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175 Em essência, trata-se de uma entrevista privada e confidencial entre su perior e

subalterno — entre, por exemplo, o padre-reitor de uma casa e um dos membros da casa; entre o padre provincial e um membro de sua província; entre um noviço e seu superior imediato, o mestre de noviços; entre o padre - geral e qualquer membro da Sociedade.

Inácio não exigia que o “exame de consciência” fosse o mesmo que uma confissão, embora o segredo confessional pudesse ser invocado por qualquer pessoa. Ele pretendia que o subalterno falasse com sinceridade sobre suas fraquezas e suas forças, suas esperanças e seus desejos, e sua prática da virtude religiosa; que o superior, ouvindo e falando com ele, ficasse nas mais perfeitas condições de decidir o que de melhor o subalterno poderia fazer na Sociedade a fim de que o seu caráter de jesuíta fosse desenvolvido no serviço à Igreja que era característico da Sociedade.

O “exame de consciência” foi criado por Inácio para ser a expressão máxima do relacionamento entre pai e filho que ele desejava que existisse entre o superior jesuíta e o jesuíta subalterno. Era um sistema francamente paternal o que ele tinha em mente. Era o meio que ele tinha de garantir que o amálgama de sua Sociedade, a obediência, seria exercida pelo su balterno e usada pelo superior com o máximo de compai xão possível por parte do superior e com o maior contentamento por parte do subalterno. Nem a mera obediência de execução nem obediência da vontade, mas o que deveria ser obtido era a obediência da compreensão.

O “exame de consciência” também levava a um método de governo altamente pessoal. Porque o superior, como tal, devia ser procurado, tratado e obedecido como se fosse Cristo. A regra da vida normal de um jesuíta era o encontro direto de apenas duas pessoas. Nenhum jesuíta ti nha que enfrentar um “cabido” ou assembleia de seus irmãos, como nas ordens mais antigas, para responder por seus atos e ouvir decisões sobre o seu destino. Assim, o individualismo do jesuíta isolado em seus deveres, seus direitos, seu desenvolvimento pessoal e sua carreira era esti mulado. A unidade coletiva de tais membros era garantida pela obediência sistemática que fomentava aquele individualismo. Assim era obtida a in timidade e a característica vida na Sociedade do jesuíta.

O governo interno e a unidade de mente e ação dentro da Sociedade eram levados adiante por uma prática regular, aprovada e sistemática, de relatórios: de superiores menores a superiores maiores; de superiores provinciais a assistentes romanos; dos assistentes ao padre -geral; do padre-geral a toda a Sociedade; e dos provinciais a seus membros indivi duais da província. Os relatórios tratavam dos méritos e deméritos de membros da Ordem, da conduta e do progresso deste ou daquele proje to, das condições financeiras e espirituais desta ou daquela seção da So ciedade, ou de um trabalho confiado à Sociedade.

Desde a época do próprio Iñigo, também se estimulava um intenso fluxo de informações entre os jesuítas, porque isso ajudava o que ele cha mava de “o vínculo de vontades, que é o amor e a caridade mútuos que ele s [os jesuítas] têm uns pelos outros (...) ao obter informações e novi dades

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entre si e (...)” muita intercomunicação ao mesmo nível de “segui rem uma mesma doutrina e de serem uniformes em tudo, tanto quanto possível”.

Tendo exposto a mera estrutura que Iñigo imaginou para a sua So ciedade, entretanto, é evidente que, por eficiente que fosse, não era sufi ciente para unificar ou solidificar todas as partes para transformá -las num todo — um todo inaciano. O que fazia isso — o que unia todos os muitos jesuí tas, divididos que estavam em quatro categorias de padres profes sos, coadjutores espirituais, irmãos leigos e escolásticos; e distribuídos entre muitas partes do mundo e entre muitas funções em toda a estrutura da pirâmide — eram os vínculos gêmeos de autoridade e obediência.

Estes eram, na verdade, dois aspectos da mesma coisa. A obediência era central, juntamente com a subordinação de que ela precisava. Todo jesuíta estava subordinado a alguém.

“Os superiores individuais”, escreveu Iñigo, “deveriam ter muita au- toridade sobre os subalternos, e o geral sobre os superiores; e por outro lado, a Sociedade muita autoridade sobre o geral.” Assim, “todos pode rão ter plenos poderes para sempre” e, no entanto, estar sob certo con trole.

Quanto ao voto de obediênc ia, “une os indivíduos a seus superiores, os superiores locais entre si e aos provinciais, e superiores locais e provin ciais ao geral”. Assim, a “subordinação de uns a outros é diligentemente preservada”.

Aos olhos de Inácio, a sua Sociedade deveria disti nguir-se pela qualidade da obediência de seus membros. “Os outros líderes religiosos po dem nos superar em jejuns, vigílias de oração que durem a noite toda, e outras austeridades na alimentação e no vestuário. Nossos membros têm que primar pela verdadeira e perfeita obediência e pela renúncia voluntá ria ao julgamento privado.”

Esse princípio fundamental de obediência jesuítica era difícil de im - plementar. De fato, Inácio achou necessário sistematizar num documen to especial exatamente o que ele entendia por Obediência Jesuítica. Em 1553, levado por sérias dificuldades entre os jesuítas portugueses, de vá rios dos quais tivera que descartar -se, Inácio escreveu sua Carta sobre a obediência; nela, ele foi de uma clareza cristalina quanto ao que chama de “ver dadeira obediência”.

Todo superior tinha que ser obedecido como representante de Cris to. Obedecendo a esse representante, estava -se obedecendo ao Cristo; estava -se fazendo a vontade de Cristo.

A obediência poderia ser uma entre três tipos. O grau mais bai xo é o da “obediência em desempenho”: você faz o que mandarem, muito em bora possa discordar de tudo, achar que o superior é um tolo, ou achar que sabe o que ele deveria ter mandado você fazer. Você obedece; mas com relutância. Opinião de Inácio sobre esse grau de obediência: “muito imperfeito”.

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