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141 licenciado em Artes, Inácio já havia reunido à sua volta um grupo básico de

sete dedicados companheiros e estava pronto, tanto intelectual como espiritualmente, para se lançar no caminho de seu extremoso serviço de Cristo. Tornou-se padre em 1537.

Desse ponto em diante, na avaliação do progresso de Iñigo, não é possível uma análise racional dos motivos de suas decisões. Podemos re lacionar suas qualidades mais evidentes : aquela vontade de ferro obser vada pelo juiz correcional anos antes, e uma grande engenhosidade que o mesmo juiz havia considerado astuta. Havia, também, aquela quase as sustadora força motriz de sua ideia de que havia penetrado e domado as terríveis pro vas espirituais pelas quais passara e que resultaram nos Exercícios espirituais.

Podem-se fazer, também, listas do que ele decidiu antes e durante seus anos de estudo; e pode-se descrever o que fez. Pode-se, até, ligar tudo isso às suas experiências e lições anteriores, de modo puramente sequencial. Se você tiver fé, poderá atribuir à luz eterna que emana do Espírito Santo a um candidato dócil — e Iñigo era exatamente isso.

Ainda assim, depois disso tudo, não poderá explicar, no que hoje seria aceito como forma racional, o elo entre as experiências anteriores de Inácio e o novo conjunto de decisões que ele agora tomara. Ele pode ria ter-se tornado eremita, entrado para um mosteiro fechado, voltado à vida de cavaleiro, ou procurado uma carreira culta na com unidade acadêmica ou na Igreja. Em vez disso, ele tomou uma direção totalmente inesperada. No final, talvez devamo - nos contentar em dizer o que muitos têm dito sobre ele: com muito poucos paralelos na história, Iñigo possuía um dom natural de penetrar fun do nas fundações mesmas da natureza humana, tanto de indivíduos como da sociedade. Isso determinou o seu curso de ação.

Em 1535, a visão de Iñigo do mundo que o cercava já estava defini da e era definitiva: havia, no âmbito universal, uma guerra em andamen to. Ela não deveria ser confundida com guerras locais — como, por exemplo, os turcos que, sob o comando do sultão Suleiman o Magnífico, haviam chegado às muralhas de Belgrado em 1521, ou o exército imperial espanhol que havia saqueado Roma e o Vaticano em 1527. Não era nem mesmo a guerra que estava sendo feita contra os luteranos, os calvinistas e outros que se haviam revoltado contra a autoridade e os ensinamentos do papa romano. Tampouco era a guerra que estava sendo travada por umas poucas almas dedicad as e piedosas contra a pobreza, a doença e a injustiça endêmicas que caracterizavam as condições sociais das massas por toda a Europa de sua época.

A guerra que Iñigo via era a guerra contra Lúcifer, chefe dos anjos do mal, que percorria o meio ambiente hu mano procurando destruir — fosse pelo homicídio da guerra, pela destruição da cultura religiosa, ou pela degradação da pobreza, da injustiça e do sofrimento — a imagem de Deus e a graça do Cristo nas almas de homens e mulheres de todas as partes. Como a gu erra de Lúcifer contra Cristo e sua graça e salvação

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era universal, assim a guerra contra Lúcifer e seus seguidores tinha que ser igualmente universal.

Iñigo tinha, portanto, um princípio básico de ação: Quo universalius, eo

divinius. (Quanto mais universal sua ação, mais divina ela é.)

Consequência imediata desse princípio foi que não podia se tratar de um apostolado de um homem só. Desde sua conversão religiosa em 1521, ele agira sozinho. Agora, se quisesse prestar serviços de comunica ção naquela guerra, se quisesse ser tão divino quanto possível em sua efi ciência, teria que agir em conjunto, precisaria de uma equipe de homens que pensassem como ele, trabalhando com os mesmos objetivos que ele, mas no mundo inteiro.

Antes de deixar Paris em 1535, Iñigo já havia reunido aquele grupo básico de sete homens. Mas não podia, agora, se satisfazer com uma as sociação livre baseada na amizade e igualdade de ideais. Tampouco se contentava com apenas uma conversão religiosa e uma reforma da vida deles. Uma certa percepção — classifique-a de instintiva, se quiser — lhe disse: você tem que subjugar e transformar o intelecto, as convicções reli giosas, as percepções de si mesmo e do mundo, e todos os desejos de cada um dos homens. Tem que fazer isso de acordo com suas ideias do Reino de Deus e da guerra que cada um desses homens está travando por aquele Reino. Só assim eles irão prestar o serviço necessário e extremoso.

Além do mais, como a guerra que Iñigo se dedicara a travar era ex- clusivamente pela posse de almas, o espírito de cada homem e mulher do mundo era o galardão. A única arma garantida por Cristo como sendo eficiente naquela guerra era a graça sobrenatural que só Cristo podia e administrava exclusivamente através de seu representante pessoal vivo na terra: o papa em Roma. Iñigo tinha, portanto, um segundo princípio bá sico: trabalhar diretamente para aquele papa romano e sob o seu coman do. Quanto mais preciso e íntimo for o elo de uma pessoa com o papa, raciocinava ele, mais íntimo será o seu elo com o líder , Cristo, e mais eficientes as ações dessa pessoa nessa guerra universal e perpétua.

Com esses princípios claros e bem definidos na mente, Iñigo impôs a cada um de seus sete companheiros iniciais o rigoroso regime de seus Exercícios

espirituais, porque aquele livro era e sempre continuou sendo seu principal

instrumento de treinamento espiritual, como serviu para aque les que vieram depois dele. Cada um dos homens emergiu daquele regime que durou semanas como um lutador espiritual completamente conquis tado para a guerra, desejoso de uma unidade corporativa sob a liderança de Iñigo, e um servo obedientíssimo do papa.

A última faceta do empreendimento a ser examinada era a maneira de garantir a eficiência dessa nova corporação de homens engajados na guerra pelo mundo inteiro. Como poderia ele unir e solidificar um grupo de homens que poderia somar centenas, vivendo e trabalhando em todas as partes do mundo em tarefas diversas? Como poderia ele fazer com que homens individuais, separados por centenas ou milhare s de quilômetros, com as comunicações entre si no mínimo difíceis, constituíssem uma or ganização

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