhante ao es- paço do mundo real e, conseqüentemen- te, é contínuo. A relação espacial entre os loci-R representa a relação entre locações e o espaço entre essas locações é signifi- cativo. No domínio de posse, os loci-R representam referentes e não locações. As relações espaciais entre os loci-R não são significativas e nenhum espaço entre elas está envolvido.

Os campos temporais e de identificação não fazem uso dos loci-R; tanto expressões temporais quanto propriedades não podem ser localizadas. Portanto, frases denotando um evento de MUDANçA nesses domínios não

envolvem localização dos pontos iniciais e finais do evento. Ao invés disso, o referen- te sofrendo mudança (o argumento X no LSC) pode ser localizado, o ponto inicial (o argument Y) é freqüentemente expresso como um modificador daquele nominal e o ponto final (o argumento Z), como um complemento do verbo. Assim, a estrutura das frases nesses domínios pode ser bas- tante similar. Os dois domínios diferem no uso do espaço. O domínio temporal faz uso de eixos no espaço, onde a direção do mo- vimento do verbo codifica a ordem relativa (sequencing) dos eventos. Verbos no campo de identificação não possuem morfologia espacial alguma; seus movimentos de traje- tória, se é que existem, são completamente especificados para cada verbo no léxico e não podem ser modulados para expressar movimento ao longo de diferentes trajetó- rias no espaço.

As propriedades morfológicas dos dife- rentes campos semânticos são resumidas na Tabela 2:

Uso do espaço Loci-R Espacial Contínuo, Semelhante Locações

De posse Descontínuo Referentes

Temporal Consiste de eixos ---

De identificação

--- (sem uso direcional do

espaço) ---

Tabela 2: Propriedades morfológicas dos campos semânticos

7. Conclusões e conseqüências

O significado teórico da realização mor- fológica desses campos semânticos possui três dimensões. Primeiro, ela preenche uma lacuna na relação entre semântica e morfolo- gia. Como apontado na Seção 1, das três rela- ções sistemáticas de significado mencionadas em RH&L (1998), somente duas – relações de aspecto e de mudança de valência – são co- dificadas morfologicamente. O terceiro tipo, a polissemia sistemática de itens lexicais usa- dos em diferentes campos semânticos, não é codificado morfologicamente nas línguas fa- ladas. Contudo, como este trabalho demons- trou, essa polissemia sistemática de itens lexi- cais usados em diferentes campos semânticos é codificada em uma língua transmitida na modalidade visual-espacial, a LSI e, muito possivelmente, também em outras línguas de sinais. Isso sugere que nenhuma relação sistemática de significados entre os itens le- xicais está livre, em princípio, de ser codifica- da em termos morfológicos. A questão ainda permanece com relação à razão pela qual so- mente as línguas de sinais codificam campos semânticos morfologicamente. Deixo essa questão em aberto, por enquanto. Provavel-

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