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113 tanto pesada “Assumo o cargo [de geral]”, disse ele aos delegados, “com

grande confiança na Sociedade.” O restante de sua fala de aproximada mente trinta linhas foi um desenvolvimento daquele tema. O Senhor não exigia dos jesuítas que mergulhassem em pensamentos fúnebres e som brios sobre as fraquezas e deficiências da Sociedade. Nenhum jesuíta de veria achar que outras pessoas mandassem nele. Ninguém. Nem as críticas feitas pelo papa Paulo VI nem as feitas pelo papa João Paulo II muda ram os jesuítas ou inverteram a muito bem-vinda mudança que os jesuí tas tinham sofrido desde o final da década de 1960 — ele se referia, disse ele, à sua maior s ensibilidade para com as necessidades de justiça e sua maior preocupação com a condição dos pobres e dos oprimidos.

A demissão do padre Arrupe pelo papa não tinha sido uma jogada inteligente, declarou Kolvenbach. Porque, em grande parte, hoje a vida da Sociedade é dirigida pela espiritualidade e pelo zelo apostólico que o padre Arrupe desenvolveu para ela. Toda a inclinação espiritual e apos tólica que o Senhor havia dado aos jesuítas na Sociedade tinha vindo atra vés do padre Arrupe. A Sociedade não iria abandonar a tradição de Arrupe.

Ao contrário, o âmago e a essência da atividade jesuítica tinham si do e ainda seriam dirigidos contra a injustiça no mundo. Esta era e é a missão dos jesuítas hoje.

Esse plano de ação da Sociedade não tem sido bem aceito por algumas pessoas, disse ele. Há, até, alguns jesuítas que veem essa nova mis são da Sociedade de Jesus como um desvio definitivo e perigoso do espírito inaciano. Mas muitos outros jesuítas não concordam.

Essa nova missão também não foi bem aceita pelos pa pas. Mas ele, Kolvenbach, havia vivido no meio daquela injustiça antes de ir para Ro ma em 1981: ele havia morado em Beirute. “Io ero là ”, disse ele, mordaz. (Eu estava lá.) E daquela experiência direta da grave injustiça que os jesuítas estão combatendo, ele saíra livre de quaisquer ilusões. “Não estou preso nem aos romanos [A Santa Sé], aos Estados Unidos, aos fran ceses, nem aos latino- americanos”, declarou ele fleumático. “Por isso, agora temos que ver o que podemos fazer!”

Temos, continuou ele, que responder aos gritos de homens que sofrem injustiça com uma linguagem e com providências que estejam de acor do com a linguagem deles e com suas condições de vida. Assim, podemos “servir melhor a Deus, à Igreja, ao vigário de Cristo, o papa João Paulo II” — as palavras saíam em staccato — “mas só iremos servir à Igreja e ao papa se, ao servi-los, pudermos estar a serviço dos homens”.

Porque, continuou ele, nossa responsabilidade é para com a Divina Majestade. Ele queria que seus jesuítas tivessem “uma dimensã o de liberdade interior” que colocasse aquela Divina Majestade em primeiro lu gar, e tudo o mais sobre a Terra — ele quase acrescentou “inclusive a Igreja e o papado” — em segundo lugar. A Divina Majestade era o único “modelo” de que dispunham para o seu comportamento.

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sem, como as Virgens Insensatas que se cansaram de esperar pela chegada do Noivo. Alguns jesuítas, admitiu Kolvenbach, pareciam estar ficando cansados de serem vigilantes. Mas todos tinham que ser vigilantes e não se deixarem abater pelo temor. Cristo disse, lembrou-lhes ele, que aquele que quisesse salvar sua vida tinha que estar pronto para perdê -la.

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O oposto também era verdadeiro: aquele que se concentrasse apenas em s alvar a própria vida estaria destinado a perdê-la. Talvez, na verdade, a congregação geral e a Sociedade viessem a ser obrigadas a perder a vida, se os jesuítas não estivessem dispostos a “irem para o paredão” pelos decretos e pelos princípios já estabelecidos, e se aquilo que fizerem não for do agrado da Divina Majestade.

A oportunidade atual de combater a injustiça não podia ser perdida. Os jesuítas tinham que tornar a “descobrir” a Sociedade. Desde a desti tuição do padre Arrupe, eles se haviam comporta do com um pouco mais de cuidado. Mas nenhum deles estava disposto a alterar suas convicções sobre a moderna missão da Sociedade. Abandonar aquilo, abandonar a luta contra a injustiça, seria abandonar a humanidade de Cristo.

É claro que haveria objeções e c ríticas de vários pontos, de que os jesuítas estavam se dedicando à política. Na verdade, disse Kolvenbach, o número de jesuítas engajados diretamente em atividades políticas era muito pequeno. Mas grande era o número de jesuítas que indireta mas poderosam ente influenciavam a política através de seu envolvimento com sindicatos trabalhistas, organizações de camponeses, movimentos e cau sas sociais. Alguns jesuítas se tornaram socialistas. Outros, marxistas. Tu do isso provocava “gemidos de reclamação” dos papas. Mas a Sociedade ainda estava disposta a seguir em frente dessa maneira, com a sua missão de justiça e sua opção preferencial pelos pobres, sem dar muita atenção “aos gemidos de reclamação dos papas”.

Seu papel, como geral, era garantir que os jesuítas não se distraíssem com os gemidos papais e não deixassem de cumprir sua missão entre os homens.

Quando Kolvenbach terminou, não admira que nos dias subsequentes da CG 33 os delegados voltassem a reafirmar os objetivos e os valores do arrupismo. É claro que, pelos decretos daquela congregação e pela transcrição do discurso do padre-geral Kolvenbach aos delegados, João Paulo II pôde ver nitidamente que nada havia mudado na Sociedade. Seus entendimentos subsequentes com o novo geral confirmaram isso.

Durante o restante de 1983 e até a primavera de 1984, o novo pa dre-geral recebeu insistentes pedidos de autoridades da Igreja em Maná gua e em Roma, no sentido de que tirasse Fernando Cardenal de seu cargo político no gabinete do governo sandinista ou da ordem j esuítica. E durante todo aquele tempo, o novo geral continuou o mesmo movimento circular de evasivas delicadas, tolerância de recusas indiretas do próprio Cardenal e de seus superiores jesuítas locais em Manágua, e aquiescência tácita dos protestos e obje ções públicas à interferência de Roma, que os sandinistas divulgavam pelos meios de comunicação internacionais.

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