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37 “Quando se tem pessoas [os jesuítas]”, escreveu o padre jesuíta M.

Buckley a respeito da atitude de Paulo para com aquela XXXII Congre gação Geral, “que não acham que tenham cometido erro, quer de conteúdo, quer de procedimento, e quando essas pessoas sofrem a desconfiança, resistência ou reprovação do próprio homem que elas estão tentando servir (...) tem-se (...) um problema religioso muito sério.”

Para dizer o mínimo.

O cardeal Albino Luciani, de Veneza, foi eleito para suceder Paulo VI no dia 26 de agosto de 1978. Mesmo antes de se tornar papa, parece que ele já tomara uma decisão notadamente desfavorável com relação à Sociedade.

E aparentemente a Sociedade já tomara uma decisão com referência ao papa João Paulo I. Assim que foi eleito, os jesuítas fizeram suas rei vindicações. O padre Vincent O’Keefe, o mais destacado dos quatro assistentes -gerais de Arrupe, e que estava sendo preparado para suceder a Arrupe um dia como geral da Ordem, declarou em entrevista a um jor nal holandês que o novo papa deveria rever a condenação da Igreja ao aborto, à homossexualidade e ao sacerdócio feminino. A entrevista foi publicada.

O papa João Paulo I ficou enfurecido. Aquilo era mais do que des prezo. Era uma afirmação de que a Sociedade de Jesus sabia, mais do que o papa, quais os princípios morais que os católi cos deveriam praticar. E era uma afirmação de que a Sociedade tinha autoridade para dizer o que pensava; isto é, era uma apropriação direta da autoridade que pertencia exclusivamente ao papa. João Paulo I mandou chamar Arrupe e exigiu uma explicação. Arru pe prometeu, humildemente, investigar o caso todo. Mas João Paulo podia sentir o que estava no ar, tão bem quanto qualquer papa. Com ba se no dossiê crítico de Paulo VI, e com a ajuda de um velho jesuíta muito experiente, padre Paolo Dezza, que tinha sido confessor do papa Paulo VI e agora era o confessor de João Paulo I, o papa redigiu um violento discurso de aviso. Ele planejava proferi-lo à assembleia internacional de líderes jesuítas com o geral Arrupe, em outra de suas congregações gerais a ser realiza da em Roma em 30 de setembro de 1978.

Uma das características mais notáveis do discurso era a repetida re ferência que João Paulo I fazia aos desvios doutrinários por parte dos jesuítas. “Que não aconteça que os ensinamentos e as publicações dos jesuítas c ontenham alguma coisa que cause confusão entre os fiéis.” O desvio doutrinário era, para ele, o mais ominoso sintoma do fracasso jesuítico.

Encoberto pelo polido verniz de sua graciosa romanità, aquele discurso continha uma clara ameaça: a Sociedade dever ia voltar ao seu papel adequado e prescrito, ou o papa seria obrigado a tomar providên cias.

Que providências? Com base nos memorandos e notas de João Pau lo, está claro que, a menos que fosse factível uma rápida reforma da Ordem,

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ele tinha em mente a efetiva liquidação da Sociedade de Jesus tal como existe hoje — talvez para ser reconstituída mais tarde, numa forma que fosse mais controlável. João Paulo I recebeu pedidos de muitos je suítas implorando para que não fizesse aquilo.

O papa nunca proferiu aqu ele discurso de aviso. Na manhã de 29 de setembro, depois de 33 dias no Trono de Pedro, e um dia antes de se dirigir à congregação geral da sociedade, João Paulo I foi encontrado mor to em seu leito.

Nos dias que se seguiram, o geral jesuíta Arrupe apresen tou um pedido ao cardeal Jean Villot, que como secretário de estado do Vaticano governava a Santa Sé no período intermediário entre a morte de João Paulo I e a eleição de seu sucessor: será que os jesuítas poderiam obter uma cópia do discurso?

Depois de uma discussão com o Colégio de Cardeais, que o estava ajudando nos preparativos para a eleição do próximo papa, o cardeal pru - dentemente negou o pedido. Arrupe foi avisado de que, na opinião de Villot e do concílio, “estava mais do que na hora de os jesuíta s colocarem seus assuntos em ordem”.

Por sua parte, Arrupe e os jesuítas decidiram não fazer nada e ver quem se tornaria o papa seguinte. Tempo era o artigo que eles sempre procuravam ter.

Mais do que nenhum de seus dois antecessores imediatos, Karol Wojt yla, da Polônia, eleito como João Paulo II no dia 16 de outubro de 1978, não podia hesitar naquela questão dos jesuítas. A grande estratégia papal de João Paulo II abrangia o Primeiro Mundo do capitalismo, o Segundo Mundo do comunismo soviético e o Terceiro Mundo dos cha mados países subdesenvolvidos e em desenvolvimento.

Wojtyla foi extremamente sagaz ao analisar o caráter e as limitações da estratégia papal a partir de 1945. Em sua opinião, Pio XII havia guia do a Igreja na base de uma mentalidade de “cerco”, só permitindo à estratégia papal um movimento clandestino dentro do império soviético, mas não oferecendo desafio algum à continuada erosão da Igreja naque la área. A política de “campos abertos”, de João XXIII, tinha sido um fracasso. A política de Paulo VI consistira apenas de uma refinação de uma política já defeituosa e fracassada. Até a época da morte de Paulo VI em 1978, seu Secretariado de Estado conseguira elaborar protocolos de acordo com mais de um governo - membro da “fraternidade” socialista soviética, mas nenhum tinha sido rubricado, quanto mais assinado e transformado em lei. De qualquer maneira, ainda que aqueles protocolos tivessem sido ratificados, já se tornara claro que não teriam feito diferen ça alguma para a situação dos católicos romanos sob domínio soviético.

Segundo a análise de João Paulo II, enquanto os chamados Primei ro, Segundo e Terceiro Mundos ficassem trancados no frio glacial da ri validade de superpotências alimentada indefinidamente pelo sistema de “bola ao chão” entre o marxismo-leninismo e o capitalismo rígido, não haveria a mínima esperança, em termos mundanos, de que alguma coisa

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